ENVELHECIMENTO E VULNERABILIDADE AO SUICÍDIO: UM PANORAMA DA REGIÃO CENTRO-OESTE BRASILEIRA

AGING AND VULNERABILITY TO SUICIDE: AN OVERVIEW OF THE CENTRAL-WESTERN REGION OF BRAZIL

ENVEJECIMIENTO Y VULNERABILIDAD AL SUICIDIO: PANORAMA DE LA REGIÓN CENTRO-OESTE DE BRASIL

Autores:

Ana Carolina Rodrigues Carneiro - Acadêmica de Medicina na Universidade de Rio Verde (UniRV) – Campus Extensão Goiânia. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5502-4515

Eduarda Oliveira Medeiros -  Acadêmica de Medicina na Universidade de Rio Verde (UniRV) – Campus Extensão Goiânia. ORCID: https://orcid.org/0009-0009-5299-1110

Ethiarlane Anunciação Carvalho - Acadêmica de Medicina na Universidade de Rio Verde (UniRV) – Campus Extensão Goiânia. ORCID: https://orcid.org/0009-0004-1933-0533

Pedro Ivo Aquino Abrantes - Acadêmico de Medicina na Universidade de Rio Verde (UniRV) – Campus Extensão Goiânia. ORCID: https://orcid.org/0009-0008-1801-6699

Wendel Anderson de Oliveira - Acadêmico de Medicina na Universidade de Rio Verde (UniRV) – Campus Extensão Goiânia. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5507-7940

Mariana de Sousa Nunes Vieira - Doutora em Ciências da Saúde. Professora da Faculdade de Medicina - Universidade de Rio Verde (UniRV) - Campus Extensão Goiânia. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4832-6494

Bruna Aniele Cota - Mestre em Ensino na Saúde. Professora da Faculdade de Medicina - Universidade de Rio Verde (UniRV) - Campus Formosa. ORCID: https://orcid.org/0000-0002- 7088-2454

Heloísa Silva Guerra - Doutora em Saúde Coletiva. Professora Adjunto e Membro do Núcleo de Pesquisa da Faculdade de Medicina (NUPMA) - ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0617-8112

Recebido: 25/11/2024 Aprovado: 13/12/2024 

Tipo de artigo: Artigo Original

RESUMO

Objetivo: Descrever o perfil epidemiológico dos idosos vítimas de suicídio na Região Centro-Oeste do Brasil. Método: Pesquisa epidemiológica, quantitativa, retrospectiva sobre as mortes por suicídio em idosos da Região Centro-Oeste no período de 2018 a 2022. Os dados foram obtidos por meio do Sistema de Informação sobre Mortalidade, considerando as lesões autoprovocadas voluntariamente (CID 10 X60 a X84), e analisados conforme a estatística descritiva. Resultados: Ocorreram 953 óbitos por suicídio entre a população idosa, com maior número de registros em 2022 e no Estado de Goiás. Predominaram vítimas do sexo masculino, entre 60 e 69 anos, casadas, com a cor da pele branca e de baixa escolaridade. Os meios mais utilizados para viabilizar os óbitos foram o enforcamento, estrangulamento e sufocamento. Conclusão: Os achados podem contribuir para formulação de intervenções voltadas ao perfil encontrado, com melhoria das estratégias de prevenção.

DESCRITORES: Epidemiologia; Idoso; Suicídio; Mortalidade.

ABSTRACT

Objective: To describe the epidemiological profile of elderly suicide victims in the Midwest region of Brazil. Method: An epidemiological, quantitative, retrospective study of deaths by suicide among elderly people in the Midwest region between 2018 and 2022. The data was obtained from the Mortality Information System, considering voluntary self-harm (ICD 10 X60 to X84), and analyzed according to descriptive statistics. Results: There were 953 deaths by suicide among the elderly population, with the highest number of records in 2022 and in the state of Goiás. The majority of victims were male, aged between 60 and 69, married, white and with low levels of education. The most common means of death were hanging, strangulation and suffocation. Conclusion: The findings may contribute to the formulation of interventions aimed at the profile found, with improved prevention strategies.

DESCRIPTORS: Epidemiology; Elderly; Suicide; Mortality.

