PRESBIFAGIA E QUALIDADE DE VIDA: EXISTE ESSA RELAÇÃO?

PRESBYPHAGIA AND QUALITY OF LIFE: IS THERE A RELATIONSHIP?"

PRESBIFAGIA Y CALIDAD DE VIDA: ¿EXISTE ESA RELACIÓN?

AUTORES:

Juliana Venites -  Doutora em Ciências pela Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP. Centro de Ensino e Assistência Fonoaudiológica (CEAF) - ORCID: 0000-0002-6422-7250

Cristina Zerbinati Carro -  Mestre em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina do ABC/SP. Centro de Ensino e Assistência Fonoaudiológica (CEAF) - ORCID: 0000-0003-4026-5479

Aila Janaina Pimenta  - Especialista em Disfagia pelo Conselho Federal de Fonoaudiologia. Centro de Ensino e Assistência Fonoaudiológica (CEAF)- ORCID: 0000-0001-7012-260X

Rayssa Novais Luiz -  Pós-graduada em Disfagia pelo Hospital das Clínicas - FMUSP. Centro de Ensino e Assistência Fonoaudiológica (CEAF) - ORCID: 0000-0002-5836-8065

Tereza Loffredo Bilton -  Doutora em Ciências Radiológicas pela Universidade Federal de São Paulo.  Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP - ORCID: 0000-0003-4450-5695

Francelise Pivetta Roque -  Pós Doutora pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP. Universidade Federal Fluminense. ORCID: 0000-0002-0998-8014

Brasília Maria Chiari (IN MEMORIAN) - Professora Titular aposentada de Fonoaudiologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/UNIFESP).

RESUMO 

Objetivo: verificar os sintomas de presbifagia em idosos ativos e o impacto na qualidade de vida. Métodos: Participaram 186 indivíduos, sendo 93 idosos ativos de um centro de convivência e 93 adultos universitários. Foram excluídos aqueles com doenças neurológicas, gástricas, disfagia, ocasiões anormais no MEEM e na escala BOMFAQ. A média de idade foi de 72,3 anos para idosos e 24,8 para adultos. Os participantes responderam a um questionário sobre alimentação e deglutição, além do protocolo WHOQOL (versão bref). Resultados: Os sintomas de presbifagia incluíam dificuldade em mastigar, deglutir saliva, comprimidos, líquidos finos, sólidos secos e dupla consistência. Apesar dos sintomas, a qualidade de vida dos idosos foi melhor, exceto no domínio das relações sociais. Conclusão: mesmo idosos saudáveis ​​apresentam sintomas de presbifagia, mas o impacto na qualidade de vida não foi evidente, possivelmente devido à adaptação natural à idade.

DESCRITORES: Deglutição; Envelhecimento; Disfagia; Idoso; Qualidade de Vida

ABSTRACT

Objective: To verify the symptoms of presbyphagia in active elderly people and the impact on their quality of life. Methods: 186 individuals took part, 93 of them active elderly people from a community center and 93 university adults. Those with neurological or gastric diseases, dysphagia or abnormal scores on the MMSE and the BOMFAQ scale were excluded. The average age was 72.3 for the elderly and 24.8 for the adults. The participants answered a questionnaire on eating and swallowing, as well as the WHOQOL protocol (bref version). Results: Presbyphagia symptoms included difficulty chewing, swallowing saliva, tablets, thin liquids, dry solids and double consistency. Despite the symptoms, the quality of life of the elderly was better, except in the area of social relationships. Conclusion: Even healthy elderly people have symptoms of presbyphagia, but the impact on quality of life was not evident, possibly due to natural adaptation to age.

DESCRIPTORS: Deglutition; Aging; Dysphagia; Elderly; Quality of Life

RESUMEN

Objetivo: Comprobar los síntomas de presbifagia en ancianos activos y el impacto en su calidad de vida. Métodos: Participaron 186 individuos, 93 de ellos ancianos activos de un centro comunitario y 93 adultos universitarios. Se excluyeron aquellos con enfermedades neurológicas o gástricas, disfagia o puntuaciones anormales en el MMSE y la escala BOMFAQ. La edad media era de 72,3 años para los ancianos y de 24,8 años para los adultos. Los participantes respondieron a un cuestionario sobre alimentación y deglución, así como al protocolo WHOQOL (versión bref). Resultados: Los síntomas de presbifagia incluían dificultad para masticar, tragar saliva, comprimidos, líquidos poco espesos, sólidos secos y doble consistencia. A pesar de los síntomas, la calidad de vida de los ancianos era mejor, excepto en el ámbito de las relaciones sociales. Conclusión: Incluso los ancianos sanos presentan síntomas de presbifagia, pero el impacto en la calidad de vida no fue evidente, posiblemente debido a la adaptación natural a la edad.

