CONHECIMENTO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE SOBRE COMUNICAÇÃO DE MÁS NOTÍCIAS EM UM PRONTO SOCORRO

KNOWLEDGE OF HEALTH PROFESSIONALS ABOUT COMMUNICATING BAD NEWS IN AN EMERGENCY ROOM

CONOCIMIENTO DE LOS PROFESIONALES DE LA SALUD SOBRE LA COMUNICACIÓN DE MALAS NOTICIAS EN URGENCIAS.

AUTORES: 

Bruna da Silva Cardoso  - Acadêmica de enfermagem pela Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS). Brasília, DF, Brasil. Autora Correspondente. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8562-5162 

Isadora Emílio Garcia  - Acadêmica de enfermagem pela Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS). Brasília, DF, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0009-0003-7223-8798

Daffiny Cardoso dos Santos - Acadêmica de enfermagem pela Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS). Brasília, DF, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0009-0004-3695-7311

Eduarda Maia Félix - Acadêmica de enfermagem pela Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS). Brasília, DF, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0009-0001-3822-4427

Larissa Pinheiro Rodrigues - Acadêmica de enfermagem pela Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS). Brasília, DF, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0009-0008-6016-8311

Marcelo Moreira da Silva - Acadêmico de enfermagem pela Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS). Brasília, DF, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0009-0009-8802-4034

Ângela Maria Rosas Cardoso - Enfermeira. Doutora em Bioética pelo Programa de Pós-Graduação em Bióetica da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília (2023). Brasília, DF, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3865-4320

Moisés Wesley de Macedo Pereira -  Enfermeiro. Mestre em Ciências Médicas pela Universidade de Brasília (UnB). Brasília, DF, Brasil.  ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8666-5702

RESUMO

Objetivo: Esse estudo teve como objetivo identificar o processo de comunicação de más notícias pelos profissionais de saúde que atuam em uma unidade de Pronto Socorro de um hospital de atenção secundária a rede de saúde do Distrito Federal, visando reconhecer as estratégias e a utilização do Protocolo SPIKES.  Método: Estudo observacional, descritivo com abordagem qualitativa e exploratória, realizada com 24 profissionais de saúde (enfermeiros, técnicos de enfermagem, fisioterapeutas e médicos) lotados no Pronto Socorro. A coleta de dados foi realizada por meio de entrevista em profundidade com roteiro semiestruturado, cuja análise ocorreu com utilização do software Iramuteq® e da Análise de Conteúdo de Bardin, categorias temáticas. Resultado: Evidenciou-se que no âmbito do Pronto Socorro os profissionais desconhecem o Protocolo SPIKES e não utilizam nenhum protocolo para informar más notícias aos pacientes e familiares. Conclusão: Os profissionais necessitam de capacitação profissional, pois relatam possuir dificuldades para lidarem com tais situações. 

DESCRITORES: Comunicação em Saúde; Educação Profissional em Saúde Pública; Serviços Médicos de Emergência; Protocolos Clínicos.

SUMMARY

Objective: This study aimed to identify the process of communicating bad news by health professionals who work in an Emergency Unit of a secondary care hospital in the health network of the Federal District, aiming to recognize the strategies and use of the SPIKES Protocol. Method: Observational, descriptive study with a qualitative and exploratory approach, carried out with 24 health professionals (nurses, nursing technicians, physiotherapists and doctors) working in the Emergency Room. Data collection was carried out through in-depth interviews with a semi-structured script, the analysis of which took place using the Iramuteq® software and Bardin's Content Analysis, thematic  categories. Result: It was evident that in the Emergency Room, professionals are unaware of the SPIKES Protocol and do not use any protocol to inform bad news to patients and family members. Conclusion: Professionals need professional training, as they report having difficulties in dealing with such situations.

DESCRIPTORS: Health Communication; Professional Education in Public Health; Emergency Medical Services; Clinical Protocols.