RESUMEN

Objetivo: Describir el perfil epidemiológico de los ancianos víctimas de suicidio en la Región Centro-Oeste de Brasil. Método: Estudio epidemiológico, cuantitativo y retrospectivo de las muertes por suicidio de ancianos en la Región Centro-Oeste entre 2018 y 2022. Los datos se obtuvieron del Sistema de Información de Mortalidad, considerando las autolesiones voluntarias (CIE 10 X60 a X84), y se analizaron según estadística descriptiva. Resultados: Hubo 953 muertes por suicidio en la población anciana, con el mayor número de registros en 2022 y en el estado de Goiás. La mayoría de las víctimas eran hombres, con edades entre 60 y 69 años, casados, blancos y con bajo nivel de escolaridad. Los medios de muerte más comunes fueron ahorcamiento, estrangulación y sofocación. Conclusión: Los hallazgos pueden contribuir a la formulación de intervenciones dirigidas al perfil encontrado, con mejores estrategias de prevención.

DESCRIPTORES: Epidemiología; Ancianos; Suicidio; Mortalidad.

INTRODUÇÃO

O suicídio é considerado um grande problema de saúde pública e constitui um comportamento complexo que envolve fatores pessoais, sociais, psicológicos, biológicos, culturais e ambientais. Devido à sua complexidade, as abordagens de prevenção requerem intervenções multidisciplinares(1).

Estima-se que o suicídio seja responsável por 1,3% de todas as mortes anualmente no mundo, e, embora as mortes por suicídio continuem a aumentar globalmente, a taxa de suicídio caiu 45,8% de 1990 a 2019, considerando o crescimento populacional(2). Existe uma variação no suicídio de acordo com a idade, sexo e meios utilizados para tal, sendo as taxas mais altas encontradas entre homens e idosos, mas também sendo a segunda causa de morte mais frequente entre jovens(3,1-2).

No Brasil, o suicídio, além de apresentar índices elevados tanto em sua ocorrência quanto nas tentativas, permanece uma questão social frequentemente subnotificada. Estima-se que para cada suicídio confirmado, ocorram cerca de 20 tentativas sem sucesso. Esse problema se agrava no grupo de idosos(4). Segundo o Boletim Epidemiológico de Tentativas e Óbitos por Suicídio no Brasil(5), divulgado pelo Ministério da Saúde, a taxa média de suicídios entre idosos é de 8,9 mortes a cada 100 mil habitantes, superando a média nacional de 5,5 mortes para a população geral.

Devido a uma série de fatores, tanto intrínsecos (como ansiedade, depressão, demência, doenças crônicas e degenerativas, dependência física) quanto extrínsecos (como isolamento social, negligência, abandono, violência e migração), a pessoa idosa torna-se particularmente vulnerável nesse contexto. A interação desses fatores pode resultar em sentimentos de insatisfação e infelicidade com a realidade vivida, facilitando o desenvolvimento de pensamentos suicidas(6).

Comportamentos autodestrutivos indiretos, como a recusa alimentar, autonegligência e a não adesão a tratamentos que poderiam mitigar riscos, podem sinalizar atitudes alinhadas a ideais suicidas(7). Assim, o suicídio surge como uma escolha pessoal, embora seja influenciado por múltiplos fatores externos e internos.

Mesmo tratando-se de um evento complexo e multifatorial, é possível prevenir o suicídio ao compreender e abordar os fatores associados ao problema, como abandono, abuso, conflitos familiares, sofrimento físico ou psicológico persistente e sensação de fim de vida(7). Para tanto, é fundamental preservar os laços familiares, promover convivência saudável, fortalecer o sentimento de pertencimento à comunidade e incentivar o contato humano. Esses vínculos podem ser estimulados tanto pela família quanto por cuidadores, profissionais de saúde e outras entidades sociais que fazem parte do círculo de apoio do indivíduo.

Na literatura ainda são parcos os estudos relacionados ao suicídio entre idosos, bem como recortes regionais, que podem diferir de cenários mais amplos. Informações sobre as características da população idosa que foi a óbito por suicídio podem ser muito úteis para o desenvolvimento de programas preventivos específicos. Diante disso, o objetivo deste estudo foi descrever o perfil epidemiológico dos idosos vítimas de suicídio na Região Centro-Oeste do Brasil.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo epidemiológico, quantitativo e retrospectivo que analisou os óbitos por suicídio ocorridos entre indivíduos com 60 anos ou mais residentes na região Centro-Oeste do Brasil, no período de 2018 a 2022.

