A QUALIDADE DE VIDA EM PACIENTES COM SÍNDROME PÓS-COVID-19
QUALITY OF LIFE IN PATIENTS WITH POST-COVID-19 SYNDROME
CALIDAD DE VIDA EN PACIENTES CON SÍNDROME POST-COVID-19
Kárila Larissa Pereira de Oliveira
Mestre em doenças tropicais pela Universidade Federal do Pará, Belém, Brasil.
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5606-5637
Jairisson Augusto Santa Brígida Vasconcelos
Mestre em doenças tropicais pela Universidade Federal do Pará, Belém, Brasil.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9365-4307
Luana Wanessa Cruz Almeida
Mestre em doenças tropicais pela Universidade Federal do Pará, Belém, Brasil.
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9639-2667
Evelen da Cruz Coelho
Doutoranda em doenças tropicais pela Universidade Federal do Pará, Belém, Brasil.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9373-7743
Pedro Paulo Moraes da Câmara
Mestre em doenças tropicais Universidade Federal do Pará, Belém, Brasil.
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1338-8692
Pamela de Oliveira Batista
Mestre em doenças tropicais pela Universidade Federal do Pará, Belém, Brasil.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0949-9827
Graziela Gomes Silva
Mestranda em doenças tropicais pela Universidade Federal do Pará, Belém, Brasil.
ORCID: https://orcid.org/0009-0002-2759-7065
Luisa Caricio Martins
Doutora em genética e biologia molecular e docente da Universidade Federal do Pará, Belém, Brasil.
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8832-148X
RESUMO
Objetivo: avaliar a qualidade de vida de pacientes vivendo com a síndrome pós-COVID-19. Método: Estudo transversal que utilizou o questionário europeu de qualidade de vida EQ-5D-5L, escala de estado funcional pós COVID, escala de dispneia e escala de fadiga. Resultados: Participaram 111 pacientes, sendo (80,18%) do sexo feminino, ensino médio completo (45,9%), autodeclarados pardos (73%), casados/união estável (45,04%) e renda de até 1 salário mínimo (47,7%). Homens casados apresentaram maior índice de qualidade de vida. Na escala de estado funcional pós-COVID-19, foi identificado baixos níveis de qualidade de vida nos indivíduos com limitações moderadas/graves e nos graus 2 e 3 da escala de dispneia, na escala de fadiga, o aumento de pontuação reduziu o índice de qualidade de vida. Dispneia, fadiga, alterações de memória foram os sintomas mais relatados. Conclusão: A qualidade vida foi baixa devido fatores sociodemográficos e sequelas da doença.
DESCRITORES: Síndrome pós-COVID-19; Sinais e sintomas; Qualidade de vida; Questionário.
ABSTRACT
Objective: to evaluate the quality of life of patients living with post-COVID-19 syndrome. Method: Cross-sectional study that used the European quality of life questionnaire EQ-5D-5L, post-COVID functional status scale, dyspnea scale, and fatigue scale. Results: 111 patients participated, of which 80.18% were female, had completed high school (45.9%), self-declared brown (73%), married/stable union (45.04%), and income of up to 1 minimum wage (47.7%). The average EQ-5D-5L index was 0.610. Married men had a higher quality of life index. On the post-COVID-19 functional status scale, low levels of quality of life were identified in individuals with moderate/severe limitations and in grades 2 and 3 of the dyspnea scale; on the fatigue scale, the increase in score reduced the quality of life index. Dyspnea, fatigue, and memory changes were the most reported symptoms. Conclusion: Quality of life was low due to sociodemographic factors and sequelae of the disease.
DESCRIPTORS: Post-COVID-19 syndrome; Signs and symptoms; Quality of life; Questionnaire.
