Spatial Analysis of Lethality Due to Severe Acute Respiratory Syndrome by COVID-19 in Maranhão, Brazil, 2020-2022

Spatial Analysis of Lethality Due to Severe Acute Respiratory Syndrome by COVID-19 in Maranhão, Brazil, 2020-2022

Análisis espacial de la letalidad por síndrome respiratorio agudo severo por COVID-19 en Maranhão, Brasil, 2020-2022

Flávio Donalwan Sá Maximino - Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, São Luís, MA, Brasil. ORCID: 0000-0002-3044-9971
 
Maria dos Remédios Freitas Carvalho Branco - Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, São Luís, MA, Brasil. ORCID: 0000-0002-3537-0840

RESUMO

Objetivo: realizar análise da distribuição espacial da letalidade por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) por COVID-19 no Maranhão, de 2020 a 2022. Métodos: Estudo descritivo das taxas de letalidade SRAG por COVID-19 por município de notificação e de residência no Maranhão, a partir de registros no Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe). Resultados: Foram notificados 3.617 óbitos em 2020, 5.288 em 2021 e 588 em 2022. A taxa de letalidade no período foi de 39,1%, sendo 45,3% em 2020; 36,4% em 2021; e 33,3% em 2022. A taxa de letalidade por município de notificação e de residência foi igual a 100% em 18 (8,2%) e cinco (2,3%) municípios, respectivamente. Não notificaram casos 106 municípios (48,8%), enquanto 129 municípios (59,4%) não registraram óbitos. Conclusão: Os dados sugerem que há sub-registros/subnotificações de casos e óbitos no SIVEP-Gripe.

Descritores: Infecções por coronavírus; COVID-19; Síndrome respiratória aguda grave (SRAG); Letalidade.

ABSTRACT

Objective: to carry out an analysis of the spatial distribution of lethality due to Severe Acute Respiratory Syndrome (SARS) due to COVID-19 in Maranhão, from 2020 to 2022. Methods: descriptive study of SARS lethality rates due to COVID-19 by municipality of notification and residence in the Maranhão, based on records in the Influenza Epidemiological Surveillance Information System (SIVEP-Gripe). Results: 3,617 deaths were reported in 2020, 5,288 in 2021 and 588 in 2022. The lethality rate in the period was 39.1%, 45.3% in 2020; 36.4% in 2021; and 33.3% in 2022. The lethality rate by municipality of notification and residence was equal to 100% in 18 (8.2%) and five (2.3%) municipalities, respectively. 106 municipalities (48.8%) did not notify cases, while 129 municipalities (59.4%) did not register deaths. Conclusion: The data suggest that there are underreporting/underreporting of cases and deaths in SIVEP-Gripe.

Descriptors: Coronavirus infections; COVID-19; Severe acute respiratory syndrome (SARS); Lethality.

RESUMEN

Objetivo: realizar un análisis de la distribución espacial de la letalidad por Síndrome Respiratorio Agudo Severo (SRAS) por COVID-19 en Maranhão, de 2020 a 2022. Métodos: Estudio descriptivo de las tasas de letalidad por SARS por COVID-19 por municipio de notificación y residencia en Maranhão, con base en los registros del Sistema de Información de Vigilancia Epidemiológica de Influenza (SIVEP-Gripe). Resultados: se reportaron 3.617 defunciones en 2020, 5.288 en 2021 y 588 en 2022. La tasa de letalidad en el período fue de 39,1%, 45,3% en 2020; 36,4% en 2021; y 33,3% en 2022. La tasa de letalidad por municipio de notificación y residencia fue igual al 100% en 18 (8,2%) y cinco (2,3%) municipios, respectivamente. 106 municipios (48,8%) no notificaron casos, mientras que 129 municipios (59,4%) no registraron defunciones. Conclusión: Los datos sugieren que existe subregistro/subnotificación de casos y defunciones en SIVEP-Gripe.

Descriptores: Infecciones por coronavirus; COVID-19; Síndrome respiratorio agudo severo (SARS); Letalidad.