A região Centro-Oeste é uma das cinco regiões do Brasil definidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 1969 e compreende três estados: Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, mais o Distrito Federal, onde se localiza Brasília, a capital do país. No último Censo Demográfico a população desta região somou 16.289.538 habitantes(8).

Os dados sobre suicídios de idosos foram coletados via Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) disponível no site do Departamento de Estatística do Sistema Único de Saúde – DATASUS, em outubro de 2024.

As variáveis consideradas foram: local, ano, sexo, faixa etária, estado civil, escolaridade, raça, óbito por local de ocorrência e causa, considerando a 10ª revisão da Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID), dos códigos X60 a X84, que compreendem lesões autoprovocadas voluntariamente como autointoxicações, lesões por arma de fogo, objeto corto-contuso e outros meios.

Os dados foram organizados em planilhas do Excel e procedeu-se com as análises descritivas, apresentadas pelas frequências absolutas e relativas das variáveis incluídas no estudo. Os resultados foram organizados e categorizados pela variável faixa etária.

Por se tratar de um estudo de base de dados secundários, de livre acesso e sem identificação dos sujeitos, não houve necessidade de submissão ao Comitê de Ética em Pesquisa.

RESULTADOS

No período analisado, ocorreram 953 óbitos por suicídio em idosos na Região Centro-Oeste brasileira. A figura 1 apresenta a distribuição das ocorrências por ano e faixa etária. Os idosos entre 60 e 69 anos foram as vítimas mais frequentes, com mais da metade dos casos (54,7%).

Figura 1. Óbitos por suicídio em idosos na região Centro-Oeste segundo ano de ocorrência e faixa etária

Fonte: Os autores.

O estado de Goiás foi o que apresentou maior número de suicídios, registrando 52,2% dos óbitos, seguido do estado do Mato Grosso com 19,5%; e o ano com o maior número de ocorrências foi 2022 (Tabela 1).

Tabela 1. Óbitos por suicídio em idosos na região Centro-Oeste segundo ano de ocorrência e estado da federação.

2018

2019

2020

2021

2022

Total

%

Distrito Federal

27

26

17

13

28

111

11,6

Goiás

83

100

99

105

110

497

52,2

Mato Grosso

35

33

36

45

37

186

19,5

Mato Grosso do Sul

26

36

36

30

31

159

16,7

Região Centro-Oeste

171

195

188

193

206

953

100

   Fonte: Os autores.

A Tabela 2 apresenta os dados sociodemográficos das vítimas de suicídio ocorridos na região Centro-oeste considerando a distribuição por faixa etária. A maioria das vítimas eram do sexo masculino (82,2%), com 4 a7 anos de escolaridade (25,7%), da cor branca (49,3%) e casados (41,1%).

Tabela 2. Dados sociodemográficos dos idosos vítimas de suicídio na região Centro-Oeste segundo faixa etária.

Variáveis

60 a 69 anos

70 a 79 anos

80 anos e +

Total

n

%

n

%

n

%

n

Sexo

Masculino

419

53,5

247

31,5

117

15,0

783

82,2

Feminino

102

60,0

57

33,5

11

6,5

170

17,8

Escolaridade

Nenhuma

56

41,2

52

38,2

28

20,6

136

14,3

1 a 3 anos

85

48,8

64

36,8

25

14,4

174

18,2

4 a 7 anos

137

55,9

76

31,0

32

13,1

245

25,7

8 a 11 anos

101

64,7

37

23,7

18

11,6

156

16,3

12 anos e mais

57

65,5

23

26,4

7

8,1

87

9,1

Ignorado

85

54,8

52

33,5

18

11,6

155

16,2

Cor/raça

Branca

237

50,4

155

33,0

78

16,6

470

49,3

Preta

24

64,9

10

27,0

3

8,1

37

3,9

Amarela

1

25,0

2

50,0

1

25,0

4

0,4

Parda

246

58,4

130

30,9

45

10,7

421

44,2

Indígena

4

90,0

1

10,0

-

-

5

0,5

Ignorado

9

56,2

6

37,5

1

6,3

16

1,6

Estado civil

Solteiro

111

67,7

34

20,7

19

11,6

164

17,2

Casado

224

57,1

127

32,4

41

10,5

392

41,1

Viúvo

38

29,2

52

40,0

40

30,8

130

13,6

Separado judicialmente

76

54,7

50

36,0

13

9,3

139

14,6

Outro

26

59,1

13

29,5

5

11,4

44

4,6

Ignorado

44

54,3

27

33,3

10

12,4

81

8,5

Total

521

54,7

304

31,9

128

13,4

953

100

         Fonte: Os autores.