RESUMEN
Objetivo: evaluar la calidad de vida de los pacientes que viven con síndrome post-COVID-19. Método: Estudio transversal que utilizó el cuestionario europeo de calidad de vida EQ-5D-5L, escala de estado funcional post-COVID, escala de disnea y escala de fatiga. Resultados: Participaron 111 pacientes, de los cuales (80,18%) eran de sexo femenino, con bachillerato completo (45,9%), color de piel autodeclarado moreno (73%), casados/en unión estable (45,04%) y con ingresos de hasta 1 salario mínimo (47,7%). El índice medio EQ-5D-5L fue de 0,610. Los hombres casados tenían un índice de calidad de vida más alto. En la escala de estado funcional post COVID-19 se identificaron niveles bajos de calidad de vida en individuos con limitaciones moderadas/severas y en los grados 2 y 3 de la escala de disnea, en la escala de fatiga el aumento de puntaje redujo el índice de calidad de vida. La disnea, la fatiga y los cambios en la memoria fueron los síntomas más reportados. Conclusión: La calidad de vida fue baja debido a factores sociodemográficos y secuelas de la enfermedad.
DESCRIPTORES: Síndrome post-COVID-19; Signos y síntomas; Calidad de vida; Cuestionario.
Recebido: 10/02/2025 Aprovado: 25/02/2025
Tipo de artigo: Artigo Original
INTRODUÇÃO
A Síndrome pós-COVID-19 (SPC) é caracterizada por sintomas que permanecem ou aparecem pela primeira vez em até três meses após a infecção por COVID-19 e não podem ser explicados por outros motivos(1). São sinais e sintomas duradouros que podem comprometer a saúde física, cognitiva, mental, social e interferir no dia a dia, impactando diretamente na qualidade de vida dos sujeitos(2).
A Organização Mundial da Saúde (OMS) definiu qualidade de vida (QV), como uma percepção do indivíduo com relação ao seu posicionamento frente à própria vida, em um contexto cultural e de sistema de valores nos quais o indivíduo vive, e ainda em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações (3). A atenção a QV relacionado a saúde e aspectos que a cercam é de suma importância para entender as implicações associadas ao pós COVID-19 (4). Por isso, a estratificação de saúde mental e física permite avaliar o impacto das infecções mostrando como as condições de saúde influenciam na QV(5). Desse modo, este estudo tem por objetivo avaliar a QV dos pacientes com SPC e descrever suas características sociodemográficas e clinicas.
MÉTODOS
Pacientes de ambos os sexos que comprovaram infecção prévia por meio de teste sorológico e estavam cadastrados em um programa de acompanhamento multiprofissional para SPC ofertado pelo Núcleo de Medicina Tropical, uma unidade de integração da Universidade Federal do Pará, na região amazônica.
Este é um estudo transversal analítico e descritivo que utilizou um formulário padronizado para coletar informações sociodemográficas e os dados clínicos foram obtidos através de entrevista em sala reservada, no período de setembro de 2022 a junho de 2023.
O questionário EQ-5D-5L foi utilizado para avaliar a qualidade de vida. Seu uso é proveniente das recomendações e autorização da EuroQol(6) e o cálculo dos valores de índice EQ-5D-5L foi realizado usando o SPSS, a partir do conjunto de valores Pickard dos Estados Unidos (EUA), versão 1.1 (atualizado em 16/11/2020).
A escala de estado funcional pós-COVID-19 classifica o comprometimento em grau 0 (zero) - sem limitação funcional; grau 1 - limitação funcional insignificante, grau 2 - limitação funcional leve, grau 3 - limitação funcional moderada e grau 4 - limitação funcional grave(7).
A escala de dispneia avalia a sensação de dispneia referida pelo paciente em seus esforços físicos diários e limitam suas atividades cotidianas(8). É composta por 5 citações com classificação de grau 0 (zero) ao grau 4 em que quanto maior a pontuação, maior o grau de dispneia(9).
A escala de fadiga sintetiza como o paciente vivencia os sintomas de fadiga física e psicológica no seu dia-a-dia. É composta por 10 assertivas que devem ser respondidas em uma escala de cinco pontos, sendo o “Sempre” equivalente a 5 pontos, “Muitas vezes”, 4 pontos; “Às vezes”, 3 pontos; “Raramente”, 2 pontos; e “Nunca”, 1 ponto. Esse escore pode variar de 10 pontos (menor fadiga) até 50 pontos (maior fadiga), indicando eventual declínio nas atividades físicas e cognitivas(10).
Os dados foram organizados e processados por meio do programa Microsoft Office Excel 2019 e os resultados dispostos em tabelas e gráficos. Foi realizada analise descritiva adotado o nível de significância de 5% (valor de p < 0,05) e utilizando o software IBM SPSS Statistics versão 24.