RECEBIDO: 09/02/2023

APROVADO: 22/03/2023

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos observamos um aumento dos registros e casos de doenças respiratórias infectocontagiosas, de início súbito, de difícil localização e com rápida propagação mundial1. Podemos caracterizar a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) como  uma síndrome respiratória viral infecciosa causada principalmente pelo vírus influenza e em menor proporção por outros agentes etiológicos que infectam o trato respiratório superior2.

O quadro clínico da SRAG se caracteriza por diversos sintomas, incluindo cansaço, desconforto respiratório com baixa absorção de oxigênio, que leva a um quadro de baixa saturação de oxigênio, em geral menor que 95%, que pode levar a uma hospitalização, seguida de suporte ventilatório, admissão em unidade de terapia intensiva (UTI) e aumento da ocorrência de óbitos em leitos hospitalares3.

No Brasil, foi instituído em 2009 o Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe) para monitorar e acompanhar os registros de casos e óbitos por SRAG. Esta estratégia foi adotada em virtude da pandemia do vírus influenza A H1N1, que proporcionou um aumento no número de casos, hospitalizações e óbitos por SRAG. Atualmente, a notificação dos registros de casos e óbitos em unidades hospitalares e dos óbitos domiciliares  por SRAG é obrigatória no país4.

Em 11 de março de 2020 a Organização Mundial de Saúde (OMS) decretava o alerta global para a propagação do vírus severe acute respiratory syndrome coronavirus 2 (SARS-CoV-2), dando início oficialmente à pandemia da COVID-195. No Brasil, o primeiro caso foi registrado em 26 de fevereiro de 2020 e o primeiro óbito 25 dias depois, com rápido avanço por todas as regiões6. Até o dia 04 de janeiro de 2023, foram registrados  36.362.366 casos e 693.981 óbitos por SRAG por COVID-19, com taxa de letalidade igual a 1,9%7.

No Maranhão, Estado do Nordeste brasileiro, o primeiro caso foi registrado em 20 de março de 2020 e o primeiro óbito foi confirmado dez dias depois, em São Luís8. O Estado apresenta 217 municípios, divididos em 19 regionais e oito macrorregiões de saúde, sendo considerado como um dos mais pobres da Federação, apresentando os piores indicadores sociais e de saúde do país, incluindo a baixa oferta de leitos hospitalares, em especial nos municípios do interior9,10. De acordo com o painel do Ministério da Saúde (MS)7, até o dia 04 de janeiro de 2023, o Maranhão apresentou 488.295 casos, 11.035 óbitos, com taxa de letalidade igual a 2,2%, acima da média nacional.

As regiões Norte e Nordeste do país apresentam menor estrutura hospitalar e acessibilidade aos leitos, principalmente de UTI, reduzindo a possibilidade de atendimento com maior qualidade e em tempo hábil, caracterizando uma sobrecarga nos serviços de saúde11. Esta ausência da oferta do serviço é definida como “vazio assistencial”, ou seja, a área territorial que apresenta déficit na quantidade de leitos hospitalares para uma determinada população12.

No Brasil, a acessibilidade aos leitos de UTI durante a pandemia da COVID-19 estava correlacionada à gravidade dos casos e ao consequente aumento do número de óbitos, pois apenas 250 municípios apresentaram taxas de leitos por habitante em um índice aceitável (<0,001075 leitos/habitante). No Maranhão, esta taxa é igual a 0,0016034, valor abaixo da média nacional (0,0018219), embora acima da média da região nordeste (0,001592). Entretanto, a maior parte destes leitos está concentrada nas regionais de São Luís, Imperatriz e Caxias, caracterizando o vazio assistencial em outras regiões do Estado13.

Desta forma, o objetivo do presente artigo é realizar a análise da distribuição espacial da letalidade por SRAG por COVID-19 no Maranhão, considerando-se o município de notificação e o município de residência, nos anos de 2020 a 2022, a partir dos registros do SIVEP-Gripe.

MÉTODOS

Tipo de estudo

Trata-se de estudo ecológico da distribuição das taxas de letalidade por SRAG por COVID-19, segundo município de notificação e de residência no Maranhão, no período de março de 2020 a dezembro de 2022, a partir dos registros do SIVEP-Gripe.