Por fim, a Tabela 3 apresenta as lesões autoprovocadas intencionalmente pelos idosos de acordo com as categorias da CID-10. As lesões provocadas intencionalmente por meio de enforcamento, estrangulamento e sufocamento foram os principais meios utilizados pelas pessoas idosas para o suicídio em todas as faixas etárias, com 647 (67,9%) registros. Em seguida aparecem as lesões por disparo de outra arma de fogo ou arma de fogo não especificada, com 66 (6,9%) casos.

Tabela 3. CID referentes aos meios de suicídio dos idosos residentes na região Centro-Oeste segundo a faixa etária.

Categoria CID-10

60 a 69 anos

70 a 79 anos

80 anos e mais

Total

Autointoxicações

X60   Analgésicos, antipiréticos e antirreumáticos, não opiáceos

1

-

-

01

X61   Drogas anticonvulsivantes [antiepilépticos] sedativos, hipnóticos, antiparkinsonianos e psicotrópicos não classificados

6

4

-

10

X62   Narcóticos e psicodislépticos [alucinógenos] não classificados em outra parte

3

-

-

03

X63   Substâncias farmacológicas de ação sobre o sistema nervoso autônomo

-

-

1

01

X64   Outras drogas, medicamentos e substâncias biológicas e às não especificadas

12

7

1

20

X65   Voluntária por álcool

6

1

-

07

X66   Solventes orgânicos, hidrocarbonetos halogenados e seus vapores

1

-

-

01

X68   Exposição intencional a pesticidas

17

13

3

33

X69   Produtos químicos e substâncias nocivas não especificadas

5

4

1

10

Lesão autoprovocada intencionalmente

X70   Enforcamento, estrangulamento e sufocação

363

193

91

647

X71   Afogamento e submersão

4

4

-

08

X72   Disparo de arma de fogo de mão

17

15

5

37

X73   Disparo de espingarda, carabina ou arma de fogo de maior calibre

2

1

-

03

X74   Disparo de outra arma de fogo ou arma de fogo não especificada

31

23

12

66

X76   Fumaça, fogo ou por chamas

7

6

2

15

X78   Objeto cortante ou penetrante

15

14

5

34

X79   Objeto contundente

3

-

-

03

X80   Precipitação de um lugar elevado

18

12

5

35

X82   Impacto de um veículo a motor

1

1

1

03

X83   Outros meios especificados

1

2

-

03

X84   Meios não especificados

8

4

1

13

Total

521

304

128

953

Fonte: Os autores.

DISCUSSÃO

O suicídio tornou-se um imperativo global e tem sido considerado um problema de saúde pública. A OMS relata uma ocorrência de 703.000 suicídios por ano, sendo que cerca de 77% deles, ocorrem em países de baixa e média renda. Dada a relevância do problema, o indicador da taxa de suicídio foi inserido como uma das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas(2).

Acredita-se que a pessoa idosa apresente maior vulnerabilidade ao suicídio, pelas próprias modificações que acontecem em seu organismo devido ao processo de envelhecimento(9). Comparadas aos indivíduos jovens, elas apresentam uma probabilidade maior de morrerem por suicídio, e caso apresentem alguma condição patológica como depressão ou ansiedade, a ideação suicida aumenta substancialmente(10).

Este estudo analisou os óbitos por suicídio em idosos ocorridos na Região Centro-Oeste brasileira durante um período de cinco anos, e observou que o perfil da pessoa idosa vítima de suicídio é predominantemente do sexo masculino, entre 60 e 69 anos, com baixa escolaridade, cor da pele branca e casada. Os achados de um estudo sobre a mortalidade por suicídio no Brasil entre 1996 e 2017 corroboram com os do presente estudo no tocante ao sexo (81,3% homens), faixa etária entre 60 e 70 anos (54,5%), estado civil (51,5% casados), escolaridade baixa (19,2% com 1 a 3 anos de estudo) e cor da pele branca (62,4%)(11).

