MÍDIAS SOCIAIS E TEMPO DE TELA E A RELAÇÃO COM A OBESIDADE INFANTIL: SCOPING REVIEW
SOCIAL MEDIA AND SCREEN TIME AND THE RELATIONSHIP WITH CHILDHOOD OBESITY: SCOPING REVIEW
LAS REDES SOCIALES Y EL TIEMPO FRENTE A LA PANTALLA Y LA RELACIÓN CON LA OBESIDAD INFANTIL: REVISIÓN DEL ALCANCE
Autores
Lílian Oliveira da Silva Vitória. Enfermeira pelo Centro Universitário de João Pessoa. https://orcid.org/0009-0003-1361-6023
Vinícius Rodrigues de Oliveira. Enfermeiro pela Universidade Regional do Cariri. Mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Doutorando em Enfermagem Universidade Federal do Rio Grande do Norte. . https://orcid.org/0000-0002-9915-0062.
Maria Milaneide Lima Viana. Enfermeira pelo Centro Universitário de João Pessoa. Mestra em Enfermagem pela Universidade Federal da Paraíba. https://orcid.org/0000-0001-81368496.
Lorena Sofia dos Santos Andrade. Enfermeira, Mestra em Saúde Pública pela Universidade Estadual da Paraíba. Doutoranda em Enfermagem pela Universidade Estadual do Pernambuco. https://orcid.org/0000-0003-4766-1482.
Najara Rodrigues Dantas. Enfermeira pela Universidade Regional do Cariri. Mestra em Enfermagem pela Universidade Regional do Cariri. https://orcid.org/0000-0003-4852-0075.
Averlândio Wallysson Soares da Costa. Enfermeiro pela Universidade Estadual do Rio Grande do Norte. Mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. https://orcid.org/0000-0001-9305-9965.
Mariana de Sousa Dantas Rodrigues. Enfermeira, Mestra em Enfermagem e Doutora em Enfermagem pela Universidade Federal da Paraíba. https://orcid.org/0000-0001-7296-0455.
Amanda Soares. Enfermeira pela Universidade Federal de Campina Grande. Mestre em Saúde Pública pela Universidade Estadual da Paraíba. Doutoranda em Saúde Coletiva Universidade Federal do Rio Grande do Norte. https://orcid.org/0000-0001-8063-4131
RESUMO
Objetivo: mapear estudos recentes que apontam evidências científicas no contexto das mídias sociais e ao tempo de tela como fatores de risco para a obesidade infantil. Métodos: Caracteriza-se como uma Scoping Review, baseada no protocolo proposto pelo Joanna Briggs Institute e organizada pelo Preferred Reporting Items for Systematic Review and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews. Resultados: Foram identificados 211 artigos. Após o processo de seleção por título, resumo, disponibilidade na íntegra, restaram 21 estudos, que foram analisados de forma criteriosa. Foram excluídos 9 artigos após a leitura na íntegra por indissociabilidade com o tema abordado, totalizando 12 artigos incluídos. Conclusões: Conclui-se que o tempo de tela e as mídias sociais, quando usadas excessivamente, apresentam resultados negativos para a saúde infantil, bem como atraso no desenvolvimento e comportamento, inatividade física ou tempo menor de atividades que estão ligadas à parte motora, sobrepeso, obesidade, sono irregular, dentre outros.
DESCRITORES: Tempo de Tela; Obesidade Infantil; Mídias Sociais.
Objective: To map recent studies that point to scientific evidence in the context of social media and screen time as risk factors for childhood obesity. Methods: This is a Scoping Review, based on the protocol proposed by the Joanna Briggs Institute and organized by the Preferred Reporting Items for Systematic Review and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews. Results: 211 articles were identified. After selection by title, abstract and availability in full, 21 studies remained, which were analyzed carefully. After reading the full text, 9 articles were excluded due to their inseparability from the topic, making a total of 12 articles included. Conclusions: It can be concluded that screen time and social media, when used excessively, have negative results for children's health, such as delays in development and behavior, physical inactivity or less time spent on activities linked to motor skills, overweight, obesity, irregular sleep, among others.
DESCRIPTORS: Screen Time; Childhood Obesity; Social Media.