RESUMEN

Objetivo: Este estudio tuvo como objetivo identificar el proceso de comunicación de malas noticias por profesionales de salud que actúan en una Unidad de Emergencia de un hospital de atención secundaria de la red de salud del Distrito Federal, buscando reconocer las estrategias y el uso del Protocolo SPIKES. Método: Estudio observacional, descriptivo, con abordaje cualitativo y exploratorio, realizado con 24 profesionales de salud (enfermeros, técnicos de enfermería, fisioterapeutas y médicos) que actúan en el Servicio de Urgencias. La recogida de datos se llevó a cabo mediante entrevistas en profundidad con guión semiestructurado, cuyo análisis se realizó mediante el programa informático Iramuteq® y el Análisis de Contenido de Bardin, categorías temáticas. Resultados: Se evidenció que en Urgencias los profesionales desconocen el Protocolo SPIKES y no utilizan ningún protocolo para informar de malas noticias a pacientes y familiares. Conclusiones: Los profesionales necesitan formación profesional, ya que refieren tener dificultades para afrontar estas situaciones.

DESCRIPTORES: Comunicación en Salud; Formación Profesional en Salud Pública; Servicios de Emergencias Médicas; Protocolos Clínicos.

Recebido: 30/08/2023 Aprovado: 18/09/2023

Tipo de artigo: Artigo Original

INTRODUÇÃO 

A qualidade do processo de comunicação é fundamental aos profissionais de saúde, tratando-se de más notícias, tanto para o paciente, quanto para sua família, considerando as diferentes reações e comportamentos das pessoas frente a uma condição com potencial de causar sofrimento. [1]

Gibello, Parsons e Citero (2020) [2] entendem que a comunicação em saúde é uma questão fundamental, pois está diretamente relacionada ao cuidado geral do usuário, seja no início do diagnóstico ou no cuidado ao final da vida, sempre com foco no bem-estar psicobiológico, psicoespiritual e psicossocial, além da satisfação, a qualidade e a segurança da assistência prestada. 

Portanto, o desenvolvimento dessa habilidade fortalece e subsidia competências no exercício cotidiano da assistência de saúde em diferentes contextos nos serviços de saúde. Nesse caminho, aponta-se a importância de protocolos deliberativos, construídos de forma plural, visando nortear e facilitar a comunicação de más notícias pelos diferentes profissionais, especialmente, em áreas críticas, como Pronto Socorro e Unidade de Terapia Intensiva. [3]

As más notícias podem ser definidas como toda informação que trará sofrimento, seja ela por uma mudança drástica de vida, no presente e futuro, como exemplo, o prognóstico negativo ao diagnóstico clínico, ou seja, situações de mudança que irão causar desconforto e/ou tristeza ao paciente e pessoas envolvidas, especialmente, familiares. [4]

Desse modo, entende-se que, a forma como essa notícia será comunicada poderá propiciar sofrimentos ou dificultar a adesão ao tratamento, bem como, poderá indicar caminhos que possam oferecer conforto e esperança. Portanto, o profissional no momento de informar as más notícias, não pode alterar o seu conteúdo, mas pode e deve empenhar-se em estratégias para reduzir o impacto, a partir do comprometimento ético e respeitoso à pessoa inserida nesse contexto. [5-6]

A vivência do conhecimento dessas notícias aos pacientes e familiares envolvidos no processo, na esfera de urgências e emergências, geralmente envolve muitos sofrimentos e angústias, pois precisam lidar com a experiência de passar por um prognóstico grave, a probabilidade de óbito ou sequelas graves e irreversíveis. [7]

Diante desses aspectos, a tarefa de comunicar más notícias costuma ser algo difícil para a maioria dos profissionais de saúde, portanto, o estabelecimento de protocolos pode facilitar a identificação e a adoção dos principais aspectos a serem trabalhados nesse momento. Buckman (1992) [4] desenvolveu um modelo para facilitar o processo de comunicação, o protocolo SPIKES, que fornece diretrizes para a comunicação de más notícias, visando um fluxo claro e assertivo para facilitar essa intervenção pelo profissional de saúde em diferentes contextos de trabalho. Nesse caminho, estabeleceu-se um mnemônico de seis passos: S – Setting up: Preparando-se para o encontro; P – Perception: Percebendo o paciente; I – Invitation: Convidando para o diálogo; K – Knowledge: Transmitindo as informações; E – Emotions: Expressando emoções; S – Strategy and Summary.

