BARREIRAS LIMITANTES E FACILITADORES PARA O RASTREAMENTO DO CÂNCER DE MAMA: REVISÃO INTEGRATIVA
LIMITING BARRIERS AND FACILITATORS FOR BREAST CANCER SCREENING: AN INTEGRATIVE REVIEW
BARRERAS LIMITANTES Y FACILITADORES PARA LA DETECCIÓN DEL CÁNCER DE MAMA: UNA REVISIÓN INTEGRADORA
Autores
Layanne Cavalcante de Moura - Médica pela Faculdade Integral Diferencial (FACID) e Enfermeira pela Faculdade Santo Agostinho (FSA). Mestranda em Saúde da Mulher pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Docente na Faculdade de Tecnologia de Teresina (CET). ORCID: 0000-0003-2781-1076
Luiz Ayrton Santos Júnior - Médico. Doutor em Cirurgia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Mestre em Medicina pela Universidade de São Paulo (USP). Mastologista pela Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM). Docente da Universidade Federal do Piauí (UFPI) e da Universidade Estadual do Piauí (UESPI). ORCID: 0000-0002-6697-6167
RESUMO
Objetivo: Analisar na literatura as evidências científicas sobre as barreiras limitantes e facilitadoras para o rastreamento do Câncer de Mama. Método: Revisão integrativa da literatura realizada através da Biblioteca Virtual em Saúde e U. S. National Library of Medicine. Resultados: Foram selecionados 18 artigos para essa revisão. As evidenciam apontam que é necessário identificar a população-alvo para a definição das ferramentas de diagnóstico, o delineamento das abordagens programáticas e a elaboração do processo de implantação e ampliação do rastreamento do câncer mamário. Diante dos diversos fatores que dificultam a acessibilidade e realização do rastreio, é indispensável a elaboração de estratégias e fortalecimentos que superem essas barreiras. Conclusão: Diante das barreiras e facilitadores para o rastreamento do câncer de mama, espera-se que os achados possam auxiliar em questões críticas a serem investigadas com profundidade sobre as melhores estratégias para o rastreamento do CM, contribuindo para a elaboração de políticas de rastreamento.
DESCRITORES: Assistência integral à saúde; Programas de rastreamento; Neoplasias da mama; Saúde da mulher;
ABSTRACT
Objective: To analyze the scientific evidence in the literature on the limiting and facilitating barriers to breast cancer screening. Method: Integrative literature review conducted through the Virtual Health Library and the U.S. National Library of Medicine. Results: Eighteen articles were selected for this review. The evidence indicates that it is necessary to identify the target population for defining diagnostic tools, outlining programmatic approaches, and developing the process for implementing and expanding breast cancer screening. Given the various factors that hinder accessibility and performance of screening, it is essential to develop strategies and strengthen measures to overcome these barriers. Conclusion: Given the barriers and facilitators for breast cancer screening, it is expected that the findings may help in critical issues to be investigated in depth regarding the best strategies for BC screening, contributing to the development of screening policies.
DESCRIPTORS: Comprehensive health care; Screening programs; Breast neoplasms; Women's health
RESUMEN
Objetivo: Analizar la evidencia científica existente en la literatura sobre las barreras limitantes y facilitadoras del cribado del cáncer de mama. Método: Revisión bibliográfica integradora realizada a través de la Virtual Health Library y la U.S. National Library of Medicine. Resultados: Se seleccionaron 18 artículos para esta revisión. La evidencia muestra que es necesario identificar la población diana para definir las herramientas diagnósticas, diseñar los enfoques programáticos y elaborar el proceso de implantación y expansión del cribado del cáncer de mama. En vista de los diversos factores que dificultan la accesibilidad y el cribado, es esencial diseñar estrategias para superar estas barreras. Conclusión: A la vista de las barreras y los facilitadores del cribado del cáncer de mama, se espera que los hallazgos puedan ayudar a plantear cuestiones críticas que deban investigarse en profundidad sobre las mejores estrategias para el cribado del cáncer de mama, contribuyendo al desarrollo de políticas de cribado.
DESCRIPTORES: Atención sanitaria integral; Programas de cribado; Neoplasias mamarias; Salud de la mujer;
Tipo de artigo: Revisão Integrativa
Recebido:12/08/2024 Aprovado: 23/09/2024
INTRODUÇÃO
O Câncer de Mama (CM) é uma doença causada pela multiplicação desordenada de células da mama. Esse processo gera células anormais que se multiplicam, formando um tumor e, por isso, a doença pode evoluir de diferentes formas. Alguns tipos possuem desenvolvimento rápido, enquanto outros crescem lentamente. Esses comportamentos distintos se devem às características próprias de cada tumor pois há vários tipos de CM(1).