RESUMEN
Objetivo: Mapear los estudios recientes que apuntan a la evidencia científica en el contexto de los medios sociales y el tiempo frente a la pantalla como factores de riesgo para la obesidad infantil. Métodos: Se trata de una Scoping Review, basada en el protocolo propuesto por el Instituto Joanna Briggs y organizada por la extensión Preferred Reporting Items for Systematic Review and Meta-Analyses for Scoping Reviews. Resultados: Se identificaron 211 artículos. Tras la selección por título, resumen y disponibilidad en su totalidad, quedaron 21 estudios, que se analizaron detenidamente. Tras la lectura del texto completo, se excluyeron 9 artículos por ser inseparables del tema tratado, totalizando 12 artículos incluidos. Conclusiones: Se puede concluir que el tiempo de pantalla y los medios sociales, cuando son utilizados en exceso, tienen efectos negativos en la salud de los niños, como retrasos en el desarrollo y en el comportamiento, inactividad física o menor tiempo dedicado a actividades motoras, sobrepeso, obesidad, sueño irregular, entre otros.
DESCRIPTORES: Tiempo de Pantalla; Obesidad Infantil; Medios Sociales.
Tipo de artigo: Revisão de Literatura
Recebido: 03/06/2024 Aprovado: 04/09/2024
INTRODUÇÃO
A obesidade pode ser designada como uma doença, do mesmo modo que é um fator de risco para a saúde em todas as faixas etárias, com ascendência entre crianças em idade escolar. Nas últimas décadas, a sua prevalência aumentou, principalmente em países desenvolvidos e entre crianças e adolescentes esse indicador quadruplicou nos últimos 30 anos1.
Segundo o Ministério da Saúde2, estima-se que 6,4 milhões de crianças tenham excesso de peso no Brasil e 3,1 milhões já evoluíram para obesidade. A doença afeta 13,2% das crianças entre 5 e 9 anos que são acompanhadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e as consequências se estendem ao longo da vida.
Diante dessa realidade, a obesidade vem sendo alvo de intervenções governamentais no Brasil, desde a primeira Política Nacional de Alimentação e Nutrição em 1999, quando surgiu como um problema de saúde pública, em decorrência dos avanços em sua prevalência3.
O aumento nos índices da doença possui uma relação com determinantes de saúde, como os socioeconômicos, biológicos, ambientais, psicossociais e culturais. Todavia, o fator de risco predominante é o ambiente, onde, com frequência, são disponibilizados alimentos processados e ultraprocessados, favorecendo a ingestão em excesso quando comparada com a oferta de alimentos in natura. O ambiente também pode desestimular a prática de atividades físicas4.
Constata-se que o comportamento alimentar tem início na infância, nos primeiros meses de vida. Os cuidadores devem ser estimuladores para que a criança venha a se alimentar com moderação, levando-a a associar o início de uma refeição à sensação de fome e o término da refeição à sensação de saciedade. Em conjunto as orientações, é possível fundamentar as práticas educativas a partir de conhecimentos regionais e culturais da criança, comunicando que as atitudes corretas sejam elogiadas e as incorretas corrigidas5.
Ainda sobre os fatores de risco que podem interferir no comportamento alimentar e físico das crianças, é importante mencionar o novo perfil de atividades ocupacionais que essas possuem, que é o uso de equipamentos tecnológicos, como smartphones, computadores, tablets, televisão e outros. As crianças gastam uma parte significativa do seu tempo com jogos sedentários e com acesso às redes sociais, aumentando o tempo de uso de telas1.
A realidade familiar atual é de que a maioria das famílias não possuem a disponibilidade de tempo suficiente para monitorar as crianças e o uso de recursos de mídia fora do ambiente escolar. As mídias sociais passaram a preencher o tempo das crianças e se tornaram os seus companheiros preferidos, atuando como papel socializador e interferindo em questões sociais e de saúde, dentre elas as práticas alimentares e atividades físicas.
Para além de todos os fatores de risco apresentados, é perceptível que a indústria produtora de alimentos encontra espaço para atrair mais usuários através de propagandas de televisão e redes sociais. O fato é que o tema da publicidade infantil de alimentos apresenta um cenário delicado, uma vez que as crianças são caracterizadas pelo direito civil como hipossuficientes e é o público infantil o mais assíduo espectador dessas publicidades. A problemática contribui para o agravamento de questões como a obesidade infantil e menos tempo de brincadeiras, seguido de atraso no desenvolvimento6.