Desse modo, o protocolo SPIKES visa propiciar mais segurança ao trabalhador, tendo como objetivos principais, a compreensão da situação em geral pelos pacientes e familiares, o fornecimento de informações sobre a situação em questões, a partir da percepção dos sentimentos das pessoas envolvidas, o acolhimento às demandas e sentimentos apresentados no momento e por fim, o estabelecimento de um planejamento. [8]

Diante do exposto, esse estudo teve como objetivo identificar a partir dos discursos dos profissionais de saúde que atuam em Pronto Socorro, a utilização do Protocolo SPIKES no processo de comunicação de más notícias.

METODOLOGIA 

Estudo descritivo, exploratório, de natureza qualitativa, visto que essa metodologia possibilita ao pesquisador trabalhar com o universo dos significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. [9]

Amostra de conveniência composta de 24 profissionais de saúde lotados em um Pronto Socorro de um Hospital Público, atuando há pelos menos seis meses e com carga horaria de pelos menos 20 horas. A determinação do número de participantes seguiu o princípio e a estratégia da saturação, ou seja, quando não se encontram mais dados adicionais. [10]

As entrevistas foram realizadas entre setembro a dezembro de 2021, conduzidas pelas próprias acadêmicas de enfermagem nas dependências da unidade, garantindo a privacidade e a confidencialidade aos participantes. Sendo realizada com o método em profundidade a partir de um roteiro semiestruturado, e pautada principalmente nos passos do protocolo SPIKES. 

As entrevistas duraram cerca de 11 minutos, visto que os profissionais estavam no cenário do Pronto Socorro e em meio ao momento crítico da pandemia pelo novo coronavírus. Foi solicitada a gravação em áudio, e a sua anuência, mediante a assinatura no termo de autorização de imagem e som. Para manter o anonimato dos participantes, os nomes foram trocados pela letra E, seguida sistematicamente do número da entrevista, assim apresentou-se como: E1, E2, E3, E4... e assim, sucessivamente. 

No processamento dos dados utilizou-se o método Reinert (Classificação Hierárquica Descendente) do software Iramuteq® (Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et Questionnaires) versão 0.7 Alpha 2. [11] Este software permite a associação de segmentos de texto considerados relevantes, o agrupamento das palavras estatisticamente significativas, a sugestão de categorias e temas relevantes, e o processamento de dados. 

Nesse sentido, o software não é um método de análise de dados, mas uma ferramenta para processá-los, dessa forma, para a análise das classes de palavras geradas pelo software, utilizou-se a Análise do Conteúdo de Bardin, modalidade categoria temática, que envolve a busca a partir de um conjunto de dados, a fim de encontrar os padrões repetidos de significado. [12] Os dados quantitativos dos dados sociodemográficos foram tabulados e submetidos à análise descritiva simples. 

O presente trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa, sob o Parecer n.º 4.718.194. 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O grupo de participantes é composto por 8 médicos, 8 enfermeiros, 5 técnicos de enfermagem e 3 fisioterapeutas, sendo 41,66% do sexo feminino e 58,33% do sexo masculino. Em relação à faixa etária, a média foi de 41 anos de idade variando entre 29 e 57 anos. No que diz respeito ao estado civil, 16 profissionais são casados, 6 são solteiros e 2 tem união estável. 