Evidencia-se que CM representa um grande problema de saúde pública, considerada uma das neoplasias mais incidentes entre as mulheres, manifestando taxas elevadas de morbimortalidade em diversos países, inclusive no Brasil(2). Estima-se para o ano de 2023 no país, a ocorrência de 73.610 novos casos, representando uma taxa ajustada de incidência de 41,89 casos por 100.000 mulheres, apresentando ainda uma taxa de mortalidade em torno de 16,3%, segundo dados do Instituto Nacional do Câncer(3).
O aumento da incidência de mortalidade por CM é diretamente proporcional às mudanças nos padrões demográficos, como o envelhecimento populacional e o desenvolvimento econômico, além do diagnóstico e tratamento tardio, motivo pela qual tornam o rastreamento e detecção precoce principais medidas de controle da doença (4, 5). Dentre os métodos mais eficazes de detecção precoce, destacam-se a mamografia (MMG) e o exame clínico das mamas (ECM) que constituem intervenções em todos os níveis de atenção à saúde da mulher(4).
Alguns fatores de riscos predispõem a manifestação da doença além da idade, como: a vida reprodutiva da mulher, menarca precoce, menopausa tardia, não ter tido filhos ou gravidez após 30 anos, não ter amamentado, uso de anticoncepcional oral e terapia de reposição hormonal pós-menopausa(6). Além disso, outros fenômenos que podem contribuir para o desenvolvimento do câncer como alterações genéticas, história familiar com a doença e alta densidade das mamas. No que se refere aos fatores ambientais, é apontado o sobrepeso, sedentarismo, tabagismo, consumo abusivo de bebida alcoólica e exposição frequente à radiação(7).
Conforme sua elevada magnitude, o seu controle depende essencialmente da adoção de estratégias voltadas à prevenção primária e secundária para proporcionar mudanças nesse panorama e aumentar a expectativa de vida das mulheres acometidas pela patologia(2).
No cenário da Estratégia de Saúde da Família (ESF), as ações para de controle do CM são direcionadas a promoção da saúde e prevenção da doença, além do diagnóstico precoce e apoio ao tratamento instituído na atenção secundária e terciária. Assim, a detecção através de programas de rastreamento é uma alternativa que favorece o diagnóstico em fases iniciais, contribuindo para o tratamento curativo e/ou maiores taxas de sobrevida(4), onde as mulheres assintomáticas são submetidas a exames de triagem para detectar o câncer (ou lesões precursoras do câncer) e organizar referências para confirmação diagnóstico e tratamento.
Neste percurso, a implantação de um programa de rastreamento é essencial para a organização da rede assistencial, como a disponibilidade de recursos humanos e estruturais para diagnóstico e tratamento(8).
O presente estudo objetiva analisar na literatura as evidências científicas sobre as barreiras limitantes e facilitadoras para o rastreamento do CM.
METODOLOGIA
Trata-se de uma Revisão Integrativa da Literatura (RIL) do tipo descritivo-exploratória, com abordagem qualitativa(9), sobre as barreiras limitantes e facilitadoras para o rastreamento do CM.
O estudo seguiu seis etapas para o seu desenvolvimento: 1) elaboração da pergunta norteadora; 2) busca ou amostragem na literatura; 3) coleta de dados; 4) análise seletiva e crítica dos estudos incluídos; 5) discussão dos resultados; e 6) apresentação da revisão integrativa(9,10).
Para esta revisão, foi elaborada a seguinte questão norteadora: Quais evidências a literatura científica traz acerca das barreiras limitantes e facilitadoras para o rastreamento do câncer de mama?
As buscas foram realizadas entre outubro e dezembro de 2023, através da Biblioteca Virtual da Saúde (BVS), coordenada pela BIREME e composta de bases de dados, como LILACS, BDENF, SCOPUS, além da base de dados Medline e outros tipos de fontes; e PUBMED (U. S. National Library of Medicine). Nos bancos de dados foram utilizados termos em inglês e português. Os descritores foram obtidos no Medical Subject Headings (MESH) e dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), sendo: Assistência integral à saúde (Comprehensive Health Care), Programas de rastreamento (Mass Screening), Neoplasias da mama (Breast Neoplasms) e Saúde da mulher (Women's Health), pesquisados através do operador booleano “AND”. Tais descritores estão dispostos nos dados do DeCS da BVS, órgão associado a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS)12.