Segundo Rodrigues8, entre 2017 e 2020, a média de crianças que possuíam o hábito de realizar refeições assistindo à televisão foi acima de 60% no Brasil e no Nordeste, em 2020, foi de 64%. Essa informação expõe a necessidade do fortalecimento de discussões nos serviços de saúde e espaços educacionais sobre a regulação do tempo de tela e uso de mídias sociais para crianças e sua relação com a obesidade. Perante a exposição, questiona-se: quais as evidências científicas estão disponíveis para a determinação de adoção de estratégias de atenção à saúde da criança, considerando o contexto das mídias sociais e ao tempo de tela como fator de risco para a obesidade infantil?
Nesse sentido, este estudo se justifica pela necessidade de identificar pesquisas que contemplem a temática sobre o uso de recursos midiáticos – através de redes sociais, jogos eletrônicos e o tempo de exposição à tela – relacionados à obesidade na infância. Portanto, pretende-se mapear estudos recentes que apontem evidências científicas no contexto das mídias sociais e ao tempo de tela como fator de risco para a obesidade infantil.
MÉTODO
O presente estudo se caracteriza como Scoping Review, baseada nas recomendações propostas pelo Joanna Briggs Institute e organizada pelo Preferred Reporting Items for Systematic Review and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews (PRISMA- ScR).
A questão-problema de pesquisa foi construída utilizando a estratégia PCC, que recomenda, como componentes essenciais, o mnemônico: P- População, C- Conceito, C- Contexto. Foram definidos os elementos: P (Crianças); C (Fatores de Risco para obesidade); C (Mídias Sociais e tempo de tela). Baseado nisso, foi elaborada a seguinte questão: quais as evidências científicas estão disponíveis para a determinação de adoção de estratégias de atenção à saúde da criança, considerando o contexto das mídias sociais e ao tempo de tela como fator de risco para a obesidade infantil?
Após a formulação desse questionamento, partiu-se para a etapa de identificação dos estudos relevantes nas bases de dados do Medical Literature Analysis and Retrievel System Online (MEDLINE) e Cumulative Index to Nursing and Allied (CINAHL). A busca também foi realizada na Biblioteca de Saúde Virtual (BVS), Biblioteca Eletrônica Científica Online (SCIELO) e Portal de Periódico CAPES.
A estratégia de busca contemplou três etapas: na primeira, a busca foi limitada aos Descritores em Saúde (DeCS), Medical Subject Headings (MeSH) e Cumulative Index to Nursing and Allied (CINAHL), seguida por uma análise das palavras mais frequentes acerca da temática central. Na segunda etapa, foram realizadas buscas em todas as bases de dados utilizando as palavras-chave identificadas na etapa anterior, elaborando as estratégias de busca com descritores e operadores booleanos.
Na terceira etapa, foram definidos os critérios de inclusão: artigos completos, com a participação de crianças; pesquisas cuja temática central abordasse sobre obesidade infantil, mídias sociais e tempo de tela, nos idiomas inglês, espanhol e português, publicados entre 2017 e 2022. Foram excluídas as publicações que não respondiam à questão de pesquisa e os artigos duplicados. Com a organização dos critérios de seleção da amostra, resultou-se no quadro 1.
Tabela 1 – Estratégia de busca em bases de dados e portal de periódicos. Brasil, 2022
Bases de dados/ Portal de periódico |
Estratégia de busca |
Amostra |
BVS |
(obesidade pediátrica) AND (manejo da obesidade) AND (fatores de risco) AND (saúde da criança) AND (tempo de tela) OR (mídias sociais) AND ( fulltext:("1" OR "1") AND mj: ("Obesidade Pediátrica" OR "Comportamento de Redução do Risco" OR "Comportamento Infantil") AND la:("en" OR "es" OR "pt")) AND (year_cluster:[2017 TO 2022]) |
100 resultados |
Pubmed/Medline |
(((((Pediatric Obesity) AND (Obesity Management)) AND (Risk Factors)) AND (social media)) OR (screen time)) AND (Child Health) Filtros: 2017 - 2022; Inglês; Português; Espanhol; Texto completo gratuito; livros, documentos, metanálise, revisão sistemática. |
22 resultados |
Scielo |
((obesidade infantil) AND (mídias sociais) OR (tempo de tela)) AND (saúde da criança) Filtros: 2017 - 2022; Inglês; Português; Espanhol; Texto completo. |
23 resultados |
CINAHL |
(pediatric obesity prevention ) AND ( (risk factors) AND (FM T)) OR ( (social media children) AND (FM T) ) OR ( (screen time and children) AND (FM T) ) AND ( (obesity management) AND (FM T) ) Filtros: 2017 - 2022; Inglês; Português; Espanhol; Texto completo com tradução; Texto completo em PDF; Idade = todas as crianças. |
12 resultados |
Portal Capes |
(obesidade pediátrica) AND (fatores de risco) AND (mídias sociais) OR (tempo de tela) Filtros: 2017 - 2022; Inglês; Português; Espanhol; Acesso aberto; crianças, fatores de risco. |
54 resultados |
Fonte: Medical Literature Analysis and Retrievel System Online (MEDLINE), Biblioteca de Saúde Virtual (BVS), Biblioteca Eletrônica Científica Online (SCIELO), Cumulative Index to Nursing and Allied (CINAHL) e o Portal de Periódico CAPES, (2022).