Por meio do software Iramuteq®, obteve-se a Classificação Hierárquica Descendente (CHD) no escrito analisado. Assim, surgiram cinco classes: classe 1, 14,3%; classe 2, 22,9%; classe 3, 17,9%; classe 4, 14,3%; e classe 5, 26,4%. A figura 1 apresenta o dendograma e as respectivas designações das classes, de modo que a designação das classes foi feita após análise da proximidade semântica entre as palavras.

Definição de más notícias 

Essa classe evidencia o pensamento dos profissionais quanto à compreensão sobre más notícias. Os resultados evidenciam uma diferença na compreensão dos profissionais acerca do conceito, alguns atribuem à possibilidade do óbito, outros conseguem visualizar de forma mais abrangente o sentido atribuído às más notícias, como, um prognóstico ruim ou a indicação de um paciente para cuidados paliativos. 

Esses aspectos reverberam o pensamento de Fontes et al (2017) [1] onde ressaltam que as más notícias podem ser compreendidas como qualquer informação que causará um sofrimento ao paciente, e para sua família, mudando sua perspectiva de futuro ou prognóstico de saúde. 

Más notícias é o óbito, prognóstico ruim de doença diagnóstico de doença o fato do paciente ser paliativo e ele ainda não saber essas coisas para mim são muito ruins. E18 

Eu considero que as más notícias sejam uma informação para pacientes e familiares que vai trazer grande sofrimento, acho que basicamente é isso. O óbito, uma doença grave, um prognóstico ruim, uma doença incurável. E24

Sendo assim, a comunicação de más notícias é considerada uma das responsabilidades mais desafiadoras e importantes de um professional de saúde. Consiste em compartilhar com pacientes e familiares notícias sobre a necessidade de internação ou condições que possam levar a uma situação de risco de vida. [13]

Requisitos para comunicação de más notícias e habilidades profissionais.

Nessa classe os discursos dos participantes apontam algumas condições que consideram necessárias para a comunicação de más notícias, como, a empatia, o acolhimento, a segurança, o conhecimento e sentir-se preparado para conseguir acolher as demandas das pessoas, evitando que os seus próprios sofrimentos o impeçam de acolher os sofrimentos das pessoas, naquele momento de fragilidade em que se encontram. Calsavara, Comin e Corsi (2019)14 ressaltam que comunicação possibilita a redução de conflitos e mal-entendidos entre os profissionais, pacientes e familiares.

Essas más notícias podem gerar negação, logo é preciso ter um bom senso uma delicadeza de saber explicar o preparo de cada familiar conhecido que chegue para buscar informação eu separo bem minha vida profissional da minha vida pessoal. E2  

Na hora de comunicar más notícias o profissional deve possuir segurança, certeza do que vai falar e não se deixar levar pela emoção, porque nessa hora precisamos dar apoio para o paciente, se você se emocionar igual ao paciente você não dá o apoio necessário. E10

Considero importante no profissional para comunicar más notícias a sensibilidade, a percepção da família, o melhor momento de dar a notícia e tranquilidade. E14

Os profissionais também relatam como costuma ser a interação com o paciente no momento de comunicar más notícias e destacam a importância da ética e do cuidado humanizado nesse momento estressante. Entendem que é um desafio e que a reação de cada paciente é diferente, por isso prezam pela objetividade e clareza em suas falas.

Sento e falo aconteceu essa situação, dentro da melhor maneira possível da mais humanizada possível e assim, até para darmos informações temos que ter aquela parte de humanidade, você não pode chegar de qualquer jeito dizendo morreu, entendeu. E13

Eu tento ser o mais ética possível, normalmente quando o paciente e a família recebem notícias ruins eles ficam muito abalados, às vezes revoltados, desesperados, às vezes eles não te compreendem, às vezes eles sentem que que você tem culpa por causa daquele momento ruim. E17

Importância da capacitação por meio do protocolo e habilidade profissionais

Essa classe aborda a opinião dos profissionais a respeito da necessidade de capacitação, o desconhecimento de protocolos e a percepção de suas habilidades profissionais. 