SIVEP-Gripe

O SIVEP-Gripe é o sistema oficial para o registro dos casos e óbitos por SRAG no país, incluindo os óbitos domiciliares. O Ministério da Saúde realiza a vigilância da SRAG desde a pandemia por Influenza A (H1N1), em 2009. A partir desta data a vigilância de SRAG foi implantada na rede de vigilância de Influenza e outros vírus respiratórios e, em 2020, incorporou a vigilância da SRAG por COVID-19, como notificação obrigatória. A notificação dos casos é realizada através por meio da “Ficha de Registro Individual para Casos de SRAG”14.

População de estudo 

A população de estudo foram todos os casos e óbitos por SRAG por COVID-19, ocorridos no período de março de 2020 a dezembro de 2022, residentes e internados/hospitalizados nos municípios do Maranhão, registrados no SIVEP-Gripe. Não foram incluídos os casos e óbitos registrados oriundos de outras unidades federativas, assim como aqueles classificados como descartados, ou como SRAG por outra causa ou agente etiológico.

Foram excluídos os registros de pacientes de outros municípios oriundos de outras unidades federativas e que estavam internados em hospitais do Maranhão, abrangendo somente aqueles residentes e notificados do próprio Estado.

Para a notificação, são considerados casos de SRAG, devendo ser notificados compulsoriamente, os indivíduos com a combinação dos seguintes quadros sintomáticos (SIVEP-Gripe, 2020)14:

  • Febre alta (acima de 37,8ºC) E
  • Tosse OU dor de garganta E
  • Dificuldade respiratória OU dispneia OU saturação de O2 < 95% E
  • Necessitou de hospitalização OU veio a óbito tendo apresentado os sintomas referidos, independentemente de hospitalização.

A classificação final por SRAG no SIVEP-Gripe é baseada nos seguintes critérios: laboratorial, clínico epidemiológico; apenas clínico e clínico-imagem. Pode-se então classificar a SRAG de acordo com o agente etiológico: 1) vírus influenza; 2) outro vírus respiratório; 3) outro agente etiológico; 4) não especificada; ou 5) SRAG por COVID-19, sendo apenas esta última utilizada neste trabalho14.

Fonte de dados 

Foram utilizadas as informações, disponíveis online, do banco de dados de SRAG do SIVEP-Gripe (https://opendatasus.saude.gov.br/dataset), até a atualização disponível no dia 26 de dezembro de 2022.

Variáveis do estudo 

Utilizou-se as seguintes variáveis da Ficha de Registro Individual para casos de SRAG por COVID-19: município de notificação, internação/hospitalização, município de residência, sexo, idade, raça/cor, fator de risco, hospitalização, internação em Unidade de Terapia Intensiva (UTI), suporte ventilatório e evolução para óbito (sim ou não)14.

Para o cálculo da taxa de letalidade e para a análise espacial, considerou-se os casos e óbitos por SRAG por COVID-19 de pessoas residentes e internadas/hospitalizadas em municípios do Maranhão, tendo como referência os estudos realizados em todo o país4,15, nos Estados de Pernambuco, Bahia e Piauí11,16,17, e em quatro capitais de unidade federativas18.

  1. taxa de letalidade por município de notificação: razão entre o número de óbitos e o número de notificações, no município da internação/hospitalização, nos registros no SIVEP-Gripe, por ano de ocorrência, multiplicado por 100.
  2. taxa de letalidade por município de residência: razão entre o número de óbitos e o número de notificações, segundo o município de residência, nos registros no SIVEP-Gripe, por ano de ocorrência, multiplicado por 100.

Análise estatística e espacial

              Os dados foram importados para a linguagem de programação em estatística R, ambientado no software “RStudio”, versão 4.2.1, a partir do banco de dados online do SIVEP-Gripe.

              Posteriormente, foram submetidos à análise estatística descritiva, incluindo frequências absolutas e relativas. Os registros de óbitos por COVID-19 foram agregados por unidade municipal do Estado do Maranhão para o ano de 2020.