Para a sistematização da revisão dos artigos e literaturas, essa etapa foi empreendida de maneira independente por dois revisores. Os artigos resultantes da etapa de seleção foram inseridos no aplicativo Web Rayyan (Ouzzani et al., 2016) e esses foram avaliados na função duplo cego. Após a conclusão da avaliação dos títulos e dos resumos, de acordo com a pergunta de revisão, a avaliação foi aberta para a discussão da seleção de cada revisor. Não houve discordâncias entre os revisores.
Os dados referentes às recomendações acerca do uso de telas na infância, como meio de prevenção ou enfrentamento da obesidade infantil, foram extraídos e formatados em um corpus textual que foi processado através do software Interface de R pour les Analyses Multidimensionneles de Textes et le Questionnaires (IRaMuTeQ). A apresentação dos resultados foi construída mediante identificação de informações relacionadas às variáveis descritivas e será apresentada na seção de resultados.
RESULTADOS
De acordo com a apresentação da figura 1, foram selecionados 12 (doze) artigos.
Figura 1 - Diagrama PRISMA dos estudos incluídos na revisão de escopo.
Fonte: Medical Literature Analysis and Retrievel System Online (MEDLINE), Biblioteca de Saúde Virtual (BVS), Biblioteca Eletrônica Científica Online (SCIELO), Cumulative Index to Nursing and Allied (CINAHL) e o Portal de Periódico CAPES, (2022).
Durante a pesquisa realizada nas bases de dados mencionadas, foram identificados 211 (duzentos e onze) artigos, em que, após o processo de seleção por título e resumo, restaram 25 (vinte e cinco) estudos. Após a aplicação dos filtros, conforme a figura 1, 4 (quatro) artigos foram excluídos por não estarem disponíveis na íntegra. Os 21 (vinte e um) estudos resultantes da seleção foram analisados de forma criteriosa, porém foram excluídos 9 (nove) artigos, após a leitura na íntegra por indissociabilidade com o tema abordado, totalizando 12 (doze) artigos incluídos para a construção da revisão de escopo.
Entre os achados, observa-se que os estudos, em sua maioria, foram realizados na Austrália (33.3%), correspondendo a 4 (quatro) estudos. O Brasil e os Estados Unidos representaram 16,7% da amostra com duas pesquisas feitas em cada país; e Portugal, China, Canadá e Dinamarca produziram 1 (um) artigo em cada país.
No desenho metodológico, houve predominância da revisão sistemática com 83.3% (10). Entre os artigos selecionados, foi identificado um ensaio clínico randomizado e um estudo metodológico descritivo. A população e amostra dos estudos de 10 (83.3%) artigos foram compostas por crianças e adolescentes. Um dos estudos foi realizado com os pais e um com profissionais tecnológicos educativos.
Os principais resultados identificados na revisão relataram sobre as influências negativas dos dispositivos celulares sobre o desenvolvimento cognitivo, alimentação saudável, repouso e sono. Os estudos discutiram e concordaram em utilizar intervenções para limitações do uso dos dispositivos e redução da exposição da criança à tela do celular.
As recomendações identificadas a partir do IRaMuTeQ enfatizam palavras-chave relacionadas à utilização dos dispositivos de mídia, como a tela, sobre a necessidade de avaliação de saúde e comportamento de crianças, estudos e pesquisas sobre a temática e o impacto das intervenções na saúde da criança. seguir, observe a figura 2:
Figura 2 - Recomendações acerca do uso de telas na infância em nuvem de palavras.
Fonte: Dados da pesquisa (2022)
Diante dos estudos selecionados, as mídias sociais e o tempo de tela mostraram que, quando utilizados por tempo ilimitado, podem comprometer a saúde da criança de várias formas, como alterações cognitivas, alimentares e físicas9. As pesquisas analisadas trouxeram indicadores de que o uso e exposição excessiva trazem consequências que podem interferir no comportamento e no desenvolvimento infantil. No entanto, já existem intervenções que podem ser aplicadas para uma convivência saudável entre telas, mídias e crianças, mediadas ativamente pelos pais e orientadas por profissionais de saúde.