Os critérios de inclusão dos artigos foram: estudos primários em português, inglês e espanhol, com recorte nos últimos 05 anos (2018-2022), com vistas a elencar publicações atuais e pertinentes(09). Sendo excluídos capítulos de livros, resumos, textos incompletos, relatos técnicos, estudos duplicados e outras publicação que não artigos científicos.
Avaliou-se o nível de evidência com o Agency for Healthcare Research and Quality (AHRQ), que compõe os seguintes níveis: 1) Metanálise de múltiplos estudos controlados; 2) Estudos individuais com delineamento experimental; 3) Estudos com delineamento quase-experimental como estudos sem randomização com grupo único pré e pós-teste, séries temporais ou caso-controle; 4) Estudos com delineamento não-experimental como pesquisas descritivas correlacional e qualitativa ou estudos de caso; 5) Relatórios de casos ou dado obtido de forma sistemática, de qualidade verificável ou dados de avaliação de programas; e 6) Opinião de autoridades respeitadas baseadas em competências clínicas ou opiniões de comitês de especialistas(13).
Os artigos selecionados foram exportados para o Software Rayyan®, uma ferramenta computacional gratuita, para análise pareada das referências encontradas e remoção de duplicadas. Para minimizar o risco de viés, a busca foi executada por dois pesquisadores em diferentes computadores de forma independente. Na interpretação dos resultados, seguiu-se a leitura comparativa entre os artigos, analisando-se suas semelhanças e procedendo-se ao agrupamento.
RESULTADOS
Nas bases elencadas, foram identificados inicialmente 2.024 publicações, sendo 1.192 na BIREME/BVS e 832 na PUBMED. Após aplicação dos filtros, conforme critérios de inclusão e exclusão, obteve-se 478 artigos. Destes, 407 foram excluídos após leitura dos títulos e resumos, sendo selecionados 71 artigos para leitura na íntegra. Posteriormente, 53 foram excluídos por não se adequarem a este estudo e 18 artigos foram selecionados para amostra final por responderem o objetivo proposto. O fluxograma do processo de seleção dos artigos selecionados encontra-se na Figura 1, a seguir.
Figura 1. Fluxograma do processo de seleção de estudos selecionados para revisão integrativa. Teresina, PI, Brasil. 2023.
Fonte: Elaborado pelos autores, 2023.
Para possibilitar a síntese e análise dos dados, os estudos selecionados foram agrupados em um quadro, reunindo informações quanto: autor(es)/ano de publicação, objetivos, método, nível de evidência e principais resultados, conforme o Quadro 1.
Quadro 1. Distribuição das publicações incluídas segundo autor(es)/ano de publicação, objetivo, método, nível de evidência e principais resultados. Teresina, PI, Brasil, 2023.
Autores/Ano |
Objetivo |
Método / Nível de evidência |
Principais resultados |
Assis; Santos e Migowski (2020)(15) |
Analisar como a informação sobre detecção precoce do CM é apresentada na mídia brasileira durante o Outubro Rosa |
Estudo documental / IV |
A carência de informações e a presença de recomendações inadequadas ou incompletas sobre a faixa etária e periodicidade implica rastreamento do CM. |
Dourado et al. (2022)(16) |
Descrever o perfil das mulheres acometidas pelo CM e avaliar os aspectos relacionados aos métodos de detecção e estadiamento da doença |
Estudo transversal / IV |
A detecção pelo autoexame é expressiva e sendo relacionada com estádios avançados do CM. |
Bulanello et al. (2018)(17) |
Caracterizar o perfil socioeconômico e epidemiológico das mulheres em Uberaba, segundo a prática de exames de rastreio para CM e os fatores associados à prática |
Estudo transversal / IV |
Os fatores associados à prática dos exames de rastreio foram a faixa etária, reduzindo com o avançar da idade, renda per capita maior que um salário mínimo, e fonte de pagamento da MMG pública e por plano de saúde. |
Pascha et al. (2021) (18) |
Realizar uma avaliação econômica da implementação de um programa de telemamografia para melhorar o acesso à saúde |
Estudo de custo-efetividade / V |
A telemedicina também pode ser benéfica para garantir a continuidade dos cuidados. |
Mahumud et al. (2020)(19) |
Determinar a distribuição de preditores que influenciam significativamente a utilização de serviços de saúde entre mulheres |
Estudo transversal / IV |
Condições socioeconômicos, pobreza, residir em zona rural interfere no acesso das mulheres aos serviços de rastreamento do CM. |
Dias, Martins e Gradim (2018)(20) |