Aqui é mais livre mesmo sem protocolo nenhum mesmo porque aqui a gente não tem protocolo para isso até onde eu sei não tem. E13

Eu creio que não usemos protocolo aqui as vezes que eu já́ vi é quando conversa pergunta o que o familiar é aí fala a gravidade e que a pessoa veio a óbito. E19 

Portanto, evidencia-se a ausência de padronização de condutas, especialmente, na comunicação de más notícias, o que dificulta a adoção de condutas mais adequadas nas diversas situações vivenciadas pelos profissionais, conforme sugere Koch, Rosa e Bedin (2017). [15] Entretanto, apesar de não existir um protocolo específico na unidade em que atuam, os profissionais buscam comunicar más notícias de forma acolhedora e respeitosa. 

Não tem protocolo aqui, se tem ninguém nunca informou pra gente, mas eu procuro quando sou eu que dou as más notícias, pergunto se já estava sabendo que o paciente estava grave, se ela sabe sobre o paciente. E20 

Nesse sentido, o planejamento de ações educativas visando a capacitação dos profissionais que atuam na assistência ao paciente crítico, como, o pronto-socorro, para o desenvolvimento de habilidades para comunicar más notícias, considerando que os participantes reconhecem a ausência dessas capacitações e apontam a importância de que os gestores favoreçam a implementação dessas ações por meio da educação permanente no âmbito da própria unidade de trabalho.

Não participei de capacitação para passar esse tipo de informação, mas se tivesse e fosse no meu horário de trabalho eu faria importante. É realmente importante ter uma capacitação, porque a gente ou envolve demais ou envolve menos entendeu. E eu acho que não é questão de não envolver, é questão de passar uma segurança, porque às vezes eu vou dar más notícias e choro junto com o paciente, é preciso que a gente tenha uma capacitação. E21

Outras estratégias possíveis e apontadas por alguns participantes, compreendem ações educativas em parcerias com outras instituições.

Já participei de uma comunicação de más notícias há um tempo eu fiz parte da comissão de doação e transplante de órgãos a gente fazia esse trabalho de abordagem da família comunicação. Já fiz um curso sobre como comunicar más notícias, mas foi há um tempo foi esse curso no Einstein. E2

Já participei de dois cursos de capacitação em comunicação de más notícias um da USP e outro de cuidados paliativos na hora de comunicar uma má notícia o profissional deve ser empático. Se houvesse um curso de capacitação para comunicar más notícias aqui no pronto socorro eu gostaria de participar. E11

Dessa maneira, a grande maioria dos profissionais não se sentem preparados para dar a notícia, pois agem por intuição e deixam as emoções prevalecerem no momento de transmiti-la.[16] Isso é ilustrado na fala dos profissionais, que relatam desenvolver apego com os pacientes, e tristeza quando se identificam com alguma situação. 

Mas nem sempre a gente consegue, existem vários fatores, se você é mãe, irmã, se você tem um parente parecido ou alguém na sua família que passou pela mesma situação, a gente não é só profissional, a gente é humano. E18 

Ressalta-se que, os participantes consideram a capacitação para a comunicação de más notícias como algo importante e necessário, tendo em vista a necessidade de estarem melhor preparados emocionalmente, bem como, oferecerem segurança e o suporte necessário nesse momento às pessoas envolvidas.  

Necessidade de ambiente adequado para comunicação de más notícias

Essa classe evidencia as dificuldades quanto à estrutura do hospital que impossibilita a oferta de um local adequado que propicie maior privacidade ao profissional, pacientes e familiares para a comunicação de más notícias, e, consequentemente, os profissionais costumam conversar com as pessoas nos próprios leitos de emergência ou corredores, entre outros lugares. Entretanto, os profissionais apresentam sua angustia diante da ausência de um espaço mais apropriado, pois compreendem como um dos aspectos que podem ampliar o sofrimento das pessoas envolvidas.