DESCRIPTORES: Deglución; Envejecimiento; Disfagia; Ancianos; Calidad de vida

RECEBIDO: 26/05/2023 APROVADO: 18/07/2023

TIPO DE ARTIGO: Artigo Original 

INTRODUÇÃO

O aumento da população idosa é uma realidade mundial. Estima-se que em quinze anos a população com idade superior a 60 anos some 1,2 bilhões de pessoas. Nos países em desenvolvimento como o Brasil, este aumento é ainda mais significativo. O Brasil tem mais de 28 milhões de pessoas nessa faixa etária, número que representa 13% da população do país e esse percentual tende a dobrar nas próximas décadas, segundo a Projeção da População, divulgada em 2018 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (1).

Compreender o envelhecimento e suas particularidades é primordial para a estruturação de um suporte social e de saúde nas mais variadas instituições que atendem a esta parcela da população. Por ser inexorável e inerente a cada indivíduo, envelhecer é um processo global e multidimensional que considera não somente as questões biológicas, mas também os aspectos psicológicos e sociais (2).

Para os idosos, o conceito de saúde está fortemente ligado à sua capacidade funcional e intrínseca, ou seja, à sua capacidade de determinar e executar seus próprios desígnios. A capacidade de gerir sua vida sem ou com o mínimo de auxílio é fator determinante para um envelhecimento ativo e saudável (3).  Todavia, a velhice é para a maioria, um tempo de doenças crônicas e múltiplas comorbidades, como quadros neurológicos focais e progressivos, fragilidade e demências. Um sintoma associado a estas doenças, é a disfagia, que pode ser definida como uma alteração no trajeto do alimento da boca até o estômago, colocando o indivíduo em risco de desnutrição e/ou aspiração pulmonar, piorando sua capacidade física e funcional e levando à morte. Mesmo em idosos ativos e saudáveis, o organismo sofre alterações em decorrência da idade. A presbiopia e a presbiacusia são exemplos conhecidos e de baixo impacto na qualidade de vida, porém apenas recentemente a presbifagia (envelhecimento normal da deglutição), seus sintomas e impactos têm sido estudados. 

Os sintomas da presbifagia, na maioria das vezes, passam despercebidos não somente pelos pacientes como pelos profissionais de saúde. Mas, mediante a uma piora clínica ou agravamento de um quadro de saúde, a disfagia pode se desenvolver causando ainda mais comorbidades (4).

À luz de uma lacuna literatura científica de uma população que se torna cada dia mais numerosa e demandante de atenções sociais e de saúde, o presente estudo tem como objetivo verificar a presença de sintomas de presbifagia em idosos ativos e o impacto destes sintomas na qualidade de vida.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo analítico de corte transversal aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob o protocolo número 638.798/201. 

1 - Local

Visando entrevistar idosos ativos, elegeu-se um centro de convivência para a terceira idade de um município da grande São Paulo, como cenário para parte da coleta. Em sua grande maioria, seus frequentadores procuram as atividades espontaneamente e comparecem por vontade própria, desfrutam das aulas e atividades, adquirem novos conhecimentos e fazem novos amigos. Neste sentido, pode-se dizer que a população presente neste local apresenta características que demonstram equilíbrio e harmonia na interação multidimensional formada pela saúde física, mental e integração social, ou seja, de um envelhecimento saudável e ativo. 

Os sujeitos incluídos no grupo de adultos foram alunos de uma universidade particular da cidade de São Paulo, entrevistados no próprio ambiente escolar.  A participação na pesquisa foi voluntária para ambos os grupos. Os entrevistadores percorreram as salas de aulas e atividades do centro de terceira idade e da universidade divulgando a entrevista e se colocando à disposição das pessoas que desejassem participar, informando o local em que pudessem ser encontrados e telefone para contato. 

2- Casuística

O cálculo do tamanho da amostra de no mínimo 93 sujeitos por grupo foi realizado de acordo com a consulta estatística. Foram entrevistados 196 sujeitos divididos em grupos: 93 idosos ativos e 93 adultos universitários, no período de fevereiro a novembro de 2015. Apesar da escolha dos ambientes diminuírem consideravelmente a possibilidade de os sujeitos da pesquisa não apresentarem boa saúde, autonomia e independência, foi realizada uma triagem inicial objetivando excluir alterações cognitivas, funcionais e de deglutição.