Para analisar a localização e o padrão da distribuição espacial dos óbitos de COVID-19, foi utilizado o geoprocessamento disponível no pacote “geobr” do software “RStudio”, definido de forma automática pelo IBGE. Utilizou-se este software também para a manipulação dos dados e plotagem dos mapas para visualização dos resultados.

Aspectos éticos

              Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão (HUUFMA) e pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) sob número de Parecer: 4.098.427 e CAAE 32206620.0.0000.5086, de 19 de junho de 2020.

RESULTADOS

Análise descritiva

No Maranhão, houve 40.016 registros totais de SRAG no período de 2020 a 2022. Foram observadas 12.278 (30,0%) notificações por causa não especificada ou outro agente etiológico, que foram excluídas da análise pois não apresentaram os critérios laboratorial ou clínico para classificação final como SRAG por COVID-19.

Do total de registros, 24.260 (60,6%) apresentaram classificação final por SRAG por COVID-19, com 9.493 óbitos, correspondendo a taxa de letalidade de 39,1%. O número de óbitos notificados por SRAG por COVID-19 foi 3.617 em 2020, 5.288 em 2021 e 588 em 2022. A taxa de letalidade para os anos foi, respectivamente, 45,3% em 2020; 36,4% em 2021; e 33,3% em 2022 (Tabela 1).

 

TABELA 1 – NOTIFICAÇÕES DE CASOS E DE ÓBITOS POR SÍNDROME RESPIRATÓRIA AGUDA GRAVE POR COVID-19, MARANHÃO, BRASIL, 2020-2022

Fonte: Autoria própria, adaptado do SIVEP-Gripe, 2022.

Do total de óbitos no período (9.493), a maioria era do sexo masculino (5.644; 59,5%), com predomínio da raça/cor parda (6.844; 72,1%) e com média de idade de 65,9 anos (±16,9) (Tabela 2). Dentre os óbitos, 4.884 (51,4%) estiveram internados em UTI; 2.989 (31,5%) utilizaram suporte ventilatório invasivo e 6.014 (63,4%) possuíam algum tipo de fator de risco durante a hospitalização (Tabela 3).

TABELA 2 – CASOS, ÓBITOS E LETALIDADE POR SÍNDROME RESPIRATÓRIA AGUDA GRAVE POR COVID-19 SEGUNDO IDADE, SEXO, RAÇA/COR, MARANHÃO, BRASIL, 2020-2022

Fonte: Autoria própria, adaptado do SIVEP-Gripe, 2022.

TABELA 3 – CASOS, ÓBITOS E LETALIDADE POR SÍNDROME RESPIRATÓRIA AGUDA GRAVE POR COVID-19 SEGUNDO FATOR DE RISCO, INTERNAÇÃO EM UNIDADE DE TRATAMENTO INTENSIVO E USO DE SUPORTE VENTILATÓRIO, MARANHÃO, BRASIL, 2020-2022

Fonte: Autoria própria, adaptado do SIVEP-Gripe, 2022.

Análise espacial da taxa de letalidade por SRAG por COVID-19 por município de notificação

Em 2020, 25 municípios (11,5%) registraram taxa de letalidade (TL) por município de notificação igual a 100%, enquanto 136 (62,6%) municípios não registraram óbitos. Em 2021, cinco municípios (2,3%) apresentaram TL por município de notificação igual a 100% (Amarante do Maranhão, Brejo, Lago Verde, Nova Colinas e Peritoró), enquanto 158 (72,8%) municípios apresentaram TL igual a zero. Em 2022, seis municípios (2,7%) apresentaram TL por município de notificação igual a 100%: Açailândia, Brejo, Coroatá, Estreito, Governador Newton Belo e Pedreiras. Outros 182 (83,8%) municípios não registraram óbitos (Figura 1).

No período de 2020 a 2022, 106 municípios (48,8%) não notificaram casos no SIVEP-Gripe. Não houve registros de óbitos em internações/hospitalizações em 119 municípios (54,8%). Dezoito municípios (8,3%) apresentaram TL por município de notificação igual a 100% (Figura 1).