Esses aspectos, também são apontados por Rech (2021) [17], pois o autor ressalta a necessidade de garantir um ambiente privado, sem interrupções e tranquilo. Entretanto, de acordo com o que foi observado, não há a condição estrutural para a oferta desse ambiente, e, consequentemente, um ambiente acolhedor que amenize os níveis de estresse e angústia do paciente e do profissional, favorecendo maior tranquilidade e o adequado acolhimento às diferentes demandas que podem surgir nesse momento.

As más notícias são dadas no ambiente mesmo, não existe um ambiente separado aqui, toda notificação com qualquer profissional acontece a beira leito. E2

Geralmente aqui não tem espaço reservado, aqui a gente fala no corredor mesmo ou no leito, mas geralmente é no corredor. Você chama o paciente em um negócio a parte e fala. Não tem esse espaço reservado que você tá falando, não tem aqui. E13

Não costuma ser reservado o local que passamos más notícias, o familiar vem aqui na porta e não é um lugar reservado. E19  

Análogo a esse pensamento, Rech (2021) [17] refere que embora as circunstâncias tornem o ambiente desafiador, a capacidade de se comunicar e ter empatia com as circunstâncias pode aliviar o fardo das más notícias. Desse modo, percebe-se que existe o esforço por parte de uma pequena parcela de profissionais para realizar as etapas do protocolo SPIKES, mesmo que o profissional em questão não tenha o entendimento do que se trata especificamente, visto que também referem não utilizar nenhum protocolo. 

Eu acho que o processo de cuidado deveria ser mais reservado, não sei se tem possibilidade disso, porque há muitos anos trabalho aqui e não vejo isso, como a gente não tem muito espaço. E18

Não tem um protocolo específico, era mais um cuidado e a percepção de que cada um vai olhar e reagir de uma forma diferente. A gente ia aprendendo um pouco às cegas, não tinha um protocolo específico aplicado. E2

Não tenho conhecimento sobre o protocolo SPIKES. E1

É necessário perceber que existem equipes com perspectivas e modos diferentes de trabalho, tendo em vista que, as fases do luto não são trabalhadas no pronto socorro, e que alguns profissionais de saúde se expressam de forma muito impessoal e distanciada justificando a falta de envolvimento como uma forma de proteção. 

A gente não trabalha as fases do luto com o paciente aqui. Nós trabalhamos de forma fria, o acompanhante daquele paciente pode desenvolver um processo patológico devido à perda do paciente, e não existe nenhum mecanismo de você trabalhar esse luto do ente querido. E4

Me envolver não. A gente como profissional não pode se envolver com isso, mesmo tendo nossa parte humana temos que ser técnicos e profissionais, não podemos nos envolver e eu procuro fazer dessa maneira. E13

Dificuldades e sentimentos dos profissionais no momento de comunicar más notícias.

Essa categoria evidencia as dificuldades enfrentadas pelos profissionais para a comunicação e más notícias e seus sentimentos em relação a essa situação, em que se evidenciam o desconhecimento sobre um protocolo específico para comunicação de más notícias, a desinformação e insegurança dos profissionais da saúde. 

Ademais, os dados obtidos mostram que antes de informar o paciente sobre más notícias, o profissional vive um estresse antecipatório, medo e ansiedade. Nesse sentido, Baile (2015) [18] afirma que a capacitação para a transmissão de más notícias poderia aumentar a confiança do profissional, diminuir o desconforto, além de fornecer consciência das emoções e ajudar a encontrar formas de enfrentamento para lidar com o estresse que essa situação provoca, reduzindo a ansiedade e tornando a comunicação mais efetiva. 