Dados de um estudo brasileiro sobre suicídio em idosos nas capitais brasileiras e Distrito Federal também demonstraram maior ocorrência de óbitos em homens, assim como um levantamento realizado no Nordeste, com mais de 80% dos registros relacionados ao sexo masculino(12-13).

A primazia do sexo masculino em relação ao feminino dentre os óbitos por suicídio em idosos já é bem estabelecida. Estudos internacionais revelaram que os homens tentaram suicídio mais de três vezes em comparação com as mulheres(14-15). No estudo de Zhong et al.(16) o suicídio em homens na China foi 40% maior do que em mulheres em um período de dois anos.

No que tange à faixa etária observou-se o maior número de registros entre idosos mais jovens. Estudo da Malásia apontou que a faixa etária de 60 a 74 anos, considerada o jovem-velho, é um preditor de suicídio e justifica essa predominância em função das grandes transições nesse período da vida, como do status de empregado para desempregado, o luto, migração, aumento de doenças físicas e mentais, além de mudanças sociais e familiares(17).

A alta taxa de mortalidade por suicídio entre idosos é provavelmente agravada pela fragilidade e pelo fato de muitos idosos viverem sozinhos, o que contraria os dados do presente estudo, onde os casados apresentaram uma prevalência maior de óbitos. Outros fatores de risco que se destacam são os problemas de saúde mental, física e problemas sociais, sendo os agravos de saúde mental aqueles que mais consistentemente se relacionam com suicídio em idosos(18).

Um estudo de caso controle realizado nos Estados Unidos demonstrou que 51,3% dos indivíduos que morreram por suicídio tiveram pelo menos uma condição de saúde mental diagnosticada no ano anterior ao suicídio. Após ajuste das características sociodemográficas, esses indivíduos tiveram uma chance 6,8 vezes maior de morrer por suicídio(19).

No tocante à escolaridade, o suicídio foi mais prevalente em idosos sem escolaridade ou com até sete anos de estudo, corroborando com dados de pesquisa realizada no Tocantins que apontou uma correlação moderada entre o grau de escolaridade e o suicídio, com mais casos de suicídio entre aqueles menos instruídos(20). Tal fato poderia ser explicado em função do status econômico, definido pelo nível educacional e outros fatores sociais, o que pode levar à grandes preocupações e estresse, à baixa autoestima e consequentemente, ao suicídio(21). Esse ponto é divergente na literatura, pois uma revisão narrativa sobre determinantes socioeconômicos relacionados ao suicídio, destacou que quanto maior for o grau de instrução do indivíduo, maior será risco de suicídio, pois o trabalho das pessoas com alto grau de escolaridade pode ser mais estressante(22).

Dentro da Região Centro-Oeste o estado de Goiás destacou-se como sendo o território com maior número de registros de suicídio entre idosos, sendo responsável por pouco mais da metade dos óbitos no período. A análise dos dados de suicídio em idosos das capitais brasileiras confirmam Goiânia como a capital da região Centro-Oeste com a maior taxa de mortalidade por suicídio em idosos, o que pode contribuir para esse predomínio do Estado(12).

As lesões provocadas intencionalmente por meio de enforcamento, estrangulamento e sufocamento foram os principais meios utilizados pelas pessoas idosas para o suicídio em todas as faixas etárias no presente estudo, sendo seguida pelas lesões por disparo de outra arma de fogo ou arma de fogo não especificada. Esses métodos coincidem com os utilizados por idosos vítimas de suicídio em outros estudos(6,14,17).

Embora os suicídios bem sucedidos sejam mais prevalentes em homens, a prevalência de tentativas de suicídio são mais frequentes em mulheres. Essa diferença existe em função da escolha de métodos mais severos pelos homens, como o método do enforcamento e uso de armas de fogo, onde a probabilidade de sobrevivência é baixa. Já as mulheres recorrem a métodos menos fatais como envenenamento por drogas e produtos químicos, onde existe a possibilidade de sobreviver(23).

Estudo realizado por Oh et al.(24) relata que o uso do método de enforcamento, afogamento e uso de armas de fogo, que são métodos altamente traumáticos, respondem por apenas 16% de todos os métodos utilizados para tentar suicídio. No entanto, quando se fala em mortes por suicídio, esses mesmos métodos respondem por 78% dos casos.

As altas taxas de suicídio entre idosos e a existência de estigmas e tabus sobre o tema, o tornam ainda mais relevante e necessário. Como o processo de envelhecimento populacional é uma realidade do Brasil e do mundo, torna-se um desafio o enfrentamento e prevenção desta condição para que os números não se tornem mais alarmantes.