Avaliar a sobrevida, em cinco anos, de mulheres com CM |
Estudo documental / IV |
A incidência do CM é maior em pacientes com faixa etária de 50-69 anos, o que está em acordo com a cobertura de programas de rastreamento. |
Silva et al. (2019)(21) |
Analisar a prevalência e fatores associados à realização da MMG em mulheres com idade de 40 a 59 anos, usuárias da APS, em Vitória-ES |
Estudo transversal / IV |
O método de rastreamento não atinge todas as mulheres, sendo necessário a capacitação dos profissionais, o desenvolvimento de ações educativas para a prática de detecção precoce do CM. |
Migowski et al. (2018)(22) |
Apresentar os principais desafios à implementação das novas recomendações para a detecção precoce do CM no Brasil e refletir sobre as barreiras e estratégias para a sua superação |
Estudo documental / IV |
Mudanças relacionadas à regulação da assistência, financiamento e a implantação do processo de decisão compartilhada na APS são essenciais para impulsionar o rastreamento do CM. |
Han, Jungsuwadee, Abraham e Ko (2018)(23) |
Analisar o efeito da tomada de decisão compartilhada na adesão das mulheres aos exames de CM e estimar a prevalência e a adesão aos exames |
Estudo transversal / IV |
O uso da abordagem de tomada de decisão compartilhada para a comunicação dos profissionais de saúde com os pacientes pode melhorar a adesão ao rastreamento. |
Luceli e Kilic (2022)(24) |
Analisar os fatores que afetam a participação das mulheres no rastreamento do CM |
Estudo transversal / IV |
As mulheres devem ser melhor informadas sobre o CM e os serviços de rastreamento pelos profissionais de saúde. |
Sicsic; Pelletier-fleury e Moumjid (2018)(25) |
Elucidar os trade-offs das mulheres entre os benefícios e malefícios do rastreamento do CM e analisar os determinantes desses trade-offs |
Estudo experimental / II |
Fornece resultados úteis para autoridades de saúde pública e médicos dispostos a melhorar suas recomendações de rastreamento de CM com base nas preferências das mulheres. |
Scheel et al. (2021)(26) |
Analisar a detecção precoce do CM e sua capacidade diagnóstica em Uganda |
Estudo situacional / IV |
Deve-se fornecer programas educacionais para profissionais primários em centros comunitários de saúde. |
Magasi et al. (2019)(27) |
Descrever a trajetória de uma parceria comunidade-acadêmica de longo prazo com o objetivo de compreender e abordar as disparidades no rastreamento do CM entre mulheres com deficiência. |
Estudo de grupo focal / III |
É necessário parcerias entre acadêmicos, deficientes e parceiros clínicos para abordar as questões complexas que perpetuam as disparidades no rastreamento do CM entre mulheres com deficiências. |
Ginsburg et al., (2021)(28) |
Abordar sobre implementação para detecção precoce do CM |
Estudo documental / IV |
A sobrevivência do CM depende do acesso da mulher a cuidados oportunos, eficazes e acessíveis. A detecção precoce é fator fundamental. |
Kushalnagar; Engelman e Simons (2019)(29) |
Avaliar disparidades para adesão ao rastreamento de CM entre mulheres surdas em comparação à população em geral |
Estudo transversal / IV |
Há necessidade de intervenções de promoção da saúde acessíveis e direcionadas para mulheres surdas em idade elegível para aumentar a adesão ao rastreamento do CM. |
Dibisa et al. (2019)(30) |
Avaliar a prática de rastreamento do CM e seus fatores associados em mulheres da Etiópia |
Estudo transversal / IV |
A idade, o conhecimento e informações sobre o rastreamento do CM são fatores importantes para o rastreamento |
Tsuruda et al. (2021)(31) |
Investigar o conhecimento conceitual sobre rastreamento mamográfico entre mulheres norueguesas |
Estudo transversal / IV |
As mulheres percebem que as usuárias rastreadas têm menos probabilidade de morrer de CM do que as não rastreadas. |
Azevedo et al. (2019)(32) |
Analisar o conhecimento de mulheres entre 35 e 69 anos cadastradas na ESF de Alfenas – MG acerca do rastreamento do CM. |
Estudo transversal / IV |
O conhecimento acerca dos exames preventivos e da sua importância está relacionado com a regularidade em que as mulheres os realizam. |
Fonte: elaborado pelos autores, 2023.
DISCUSSÃO
A detecção precoce do CM visa a identificar a doença em fase inicial, seja por meio do diagnóstico precoce, estratégia dirigida às mulheres com sinais e sintomas suspeitos da doença, ou do rastreamento mamográfico, exames de rotina em mulheres assintomáticas em faixa etária e periodicidades definidas(15).