Foram respeitados todos os aspectos éticos em pesquisa de acordo com a Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Núcleo de Medicina Tropical da Universidade Federal do Pará e aprovado através do número do parecer 6.847.961 (CAAE 78810424.4.0000.5172).
RESULTADOS
Participaram 111 pacientes, com predomínio do sexo feminino, média de idade de 56 anos, ensino médio completo, autodeclarados pardos, casados ou que viviam em união estável e renda individual de até 1 salário mínimo. Em relação ao questionário EQ-5D-5L, a média índice de qualidade de vida (EQindex) foi 0,610. As mulheres apresentaram um menor índice de qualidade de vida em relação aos homens. Quanto ao estado civil, os casados apresentaram maior índice. Variáveis como faixa etária, escolaridade, raça e renda não se mostraram estatisticamente significantes (Tabela 1).
Tabela 1 Características sociodemográficas dos pacientes com síndrome pós-COVID-19, na Região Metropolitana de Belém. Pará, Brasil, setembro de 2022 a junho de 2023 (N = 111).
Variáveis Sociodemográficas | N | Média | Mediana | Desvio-padrão | Mínimo | Máximo | P-Valor(1) |
Sexo |
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Feminino | 89 | 0,577 | 0,660 | 0,297 | -0,425 | 1,000 | 0.006* |
Masculino | 22 | 0,764 | 0,817 | 0,218 | 0,004 | 1,000 | |
Faixa Etária |
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28-37 | 9 | 0,583 | 0,535 | 0,233 | 0,26 | 1,000 | 0.974ns |
38-47 | 16 | 0,637 | 0,729 | 0,323 | -0,101 | 1,000 | |
48-57 | 35 | 0,595 | 0,678 | 0,269 | -0,016 | 0,902 | |
58-67 | 34 | 0,618 | 0,714 | 0,325 | -0,425 | 0,943 | |
68 ou mais | 17 | 0,641 | 0,749 | 0,294 | -0,062 | 1,000 | |
Escolaridade |
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ESC | 38 | 0,650 | 0,701 | 0,258 | -0,079 | 1,000 | 0.080ns |
EMC | 51 | 0,639 | 0,749 | 0,274 | -0,016 | 1,000 | |
EFI | 14 | 0,427 | 0,512 | 0,370 | -0,425 | 0,943 | |
EFC | 8 | 0,608 | 0,728 | 0,343 | -0,101 | 0,940 | |
Raça |
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Parda | 81 | 0,596 | 0,678 | 0,301 | -0,425 | 1,000 | 0.479ns |
Branca | 22 | 0,695 | 0,787 | 0,274 | -0,062 | 1,000 | |
Preta | 8 | 0,572 | 0,623 | 0,223 | 0,175 | 0,817 | |
Estado Civil |
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União Estável | 16 | 0,467 | 0,522 | 0,325 | -0,101 | 0,943 | 0.034* |
Solteira | 41 | 0,578 | 0,622 | 0,288 | -0,425 | 1,000 | |
Divorciada | 12 | 0,574 | 0,676 | 0,377 | -0,079 | 0,943 | |
Viúva | 8 | 0,688 | 0,768 | 0,221 | 0,336 | 0,902 | |
Casada | 34 | 0,723 | 0,787 | 0,226 | 0,186 | 1,000 | |
Renda Individual |
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SR | 11 | 0,515 | 0,541 | 0,306 | -0,101 | 0,902 | 0.062ns |
<1 SM | 17 | 0,449 | 0,502 | 0,363 | -0,425 | 0,943 | |
1 SM | 36 | 0,635 | 0,746 | 0,296 | -0,062 | 1,000 | |
2 SM | 16 | 0,651 | 0,678 | 0,21 | 0,175 | 0,943 | |
3 a 5 SM | 23 | 0,670 | 0,72 | 0,256 | -0,079 | 1,000 | |
>5 SM | 8 | 0,771 | 0,831 | 0,202 | 0,344 | 1,000 |
ESC: ensino superior completo; EMC: ensino médio completo; EFI: ensino fundamental incompleto; EFC: ensino médio completo; SR: sem renda; SM: salário mínimo.