Alguns fatores podem atuar como protetores para o suicídio e incluem recursos individuais e sociais que podem proteger a pessoa idosa desse ato. Possuir um bom suporte familiar, construir relacionamentos saudáveis, apresentar sentimento de importância, ter autoestima elevada, bem como profissionais aptos a identificar precocemente episódios de depressão e restringir o acesso a meios letais, são alguns dos fatores que podem contribuir para a prevenção do suicídio(25).

No Japão, uma das principais estratégias dos planos nacionais de prevenção ao suicídio é promover a conexão de indivíduos que precisam de tratamento psiquiátrico com serviços médicos adequados. A melhoria das taxas de tratamento para os grupos de alto risco podem ter contribuído para o declínio do suicídio no país(26).

Outras medidas importantes incluem: prevenção de incapacidades, adoção de um cuidador para o idoso; ampliação e qualificação dos serviços de saúde mental; iniciativas intersetoriais como as universidades abertas à terceira idade; preparação para aposentadoria; terapias comunitárias e intervenções multidisciplinares(27). Salienta-se a elaboração da Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio, promulgada por meio da Lei 13.819 de abril de 2019(28), que pode desencadear o fortalecimento das ações de saúde mental, bem como de estratégias relacionadas à promoção de saúde e prevenção da violência autoprovocada.

Por se tratar de estudo com dados secundários, algumas limitações podem ser consideradas como a qualidade dos registros na base de dados do Datasus, o tempo entre coleta dos dados e publicação na plataforma e as subnotificações, com possibilidade de classificação incorreta da causa do óbito. Além disso, ainda é baixa quantidade de publicações que tratam especificamente do suicídio no público idoso, o que pode fragilizar a discussão dos resultados. Entretanto, essas limitações não inviabilizaram a condução do estudo e sua importância.

 

CONCLUSÃO

Entre 2018 e 2022 ocorreram 953 óbitos por suicídio entre a população idosa da região Centro-Oeste do Brasil, evidenciando uma predominância das vítimas do sexo masculino, entre 60 e 69 anos, casadas, com a cor da pele branca e de baixa escolaridade. O Estado de Goiás concentrou a maior prevalência de suicídios e os meios mais utilizados para viabilizar os óbitos foram o enforcamento, estrangulamento e sufocamento, além do disparo de outra arma de fogo ou arma de fogo não especificada.

Os achados podem contribuir para formulação de intervenções voltadas ao perfil encontrado, com melhoria da capacitação de profissionais que lidam diretamente com a pessoa idosa, incrementando ações de rastreio dos transtornos mentais, classificação de riscos e vulnerabilidades, bem como estratégias multiprofissionais de cuidado ao idoso. Espera-se que mais estudos possam ser realizados contemplando essa temática, o que ajudará na ampliação do conhecimento na área e maior embasamento para as estratégias de prevenção.

REFERÊNCIAS

1. World Health Organization. Preventing suicide: a global imperative. Geneva: World Health Organization; 2014.

2. World Health Organization. Suicide worldwide in 2019: Global Health Estimates. Geneva: World Health Organization; 2021.

3. Franklin JC, Ribeiro JD, Fox KR, Bentley KH, Kleiman EM, Huang X, Musacchio KM, Jaroszewski BP, et al. Risk factors for suicidal thoughts and behaviors: a meta-analysis of 50 years of research. Psychol Bull. 2017;143(2):187-232.

4. Pinto LW, Assis SG de. Estudo descritivo das tentativas de suicídio na população idosa brasileira, 2000-2014. Ciênc Saúde Coletiva. 2015;20(6):1681-92.

5. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico. Suicídio: saber, agir e prevenir. Brasília: Ministério da Saúde; 2017. v. 48, n. 30.

6. Santos MCL, Giusti BB, Yamamoto CA, Ciosak SI, Szylit R. Suicide in elderly: an epidemiologic study. Rev Esc Enferm USP. 2021;55:e03694.

7. Freitas EV. Tratado de Geriatria e Gerontologia. 4th ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2016.

8. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo 2022: informações de população e domicílios por setores censitários auxiliam gestão pública. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/39525-censo-2022-informacoes-de-populacao-e-domicilios-por-setores-censitarios-auxiliam-gestao-publica. Acesso em: 6 nov. 2024.