Nesta etapa, aplicaram-se três protocolos para ambos os grupos:

a-) Mini Exame de Estado Mental (MEEM), foram incluídos, na presente pesquisa, os entrevistados que obtiveram somatória maior ou igual para sua faixa escolar conforme sugerido pelos autores (5).

b-) BOMFAQ (Brazilians Older Multidimensional Functional Assessment Questionnaire), escala de capacidade funcional, validada para a língua portuguesa (6). Foram incluídos no estudo somente os entrevistados que responderam não ter dificuldade em nenhuma atividade ou pouca dificuldade em apenas duas das atividades e tarefas do dia a dia questionadas.  

c-) EAT-10 (Eating Assessment Tool) (7) fornece informações sobre funcionalidade, impacto emocional e sintomas físicos de um problema de deglutição. Foram incluídos apenas os indivíduos que responderam negativamente a todas as perguntas.

3 – Instrumentos de Pesquisa

Em seguida, os sujeitos que preencheram os critérios da seleção da amostra, foram submetidos a uma entrevista dividida em três instrumentos:

3.1- Questionário sócio-cultural 

Incluiu os seguintes dados gerais: nome, telefone, sexo, idade, escolaridade, profissão, ocupação anterior e atual, renda per capta, problemas de saúde autorreferidos, co-habitação do idoso (mora sozinho, com a família ou outras pessoas) e habilidades prévias de leitura e escrita.

3.2- Características da Presbifagia 

Não foi possível encontrar na literatura referente um protocolo validado que reunisse questões específicas de deglutição para idosos ativos. Diante disso, para conhecer estas mudanças oriundas da presbifagia tornou-se necessária a elaboração de um questionário (apêndice I) que investiga se estas modificações são comuns apenas no envelhecimento ativo ou se também estão presentes na vida adulta de um indivíduo adulto que relata boa saúde.

3.3- Investigação da Qualidade de Vida 

Foi aplicado o Questionário de Qualidade de Vida Abreviado da Organização Mundial da Saúde (WHOQOL- World Health organization Quality of life group – versão bref. O WHOQOL-bref, validado no Brasil (8) é um instrumento com teor amplo e sociológico, diferente de outros instrumentos de qualidade de vida voltados para doentes ou populações que enfrentam um problema específico. É uma versão resumida do WHOQOL e apresenta 26 perguntas, sendo duas gerais e as demais distribuídas em quatro domínios geral, físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente. A pontuação é realizada por meio da Sintaxe do SPSS. Quanto mais alto o valor do resultado, melhor a qualidade de vida.

3.4- Procedimentos e estatística

As entrevistas foram realizadas nos horários de entrada e intervalo das atividades, tanto para o grupo de idosos como para o de jovens, a fim de não prejudicar a atividade dos mesmos no ambiente da pesquisa. A duração total da abordagem (leitura/assinatura do termo, triagem e entrevista) foi de 50 a 80 minutos. Nesta análise estatística foram utilizados os softwares: SPSS V17, Minitab 16 e Excel Office 2010, com os seguintes testes: teste de ANOVA, teste de igualdade de duas proporções, correlação de pearson, teste para o coeficiente de correlação e intervalo de confiança para a média.

RESULTADOS

Aspectos sócio-culturais:

Dos 196 indivíduos entrevistados, observou-se predomínio do sexo feminino. As mulheres representaram 76,3% do grupo adulto e 80,6% do grupo de idosos, não havendo diferença estatística entre os grupos. A média etária da população estudada foi de 24,8 (±7) anos para os adultos e 72,3 (±5) para os idosos.  A comparação do número de anos estudados pelos grupos foi significativa. Os adultos referiram ter estudado 12,4 (±1) anos e os idosos 5,6 (±3,7) anos.  Foram também estatisticamente significantes as diferenças entre os grupos na comparação da escolaridade (adultos 12,4 anos e idosos 5,6 anos) e da renda per capta (1.311,00 reais para os adultos e 1.954,00 para os idosos). Não foi observado analfabetismo em ambos os grupos.

Na descrição das ocupações anteriores ao momento da pesquisa, obtiveram-se diferenças estatísticas nas ocupações manuais (nenhum adulto e 72% dos idosos) e manuais de nível médio (100% para os adultos e 18,3% para os idosos). No questionamento sobre a coabitação, verificou-se diferença estatística apenas entre os que relataram morar sozinhos (6,5% dos adultos e 29% dos idosos).