FIGURA 1 – TAXA DE LETALIDADE POR SÍNDROME RESPIRATÓRIA AGUDA GRAVE POR COVID-19 POR MUNICÍPIO DE NOTIFICAÇÃO, MARANHÃO, BRASIL, 2020-2022

Fonte: Autoria própria, adaptado do SIVEP-Gripe, 2022.

Análise espacial da taxa de letalidade por SRAG por COVID-19 por município de residência

Em 2020, vinte municípios (9,2%) apresentaram TL por município de residência igual a 100%; enquanto 43 (19,8%) municípios não registraram óbitos. Em 2021, dez municípios (54,6%) apresentaram TL por município de residência igual a 100%; enquanto sete (3,2%) municípios apresentaram TL igual a zero (Figura 2). Em 2022, apesar da queda do número total de registros (Tabela 1), foram observados 38 municípios (17,5%) com TL por município de residência igual a 100%. Outros 99 (45,6%) municípios não registraram óbitos (Figura 2).

No período de 2020 a 2022, cinco municípios (2,3%) apresentaram TL por município de residência igual a 100% (Bacurituba, Benedito Leite, Brejo de Areia, Satubinha e Tufilândia). Dois municípios (0,9%) não apresentaram registros de óbitos por município de residência: Afonso Cunha e Belágua (Figura 2).

 

FIGURA 2 – TAXA DE LETALIDADE POR SÍNDROME RESPIRATÓRIA AGUDA GRAVE POR COVID-19 POR MUNICÍPIO DE RESIDÊNCIA, MARANHÃO, BRASIL, 2020-2022

Fonte: Autoria própria, adaptado do SIVEP-Gripe, 2022.

DISCUSSÃO

Observou-se que a maioria dos óbitos foram em pessoas do sexo masculino, com média de idade acima dos 60 anos e com comorbidades. Dados similares foram observados no Estado do Piauí, também localizado na região nordeste do país, e que apresenta indicadores sociais semelhantes aos do Maranhão10,11.

Em relação aos leitos hospitalares, a maioria dos óbitos ocorreu em pacientes internados em UTI que utilizaram suporte ventilatório, especialmente em 2021, o que coincide com o processo de interiorização dos casos e com o avanço da variante gama em todo país18.

No Maranhão, quando analisamos a letalidade por município de notificação, observa-se maior frequência dos registros em municípios mais desenvolvidos do Estado e que são sede dos hospitais regionais, possuem maior estrutura hospitalar e que receberam a maior parte dos pacientes internados, incluindo os hospitais de campanha.

Neste sentido, ressalta-se que os dois municípios com as maiores frequências absolutas de óbitos são as cidades de São Luís, a capital, situada ao Norte do Estado, e Imperatriz, segundo município mais populoso, situado na região Oeste, próximo às divisas com os Estados do Tocantins e Pará, na região metropolitana conhecida como “Bico do Papagaio”, representando um pólo hospitalar para a região Centro-oeste do Maranhão. Outros estudos descrevem a influência das regiões metropolitanas nas taxas de letalidade, que elevaria as taxas pela maior oferta de leitos para internação e, consequentemente, para as notificações nos municípios com maior estrutura hospitalar19.

Em relação à taxa de letalidade de acordo com o município de notificação, cabe destacar que 129 municípios (59,4%) não apresentaram registros de óbitos, o que pode ser justificado pela escassez de leitos, em especial de UTI, caracterizando os vazios assistenciais. Por outro lado, durante o período analisado, 18 municípios apresentaram taxa de letalidade de 100%. Sabe-se que as dificuldades de acesso à internação, assim como a baixa qualidade da assistência, podem aumentar a letalidade7,18,19. Entretanto, essa taxa de letalidade provavelmente está relacionada ao sub-registro e à subnotificação de óbitos domiciliares e de casos, assim como, à notificação restrita exclusivamente aos óbitos20, evidenciada em alguns municípios.

Outro fator que sugere existência de subnotificação e  sub-registro de óbitos por SRAG por COVID-19 é o excesso de óbitos por outras causas que foram observados em todo o país durante o curso da pandemia. O excesso de óbitos tem sido uma das medidas mais úteis para avaliar o impacto da COVID-19 na mortalidade, em especial de outras doenças crônicas, além da redução ao acesso aos outros serviços de saúde em pacientes com comorbidades21,22,23.