9. Rosa L, Demarco TT. Suicídio na terceira idade e as estratégias de intervenção. Anu Pesqui Ext Unoesc Videira. 2019;4:e23385.

10. Pedrosa B, Duque R, Martins R. Suicídio no idoso: o antecipar da morte. PsiLogos. 2016;14(1):50-6.

11. Coelho HT, Benito LAO. Suicídio de idosos no Brasil: 1996-2017. REVISA. 2020;9(3):405-18.

12. Silva JVS, Santos Júnior CJ, Oliveira KCPN. Suicídio em idosos: índice e taxa de mortalidade nas capitais brasileiras no período de 2001 a 2015. Medicina (Ribeirão Preto). 2020;53(3):215-22.

13. Gomes AGN, Afonso MPR, Acioli RML, Pimentel FC. Perfil, evolução e distribuição espacial dos óbitos por suicídio em idosos na região Nordeste do Brasil. Rev Baiana Saúde Pública. 2021;45(4):10-26.

14. Razai D, Ghadirzadeh MR, Mahdavi SA, Hasani J, Nazari SSH. The suicide rate in the elderly population of Iran between 2008 and 2014. J Res Health Sci. 2020;20(1):e00471.

15. Mejías-Martín Y, Del Castillo JD, Rodríguez-Mejías C, Martí-García C, Valencia-Quintero P, García-Caro MP. Factors associated with suicide attempts and suicides in the general population of Andalusia (Spain). Int J Environ Res Public Health. 2019;16(22):4496.

16. Zhong BL, Chiu HF, Conwell Y. Rates and characteristics of elderly suicide in China, 2013-14. J Affect Disord. 2016;206:273-9.

17. Bakar NSA, Zainuddin NA, Seman Z, Khamal NR, Ismail MH. Trends of completed suicide rates among Malaysian elderly between 1995 and 2020. BMC Public Health. 2023;10(23):303.

18. Price JH, Khubchandani J. Firearm suicides in the elderly: a narrative review and call for action. J Community Health. 2021;46(5):1050-8.

19. Yeh H, Westphal J, Hu Y, Peterson EL, Williams LK, Prabhakar D, Frank C, Autio K, et al. Diagnosed mental health conditions and risk of suicide mortality. Psychiatr Serv. 2019;70(9):750-757.

20. Soares Filho ES, Correia LCS, Lima PR, Gomes H, Jesus AG. O suicídio no Estado do Tocantins. Rev Eletr Acervo Saúde. 2019;11(12):e712.

21. Machado DB. Impacto da desigualdade de renda e de outros determinantes sociais na mortalidade por suicídio no Brasil [dissertação]. Salvador: Universidade Federal da Bahia; 2014. 100 p.

22. Gonçalves LRC, Gonçalves E, Oliveira Júnior LB. Determinantes espaciais e socioeconômicos do suicídio no Brasil: uma abordagem regional. Nova Econ. 2011;21(2):281-316.

23. Shojaei A, Moradi S, Alaeddini F, Khodadoost M, Barzegar A, Khademi A. Association between suicide method, and gender, age and education level in Iran over 2006-2010. Asia Pac Psychiatry. 2014;6(1):18-22.

24. Oh SH, Lee KU, Kim SH, Park KN, Kim YM, Kim HJ. Factors associated with choice of high lethality methods in suicide attempters: a cross-sectional study. Int J Ment Health Syst. 2014;8(1):43-7.

25. Reis EM, Santos PC, Pucci SHM. Ideação e tentativa de suicídio em idosos: fatores de risco associados. Rev Ibero-Am Humid, Ciênc Educ. 2021;7(6):211-20.

26. Otaka Y, Arakawa R, Narishige R, Okubo Y, Tateno A. Suicide decline and improved psychiatric treatment status: longitudinal survey of suicides and serious suicide attempters in Tokyo. BMC Psychiatry. 2022;22(221):1-8.

27. Marques VSNF, Nogueira RBSS, Nogueira TBSS, Sousa MNA, Oliveira IC. Suicídio em idosos brasileiros: retrato de uma realidade. Rev Bras Multidiscip. 2020;23(3):190-202.

28. Brasil. Presidência da República. Secretaria Geral. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 13.819 de 26 de abril de 2019. Institui a Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio. Diário Oficial da União. 2019.