Características da Presbifagia

Obteve-se diferença estatística entre os grupos ao compararmos a ausência de dentes (28% dos idosos e nenhum jovem) e a presença de todos os dentes (39,8% dos jovens e nenhum idoso). Com relação ao uso de prósteses e o tipo das mesmas verificou-se um panorama bastante variado, porém sem diferença estatisticamente significante, conforme observado no gráfico abaixo: 

(Gráfico 01 – Comparação entre uso e tipos de prótese e de implantes dentários entre adultos e idosos.)

Na pesquisa das dificuldades de mastigação e deglutição de comprimidos, saliva, líquidos finos, sólidos e duplas consistências, verificou-se que todos os aspectos apresentaram significância estatísticas, exceto a deglutição de pastosos, conforme visualiza-se no gráfico 2:

(Gráfico 02 – Comparação das dificuldades de mastigação e deglutição entre adultos e idosos)

Investigação da Qualidade de vida

Ao comparar o WHOQOL bref realizado para ambos os grupos, verificou-se a existência de diferença estatística para todos os domínios, sendo a qualidade de vida dos idosos melhor que a dos adultos. Somente no domínio “Relações Sociais” o grupo de adultos teve média maior (82,26) do que grupo de idosos (72,76), como é possível ver no gráfico 3:

(Gráfico 3 – Comparação dos achados no questionário de qualidade de vida (WHOQOL bref) dos grupos de adultos e idosos)

DISCUSSÃO

Verificou-se que as mulheres foram a maioria dos entrevistados (76,3% dos adultos e 80,6% dos idosos), dado justificado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (censo 2010), onde as mulheres são a maioria no ensino superior, como também entre a população acima dos 60 anos de idade (1). 

A deglutição é definida como um fenômeno bastante dinâmico e complexo, e para ocorrer de forma adequada e eficaz necessita da ação conjunta de várias estruturas do sistema estomatognático. Um dos principais fatores que podem alterar a funcionalidade de deglutição é o envelhecimento, o mesmo é caracterizado como um fenômeno natural do ser humano, que envolve diversas mudanças estruturais e funcionais (2).

A amostra do estudo exibiu uma variação no quesito dentição, cujos idosos entrevistados apresentaram a dentição mais preservada, quando comparados à dentição de idosos da população brasileira (9). Uma hipótese é o fato de que a coleta dos dados do grupo de idosos foi realizada num município com alto Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e que oferece ao munícipe adequada infraestrutura de atenção à pessoa idosa, dispondo de diversas clínicas odontológicas municipais.

Mesmo com esse perfil dentário mais privilegiado, as dificuldades de mastigação foram estaticamente significativas em relação ao grupo de adultos. Isto reflete que a perda muscular inerente ao envelhecimento pode interferir na eficiência mastigatória, e não somente a condição dentária (10).

O presente estudo apontou que 40,9% dos idosos apresentaram dificuldade na deglutição de comprimidos. As formas farmacêuticas sólidas de uso oral (comprimidos e cápsulas) são as mais utilizadas (11). Dessa forma, ao considerarmos os indivíduos com dificuldade na ingestão de comprimidos, devemos elencar dois fatores preocupantes: potencial risco para engasgos e ocorrência de pneumonia aspirativa, além da perda ou diminuição do efeito medicamentoso devido à supressão da posologia indicada.

Refletindo sobre o resultado do estudo, sobre o crescente envelhecimento da população mundial e sobre suas implicações, uma proposta interessante para as indústrias farmacêuticas seria a adoção de estratégias para formas farmacêuticas de uso oral voltados inteiramente para este perfil populacional, por exemplo, fármacos em formato líquido. Essa composição facilitaria a deglutição e, consequentemente, a adesão ao tratamento medicamentoso. Além disso, seria de grande importância a possibilidade de espessamento destes fármacos, para abranger também os que apresentam dificuldade para deglutir líquido fino- 21,5% dos idosos da amostra. 

A presbifagia geralmente é causada pela modificação, tanto anatômica quanto fisiológica, das estruturas de cabeça e pescoço com o avanço da idade, perda muscular (sarcopenia), redução da reserva funcional e doenças relacionadas à idade (12). As dificuldades de deglutição dos idosos encontradas no presente estudo (saliva, líquidos finos, sólidos e duplas consistências) foram compatíveis com a literatura científica (13,14,15,16). Estas dificuldades geralmente não aparecem de forma clara e autorreferida em consultas médicas de rotina do idoso, quando ocorrem eventos mais contundentes já estão instalados, como pneumonias por repetição ou desnutrição, ou seja, quando há um processo disfágico presente. Isto porque, adaptam a rotina e os hábitos alimentares, por exemplo, ingerindo pedaços menores, umedecendo os alimentos secos, tendo maior preferência para alimentos macios, evitando líquidos e/ou alimentos difíceis de engolir. Encaram como uma mudança na preferência ou como algo esperado ao processo natural do envelhecimento (4,14).