É difícil, mesmo a gente estando preparado, porque cada situação é uma situação, hoje você está em uma, amanhã você já está em outra diferente, é muito difícil se acostumar com isso, mesmo assim a gente se sente ainda meio inibido, constrangido. E13

Não sei se algum dia a gente vai estar preparado para fazer esse tipo de coisa, mas eu acho que cada vez que a gente faz isso, aprendemos novas maneiras de fazer isso e menos traumáticas. E24

A empatia dos profissionais de saúde é valorizada pelos pacientes e seus familiares, principalmente na comunicação de más notícias. No que concerne a isso, alguns participantes afirmaram receber apoio da equipe no momento de comunicar más notícias, relatando que pode ser um momento solitário e o suporte de outros profissionais é fundamental, considerando que, para alguns participantes, esse momento se torna mais doloroso por não possuir um apoio de outros profissionais da equipe para oferecer apoio. 

Acho difícil não sei te falar tenho medo da reação das pessoas de precisar de um psicólogo e não ter naquele momento e não dar conta de segurar a barra depois porque a gente não sabe como vai ser a reação deles. E1

Na hora de dar as más notícias não me sinto bem, geralmente eu chamo um psicólogo, um assistente social, nunca vou sozinha. E9

Quando vou acompanhar ou dar notícia eu chamo uma coleguinha, alguém pra dar uma força e conversar, porque realmente é difícil. E16

Portanto, importante que os profissionais identifiquem habilidades a serem desenvolvidas, bem como, as suas fragilidades e as circunstâncias que possam impedir o vínculo com o paciente e a família. [19] Nesse sentido, percebe-se que alguns participantes ficam muito sensibilizados e envolvidos demasiadamente com a situação, o que resulta em sofrimentos diante da impotência e incapacidade de fazer algo que possa mudar a situação apresentada aos familiares e pacientes. 

É preciso uma força sobrenatural para estar ali não chorar as vezes é difícil conseguir, mas a gente vai e faz. E9

Eu já acompanhei e como te digo assim a gente sente influenciável sensibilizado e às vezes atrapalha um pouco no trabalho sabe? Tipo assim, meio que desequilibra um pouco a gente, isso deixa a gente muito sensibilizado às vezes atrapalha. E18

Compreende-se que o manejo dos próprios sentimentos e dos demais envolvidos apresenta-se como um grande desafio, considerando os diferentes eventos envolvidos, como, o entendimento quanto ao que de fato envolve a comunicação de más notícias, o modo de como lidar com a situação, e principalmente, o medo de propiciar uma comunicação efetiva, desgastando a relação profissional e paciente. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS 

O desenvolvimento do presente estudo possibilitou a análise da atuação e percepção dos profissionais do Pronto Socorro acerca da informação de más notícias e percepção em relação ao protocolo SPIKES. Identificou-se que não há a utilização do protocolo SPIKES no processo de comunicação de más notícias, além de existir defasagem na capacitação dos servidores e a presença de barreiras intrínsecas para a realização de uma comunicação efetiva, visto que a interpretação de más notícias é subjetiva e possuem vários significados para os profissionais entrevistados. 

Diante disso, os participantes relatam não utilizar nenhum tipo de protocolo, percebendo assim fragilidades inerentes ao lidar com sentimentos de ansiedade, medo e frustração diante de más notícias, adversidade em informar de maneira empática, sem envolver-se demasiadamente com os problemas do trabalho, deixando que afetem sua vida pessoal, e também a existência de uma barreira estrutural da própria ambientação em não haver um local reservado para informa-las de modo humanizado. 

Este estudo evidencia que, a oferta de educação continuada dos profissionais no Pronto Socorro é de extrema importância para que, no momento de comunicar más notícias, o trabalhador sinta-se seguro e capacitado para isso. A capacitação da comunicação de más notícias é uma ferramenta crucial para minimizar possíveis danos psicossociais e espirituais, sanar estigmas envolvidos em todo o âmbito apresentado e potencializar a assistência técnica e humanizada.

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