A partir dessa scoping review, estudos identificaram que, especificamente, a Academia Americana de Pediatria recomenda a avaliação universal do risco de obesidade de todas as crianças por meio da triagem do IMC, incentivo à alimentação com quantidades recomendadas de frutas e hortaliças, limitação do consumo de bebidas adoçadas com açúcar, limitação do tempo de tela para menos de 2 (duas) horas diárias e promoção da prática de exercícios que, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), deve ser pelo menos 180 minutos de atividade semanal para crianças de 1 a 4 anos10.
Pela mesma razão, as evidências preliminares apresentadas expõem uma associação negativa entre comportamento sedentário e tempo de tela para crianças e adolescentes. Portanto, partindo da perspectiva da saúde física e do desenvolvimento cognitivo de crianças, as famílias, escolas e formuladores de políticas devem considerar utilizar intervenções para reduzir e limitar o comportamento sedentário na infância baseado em telas11.
A situação epidemiológica e nutricional do público em estudo é explicada, na maioria dos casos, pelas modificações que vêm ocorrendo no padrão alimentar, resultando em dietas obesogênicas cada vez mais comuns. Somam-se a isso, a redução da atividade física e o aumento da prática de atividades sedentárias, como assistir televisão12.
No tocante ao comportamento sedentário, esse tem submergido na vida de crianças precocemente. Uma delas é a exposição precedente às telas e, com isso, o padrão alimentar fica cada vez mais alterado pelo consumo exacerbado de produtos ultraprocessados, somando à inatividade física – que está relacionada a esses fatores. Esse contexto desencadeia consequências ao longo da vida, trazendo resultados desfavoráveis, como doenças crônicas.
Nessa perspectiva, a prevalência do tempo excessivo de telas – utilizada por crianças na primeira infância – é elevada, conforme apresentado no estudo de Rocha e Nunes9, manifestando a urgência de intervenções dos hábitos familiares acerca do uso de telas, com objetivo de um convívio saudável com a tecnologia. Os pais estão facilitando o acesso dos filhos a smartphones, tablets etc., no intuito de mantê-los ocupados. Constatou-se que crianças que têm um acesso livre ao uso de telas apresentaram IMC mais elevado13.
Dessa forma, o comportamento sedentário está sendo baseado na frequência do tempo em que crianças passam em frente a telas. Segundo Poitras et al.14, os comportamentos sedentários relacionados ao tempo de tela total foram notavelmente desfavoráveis e sugerem potenciais danos à saúde da criança nos primeiros anos de vida. Os indicadores de saúde fornecem informações sobre a duração ideal para cada faixa etária, buscando a prevenção e a redução de doenças.
No estudo de Shqair et al.15 foram apresentados dados sobre o tempo de tela de crianças e os seus padrões alimentares. Os resultados demonstram que as taxas mais altas de visualização de TV e/ou tempo de tela foram associadas a uma maior ingestão de alimentos cariogênicos, como lanches ricos em energia e bebidas açucaradas, evidenciando que o tempo de tela ou uso de recursos tecnológicos afetam a saúde bucal desse público, sendo mais esse um fator preocupante para profissionais da saúde e para a família.
De acordo com Jones et al.16, à medida que as crianças crescem, as diretrizes de tempo de tela são ajustadas para recomendar não mais que 2 (duas) horas por dia de tempo de tela recreativa para crianças e adolescentes (5 a 17 anos). Independente da atividade física e comportamento sedentário, o excesso de tempo de tela (2 horas por dia) está associado ao sobrepeso e obesidade infantil. O excesso de tempo de tela também está relacionado a comportamentos obesogênicos desfavoráveis, como inatividade física, aumento do tempo sedentário, comportamentos alimentares desfavoráveis e sono interrompido.
Além disso, a tecnologia está em constante evolução e isso é visto no cotidiano da população, em que cada vez mais crianças e adolescentes têm fixado sua atenção em jogos virtuais, YouTube, televisão e redes sociais em geral. De acordo com Lund et al.17, o uso da mídia por crianças de seis a doze anos resulta em uma curta duração de sono e despertares noturnos, trazendo diversos prejuízos no aprendizado da criança e, consequentemente, nos demais âmbitos da sua saúde.