Outro fator que colabora com o encaminhamento tardio para a avaliação e tratamento fonoaudiológico é a falta de conhecimento dos profissionais de saúde deste início tímido, mas muito relevante aparecimento das queixas de deglutição. Não há perguntas sobre a performance de deglutição em triagens e avaliações geriátricas. Se o profissional não pergunta, o sintoma passa despercebido e mascarado por uma mudança de consistência espontânea do paciente em sua dieta.

Portanto, é de extrema importância a atenção aos sintomas de presbifagia por parte dos profissionais da saúde e o questionamento aos idosos sobre possíveis dificuldades e/ou queixas em relação à mastigação e deglutição, para que seja identificado e encaminhado precocemente visando evitar o aparecimento da disfagia e suas derivadas comorbidades.

Visando compreender como a presbifagia impactava a qualidade de vida, verificou-se maiores valores nos domínios “Físico”, “Psicológico” e “Meio ambiente” do WHOQOL bref no grupo dos idosos que nos adultos. Apenas no domínio “Relações Sociais” é que o grupo de adultos teve média maior (82,26) do que o grupo de idosos (72,76).

Na literatura especializada, foi encontrado apenas um estudo que relacionou dificuldades de mastigação de idosos ativos e deglutição com qualidade de vida, realizado por (17). Verificaram correlação destas dificuldades com menores scores nos domínios de saúde física e mental no questionário de qualidade de vida SF-8, o que não foi observado no presente estudo.

Todavia os dados da presente pesquisa parecem alinhar-se com as pesquisas (18) que ao estudarem a satisfação com a vida de adultos universitários, verificaram baixos índices, mas o grupo que se julgava “mais feliz” atribuía esta sensação de felicidade à atenção social, ou seja o convívio social com outras pessoas, o que condiz com o domínio “Relações sociais” em que os adultos tiveram maior média que os idosos.

Podemos então pensar que, a rotina intensa de trabalho e estudo diários, associados a poucas possibilidades de descanso e lazer vivenciadas pelo grupo de adultos universitários influenciou negativamente sua qualidade de vida comparativamente ao grupo de idosos estudados.

De maneira esperada, o único domínio que o grupo de adultos superou o grupo de idosos, as “relações sociais”, pode ser justificado pelo fato de um número significativo de idosos (29%) residirem sozinhos. A realização das atividades de vida diária sem a companhia de outra pessoa pode gerar um sentimento de solidão, que transparece nas respostas do WHOQUOL bref.

CONCLUSÃO

O envelhecer é um processo multifacetado. O declínio das funções orgânicas, as modificações nos papéis sociais, as alterações na capacidade funcional e a proximidade da finitude são algumas dessas facetas.

Todavia, a maneira como esta transformação acontece com cada indivíduo é bastante particular, já que dependerá de sua história de vida e do meio no qual está inserido. Sua maneira de ver o mundo, suas crenças e as marcas de toda uma vida que um organismo carrega é bastante diferente do outro.

O grupo idoso, embora ultrapassasse o grupo de adultos em qualidade de vida, em três dos quatro itens estudados, apresentou importante índice de dificuldades de mastigação e deglutição, seguindo os achados internacionais.

A adaptação natural da consistência da dieta atribuída como preferência e a crença que o envelhecer pressupõe perdas funcionais podem fazer com que impacto negativo desses achados não tenham sido verificados.

Todavia, as dificuldades relatadas se tornam ainda mais relevantes quando associados a informação de outro panorama: diante de um quadro agudo, neurológico, infeccioso ou sistêmico idosos com dificuldades de deglutição podem tornar-se frágeis, condição que eleva o índice de intercorrências como a pneumonia aspirativa, desnutrição e desidratação (2, 15,19).

Diante desse panorama, programas de prevenção, detecção precoce e alerta das consequências nutricionais e físicas dos problemas de deglutição deveriam ser elaborados e amplamente divulgados em instituições cujo foco é o atendimento ao idoso, tanto nas esferas públicas quanto privadas (20).

REFERÊNCIAS 

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