Apesar do elevado número de mortes registadas durante a pandemia7, é provável que haja elevado sub-registro de óbitos ​​por SRAG por COVID-19, por incertezas e falta de estrutura para o diagnóstico, bem como a falta de experiência dos profissionais nos primeiros meses de 202021. Observa-se também que a maioria das mortes por COVID-19 ocorreu em idosos e pacientes com comorbidades, prejudicando a identificação da causa do óbito. Outro fator que pode ter contribuído para a subnotificação foi a sobrecarga da rede de saúde, pois um óbito que aconteceu em domicílio, fora dos serviços de saúde, teria maiores dificuldades no registro no SIVEP-Gripe21.

Apesar da obrigatoriedade da notificação das SRAG, podemos afirmar que as taxas de notificação no Brasil são baixas e que não correspondem à realidade epidemiológica do país, correspondendo em apenas 9,2% dos casos totais de COVID-19, indicando que os números reais para a situação epidemiológica dos casos e óbitos é cerca de dez vezes maior que o registrado no SIVEP-Gripe20.

Outro fator que sustenta a hipótese da subnotificação/sub-registro é a elevada proporção de registros de SRAG por outro agente etiológico ou por causa não especificada. Estes registros não apresentaram a classificação final de SRAG por COVID-19, provavelmente por falta do critério laboratorial ou de imagem, ausente em várias unidades de saúde. No presente estudo, foram observadas 11.063 (27,9%) notificações por causa não especificada ou outro agente etiológico, que foram excluídas no delineamento metodológico e que poderiam modificar as taxas de letalidade, caso fossem confirmadas como SRAG por COVID-19.

Ressalta-se a ausência de registro de óbitos por SRAG por COVID-19 em dois municípios por município de residência e em 119 municípios por município de notificação/internação. Em contraponto, encontrou-se 18 municípios com taxa de letalidade por município de notificação/internação  e cinco municípios com taxa de letalidade por município de residência igual a 100%, indicando que as notificações no SIVEP-Gripe foram restritas exclusivamente aos óbitos. Por fim, percebe-se a necessidade de melhoria na notificação de casos e de óbitos por SRAG por COVID-19 no SIVEP-Gripe no Estado do Maranhão.

CONCLUSÃO

Os municípios com menor índice de desenvolvimento, com pouca ou nenhuma estrutura hospitalar, apresentaram menores taxas de letalidade. Adicionalmente, encontrou-se diferenças entre as taxas de letalidade dos municípios de notificação e de residência. Os dados sinalizam a existência de sub-registros e subnotificações de casos e óbitos no SIVEP-Gripe no Maranhão. Consequentemente, são necessárias medidas da gestão federal, estadual e municipal para melhoria do registro das notificações no SIVEP-Gripe.

Financiamento

Estudo financiado pela chamada do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), MCTIC/CNPq/FNDCT/MS/SCTIE/Decit Nº 07/2020 – Pesquisas para enfrentamento da COVID-19, suas consequências e outras síndromes respiratórias agudas graves. Termo de Outorga: 401734/2020-0 e pelo edital da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA), n.06/2020 - Fomento à pesquisa no enfrentamento à pandemia e pós-pandemia do COVID-19. Termo de Outorga: 003299/2020.

Conflitos De Interesse

Os autores declararam não possuir conflitos de interesse.

Contribuição Dos Autores

Todos os autores aprovaram a versão final do manuscrito e são responsáveis por todos os seus aspectos, incluindo a garantia de sua precisão e integridade. FDSM participou da pesquisa e concepção do artigo, realizou a organização e análise dos dados do FormSUS e participou de todas as fases até a redação final do artigo. MRFCB contribuiu com a pesquisa e desenho do artigo, orientou todas as fases da pesquisa e participou de todas as fases até a redação final do artigo.