FONTE: Elaborado pela autora.
Foram relatados 60 diferentes sintomas, dos quais, 29 se deram uma única vez e estão exemplificados na figura 1.
Figura 1 Classificação dos sintomas relatados pelos pacientes acometidos pela síndrome pós-COVID-19 na Região Metropolitana de Belém, Pará, Brasil, 2023.
Os pacientes com estado funcional pós-COVID-19 muito leve apresentaram maior índice de qualidade de vida em relação à média EQindex. E os grupos moderados e graves representaram os menores índices. Estas relações se mostraram significativas (p<0.05).
Na avaliação da escala de dispneia, os pacientes com dispneia grau 0 obtiveram maior índice de qualidade de vida em relação à média EQindex e os grupos grau 2 e 3 estão fora do limite de decisão inferior do gráfico representando assim menores níveis de qualidade de vida (Figura 2).
Figura 2 Análise de variância do índice EQindex em função do escore da Escala de Dispneia(MRC), obtido pelos pacientes acometidos com a síndrome pós-COVID-19, na Região Metropolitana de Belém, Pará, Brasil, 2023.
Teste F para análise de variância das médias (p-valor <0.05).
F = 72.355 p = < .001*
Na avaliação da escala de fadiga, o escore médio foi de 24,96, mínima de 10, mediana 24 e máxima de 47. A figura 3 representa o resultado obtido entre o índice EQ-5D-5L e o escore da escala. A correlação constatou-se que o aumento do escore EAF implica na redução significativa no índice de QV dos pacientes (r = -0,658).
Figura 3 Correlação de Pearson entre o índice EQindex e o escore de fadiga obtido pelos pacientes acometidos com a síndrome pós-COVID-19, na Região Metropolitana de Belém, Pará, Brasil, 2023.
Resultado do teste de Correlação de Pearson (r) = -0,658 (correlação negativa forte)
p-valor = 0,000*
DISCUSSÃO
Neste estudo, a maioria da população eram mulheres que apresentaram os piores níveis de qualidade de vida (QV). Estudos(1,11-12-13) no mundo inteiro corroboram que o sexo feminino é um fator associado ao risco de desenvolver a SPC, que pode ser devido aos hormônios sexuais na resposta imune(14) ou pela difusão alveolar ou tolerância ao exercício mais reduzida que contribui para uma recuperação mais lenta, mental e física, que impacta as atividades de vida diária e consequentemente a QV(15). Em relação ao estado civil, casados obtiveram maior índice de QV, o que indica que ter um companheiro pode ser benéfico no processo saúde doença(16) e é um fator protetivo no processo inflamatório do corpo consolidando a QV(17).
Os sintomas mais relatados pelos pacientes neste estudo acompanham a literatura mundial como os mais prevalentes pelas populações que enfrentam a SPC ao redor do planeta, trazendo impacto multissistêmico e danos adicionais(1,2,4).
Na escala de fadiga e de dispneia, as queixas debilitantes foram responsáveis por transtornos psicológicos/psiquiátricos, na vida diária e na capacidade de trabalho comprometendo significativamente o estado geral de saúde (18). São fatores de risco que contribuem para fixação da SPC dificultando a recuperação (19) e transparecendo no escore de pontuação das escalas de avaliação.
Na escala de estado funcional pós-COVID-19, indivíduos graus moderado/grave podem manter alta de biomarcadores inflamatórios, força muscular e capacidade funcional prejudicadas, dispneia e consequentemente menor QV. (20-21)
Esses resultados revelam o quanto a SPC impacta diferentes áreas como cognitivas, emocionais ou motoras, implicando diretamente na QV, no estado funcional e laboral dos acometidos.
CONCLUSÃO
Uma piora significativa na qualidade de vida foi observada nesses pacientes com SPC e nossos resultados mostram a necessidade de continuar os cuidados e monitorização ao longo do tempo. É oportuno estudos clínicos e tratamentos além de verificação de sua eficácia para evitar agravos em saúde.
Financiamento: Este trabalho contou com o apoio financeiro do NMT/UFPA e do CAPES (bolsa de mestrado de Kárila Larissa Pereira de Oliveira).
REFERÊNCIAS