Constata-se que a taxa de publicações sobre os impactos do tempo de tela na saúde das crianças tem aumentado, entre 2009 e 2019, devido a necessidade de avançar em estudos sobre a temática para buscar possíveis danos causados pela exposição excessiva aos dispositivos eletrônicos. Embora os dispositivos eletrônicos possam oferecer benefícios, seu uso excessivo mostrou que a exibição das crianças em frente às telas deve ser monitorada e mediada para que estudos futuros tracem uma melhor forma de identificar danos e benefícios entre o uso e o excesso desse tempo18.
Dentre os artigos considerados nesse trabalho, foram analisadas intervenções que poderiam ser aplicadas para redução do tempo de tela e do comportamento sedentário das crianças, como incluir metas diárias, automonitoramento e apoio social. A eficácia das intervenções observadas se mostrou consistente, bem como foram notados que estudos menores e de curta duração obtiveram resultados significativos. O estabelecimento de metas, o apoio social familiar e o automonitoramento foram eficazes para redução do tempo de tela16.
O apoio e participação da família apresentaram contribuições eficazes na redução do tempo de tela e na mudança do comportamento inativo das crianças, por meio de intervenções diárias, como a medição do tempo de tela, o incentivo a atividades físicas acompanhadas pelos pais e a programação de metas cotidianas. Essas ações podem trazer mudanças de hábitos eficazes para a família, uma vez que retira hábitos não saudáveis e expõe a importância da atuação parental nesse processo.
As mudanças familiares figuram-se como essenciais, visto que, na infância, o indivíduo, por ser dependente, possui autonomia e possibilidades de escolha limitadas; assim, os hábitos de vida são moldados sob a influência de seus pais ou cuidadores. Estudo realizado com crianças de 24 a 42 meses e 15 dias, matriculadas em creches, afirma que pais conscientes acerca da magnitude do problema, isto é, dos danos que o uso excessivo de telas, ocasionam ao seu filho, tendem a limitar esse tipo de atividade, sendo essa uma decisão muito importante para saúde da criança19.
No estudo de Ekambareshwar et al.20, os resultados obtidos evidenciaram que houve melhorias nos comportamentos relacionados à obesidade infantil quando houve a redução no consumo de bebidas industrializadas, aumento da duração de atividades ao ar livre, diminuição da TV/tempo de tela e o aumento da duração do sono.
Os resultados negativos relacionados aos comportamentos sedentários na primeira infância sugerem intervenções direcionadas e conduzidas pelos pais. Estratégias para reduzir o tempo sedentário são necessárias, com foco na redução do tempo de telas, orientações de atividades físicas em família, atividades didáticas no ambiente escolar, participação dos pais na criação dos lanches saudáveis, interatividade e desenvolvimento de novas habilidades21.
Consolidando as recomendações, é indispensável que os profissionais de saúde conheçam sobre a importância de limitar o tempo de tela das crianças, para assim poder prestar uma assistência de qualidade e manter os pais informados15.
Em resumo, o profissional de saúde tem o papel de educar e mediar essa participação parental na educação em saúde, atuando na orientação sobre os malefícios e riscos ao expor a criança de forma precoce às telas; atentar para mudanças no comportamento e desenvolvimento, mediante às consultas de puericultura e a sempre conversar sobre intervenções que podem ser aplicadas no dia a dia dos pais com as crianças para o controle dessa exposição.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a exposição dos resultados desse estudo, conclui-se que o tempo de tela e as mídias sociais, quando utilizadas fora do contexto adequado, impacta negativamente na saúde infantil, bem como favorece o atraso no desenvolvimento e comportamento, gera inatividade física ou tempo menor de atividades que estão ligadas à parte motora, além de sobrepeso, obesidade, sono irregular, dentre outros.
A limitação encontrada neste estudo de revisão foi a reduzida quantidade de estudos com foco no tema principal abordado. A maioria dos artigos discorreram sobre o fator de tempo de tela no desenvolvimento infantil associando a outros fatores como elemento chave da discussão.
Ainda, observou-se que o campo de estudo é pouco discutido pelos pesquisadores nacionais, refletindo uma grande lacuna a ser preenchida com pesquisas futuras. Desse modo, sugere-se que essas pesquisas busquem abordar – como tema principal – o sobrepeso e obesidade relacionados ao tempo de tela e às mídias sociais e quais efeitos ambas trazem à saúde da criança de forma mais aprofundada.
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