Agradecimentos

Agradecemos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo financiamento do estudo através da chamada MCTIC/CNPq/FNDCT/MS/SCTIE/Decit Nº 07/2020 – Pesquisas para enfrentamento da COVID-19, suas consequências e outras síndromes respiratórias agudas graves. Agradecemos também à Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA) pelo financiamento do estudo através do Termo de Outorga: 401734/2020-0 e pelo edital FAPEMA n.06/2020 - Fomento à pesquisa no enfrentamento à pandemia e pós-pandemia do COVID-19. Termo de Outorga: 003299/2020.

REFERÊNCIAS

  1. Noy I, Shields S. The 2003 Severe Acute Respiratory Syndrome Epidemic: A Retroactive Examination of Economic Costs. ADB Economics Working Paper Series, n.591, 21 p. 2019.
  2. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Protocolo de tratamento de Influenza: 2018. Brasília, 2018.
  3. Guan W, Zheng-yi NI, Yu H, Wen-hua L, Chun-quan O, Jian-xing H, et al. Clinical Characteristics of Coronavirus Disease 2019 in China. N Engl J Med. NEJMoa2002032, 2020. Disponível em: doi:10.1056/NEJMoa2002032. Acesso em: 21 ago. 2022.
  4. Bastos LS, Niquini RP, Villela DAM, Cruz OG, Coelho FC, Codeço CT, et al. COVID-19 e hospitalizações por SRAG no Brasil: uma comparação até a 12ª semana epidemiológica de 2020. Cad. Saúde Pública. 36 (4). 2020. https://doi.org/10.1590/0102-311X00070120.
  5. World Health Organization - WHO. WHO Director-Gernal’s opening remarks at the media briefing on COVID-19 [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2020. Available from: https://www.who.int/dg/speeches/detail/who-director-general-s-openingremarks-at-the-media-briefing-on-covid-19. Acesso em 11 nov. 2022.
  6. Cavalcante JR, Cardoso-dos-Santos AC, Bremm JM, Lobo AP, Macário EM, Oliveira WK, et al. COVID-19 no Brasil: evolução da epidemia até a semana epidemiológica 20 de 2020 [internet]. Epidemiol. Serv. Saúde 29 (4). 2020.: e2020376 [access on: Dez. 09, 2022]. Available: https://doi.org/10.5123/S1679-49742020000400010.
  7. Ministério da Saúde. Coronavírus Brasil: painel coronavírus. [Internet]. 2022. Disponível em: https://covid.saude.gov.br/Acesso em: 04 djan. 2023.
  8. Maranhão. Secretaria de Estado da Saúde do Maranhão. Boletim Epidemiológico COVID-19. 2022. Atualizado em 17.out.2022. Disponível em: https://www.saude.ma.gov.br/boletins-covid-19/. Acesso em: 04 jan. 2022.
  9. Maranhão. Secretaria de Estado da Saúde. Comissão Intergestores Bipartite (CIB). Resolução No 44, 16 de junho de 2011, dispõe sobre a conformação das Regiões de Saúde. Disponível em: https://www.mpma.mp.br/arquivos/COCOM/arquivos/RESOLUCAO_CIBMA_44_2011.pdf. Acesso em 09 dez. 2022.
  10. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Síntese de indicadores sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira: 2019. Rio de Janeiro: IBGE/Coordenação de População e Indicadores Sociais, 2019a. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101678.pdf. Acesso em: 20 Out. 2022.
  11. Sousa EL, Gaído SB, Sousa RA, Cardoso OO, Matos Neto EM, Menezes Junior JMP, et al. Perfil de internações e óbitos hospitalares por síndrome respiratória aguda grave causada por COVID-19 no Piauí: estudo descritivo, 2020-2021. Epidemiol. Serv. Saúde. vol.31. no.1 Brasília, DF. mar. 2022. Epub 04-Abr-2022. http://dx.doi.org/10.1590/s1679-49742022000100009.
  12. Raksa VP, Oliveira AG, Silva CL. Governança Pública Em Saúde e Os Vazios Assistenciais – Territorialização para o Planejamento e Ações do Estado. Informe Gepec. Toledo - PR, V.20, n2, p.10-27.jul/dez. 2016.
  13. Boitrago GM, Mônica RB, Marcolino Silva D, Cerroni M de P, Cortez-Escalante JJ, Almiorn M, et al. Reestruturação dos serviços de emergência à COVID-19 no Brasil: uma análise espaço-temporal, fevereiro a agosto de 2020. Epidemiol. Serv. Saúde. vol.30. no.4. Brasília, DF. dez. 2021. Epub 22-Out-2021. http://dx.doi.org/10.1590/s1679-49742021000400004.
  14. Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Gripe, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Ficha de Registro Individual - Casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave Hospitalizados. Disponível em: https://opendatasus.saude.gov.br/dataset/39a4995f-4a6e-440f-8c8f-b00c81fae0d0/resource/9f0edb83-f8c2-4b53-99c1-099425ab634c/download/ficha_srag_hospitalizado_23.03.2021.pdf. Acesso em 20/Out/2022.
  15. Hillesheim D, Tomasi YT, Figueiró TH, De Paiva KM. Síndrome respiratória aguda grave por COVID-19 em crianças e adolescentes no Brasil: perfil dos óbitos e letalidade hospitalar até a 38a Semana Epidemiológica de 2020. Epidemiol. Serv. Saúde 29 (5). 2020. https://doi.org/10.1590/S1679-49742020000500021.
  16. Cabral Silva APS, Souza Maia LT, De Souza WV. Síndrome Respiratória Aguda Grave em Pernambuco: comparativo dos padrões antes e durante a pandemia de COVID-19. Ciênc. saúde coletiva. 25 (suppl 2). Out. 2020. https://doi.org/10.1590/1413-812320202510.2.29452020.
  17. Carvalho AD, De Deus AAF, Trindade TCS, Tittoni AA. Perfil epidemiológico dos casos e óbitos por síndrome respiratória aguda grave confirmados para COVID-19. Rev. Baiana de Saúde Pública. v. 45, N Especial 1, p. 19-32. jan./mar. 2021. https://doi.org/10.22278/2318-2660.2021.
  18. Orrelana JDY, Marrero L, Horta BL. Letalidade hospitalar por COVID-19 em quatro capitais brasileiras e sua possível relação temporal com a variante Gama, 2020-2021. Epidemiol. Serv. Saúde. vol.30. no.4. Brasília, DF. dez. 2021. Epub 29-Nov-2021. http://dx.doi.org/10.1590/s1679-49742021000400024.
  19. Cavalcante JR , Xavier DR , Dos Santos CVB, Pungartnik PC, Guimarães RM. Análise espacial do fluxo origem-destino das internações por síndrome respiratória aguda grave por COVID-19 na região metropolitana do Rio de Janeiro. Rev. bras. epidemiol. 24. 2021. https://doi.org/10.1590/1980-549720210054.
  20. Do Prado MF , Paula Antunes BB , Bastos LSL, Peres IT , Da Silva AAB , Dantas LF, et al. Análise da subnotificação de COVID-19 no Brasil. Rev. bras. ter. intensiva 32 (2). Apr-Jun. 2020. https://doi.org/10.5935/0103-507X.20200030.
  21. Santos AM, Souza BF, Carvalho CA, Campos MAG, Oliveira BLA, Diniz EM, et al. Excess deaths from all causes and by COVID-19 in Brazil in 2020. Rev. Saúde Pública, 55, 71. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2021055004137.
  22. Carvalho Branco MRF. Excesso de mortes no Brasil durante a pandemia de Covid-19. Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH). Violações dos direitos humanos no Brasil: denúncias e análises no contexto da Covid-19 [recurso eletrônico] / Sociedade Maranhense de Direitos Humanos ... [et al.]. – Passo Fundo: Saluz, 2021. 227 p. ISBN: 978-85-69343-72-1. https://doi.org/10.5281/zenodo.5643632
  23. Orellana JDY, Da Cunha GM, Marrero L, Moreira RI, Costa Leite I, Horta BL. Excesso de mortes durante a pandemia de COVID-19: subnotificação e desigualdades regionais no Brasil. Cad Saude Publica. 37. nº.1. Rio de Janeiro – RJ. Janeiro. 2021. https://doi.org/10.1590/0102-311X00259120.