Não se pode deixar de enfatizar que o ECM pode se apresentar como um bom método de rastreio para o CM, recomendado em vários países, especialmente em mulheres com menos de 50 anos de idade, devido à densidade mamária que gera restrições de qualidade de imagem pela MMG. Nessa perspectiva, o incremento do ECM como parte integrante do atendimento integral à mulher se configura como método simples, não invasivo e com elevada sensibilidade(16).
No Brasil, o Exame Clínico das Mamas (ECM) e a MMG são as principais estratégias de rastreio. A MMG possibilita a detecção de alterações ainda não palpáveis, facilitando um tratamento mais efetivo, com recomendação para mulheres de 50 a 69 anos realizarem a MMG a cada dois anos e o ECM anualmente. Para as mulheres de 40 a 49 anos, o ECM anual e, em caso de resultado alterado, a MMG diagnóstica são indicados. Já para grupos de risco, que envolvam histórico familiar e diagnósticos anteriores de câncer, recomenda-se o ECM e MMG anuais a partir dos 35 anos(17).
O rastreamento do CM é fortemente recomendado pela maioria das diretrizes nacionais e internacionais, pois é altamente curável se detectado em estágios iniciais. Assim, é importante salientar a necessidade de extrapolação dessa estratégia englobando faixas etárias inferiores aos 50 anos, através de ações e estratégicas de saúde realizadas rotineiramente no processo de trabalho das equipes de saúde(17,18). Um programa de rastreamento para o CM contempla um conjunto de ações e tecnologias em prol da redução da morbimortalidade e melhoria da qualidade de vida e sobrevida da população-alvo(19,20).
Apesar das recomendações do Ministério da Saúde (MS), o acesso às ações de rastreamento do CM tem sido relacionado à algumas iniquidades em saúde. Alguns fatores influenciam positivamente e negativamente a realização dos exames de rastreio(17,21). Diante disso, este trabalho foi dividido em duas categorias temáticas: 1) barreiras limitantes para o rastreamento do CM; e 2) facilitadores para o rastreamento do CM.
Barreiras limitantes para o rastreamento do CM
Em estudo acerca dos desafios à implantação das diretrizes para detecção do CM no Brasil é apontado a prevalência da prática de rastreamento sem base em evidências científicas, o que acarreta em danos para a população. Elenca-se ainda as disposições centrais para o controle da qualidade do rastreamento, aderência aos métodos e orientações de rastreamento, fornecimento adequado e de qualidade dos mamógrafos, além do favorecimento de estratégias para pacientes sintomáticas que ainda se encontram em situação de difícil resolução(22).
As diretrizes para o rastreamento do CM é essencialmente pertinente para detecção, apesar que inúmeras diretrizes com diferentes limites de idade e recomendações que podem confundir as usuárias. Nesse viés, este fato pode ocasionar confusão entre os profissionais e pacientes, em razão da incompatibilidade entre as diretrizes de rastreamento de CM em fontes distintas, resultando numa baixa adesão ao rastreamento(23).
Outra barreira é a dificuldade em conseguir uma consulta e obter os resultados em tempo hábil, considerados fatores que afetam a participação do público-alvo. Mulheres tem relato a dificuldade em participar da triagem em razão do longo e difícil processo de agendamento, além do impedimento devido o trabalho para realização do rastreamento(24).
Ligado a não presença do rastreamento do CM está presente os sentimentos de medo(18), pois as mulheres pensam diretamente na morte quando abordadas sobre o CM, percebendo-o como uma doença temida(23), associando ainda com a remoção de mama e perda de cabelo(24). Além destes, é relatado sentimento de dor e constrangimento, autonegligência, ausência de apoio, barreiras linguísticas e geográficas (transporte)(23,24).
A percepção das experiências clínicas da equipe também mostra-se uma barreira para a aceitação do teste(18). Ademais, mulheres mostram-se sensíveis aos atributos relacionados aos benefícios absolutos e danos da triagem (sobrediagnóstico e MMG falso-positiva)(25).
Ainda que algumas mulheres realizem o rastreamento regularmente, em virtude do medo do CM. Esse fator impede a aquisição de informações indispensáveis e do encoramento à realização do rastreamento. Alguns estudos apontam que, o medo do CM é visto como uma barreira e, enquanto outros, é considerado um facilitador para a adesão ao rastreamento(24).
Outro motivo consiste na apreensão de afetar negativamente o relacionamento da mulher com seu cônjuge. Pois, o medo da rejeição pelo marido e separação estabelece sentimento de insegurança, implicando no rastreio do CM(24). Entretanto, ajudar a mulher a lhe lidar com seus sentimentos pode contribuir nas decisões em relação ao rastreamento, podendo ser oferecido apoio pelos profissionais da saúde e pela própria família(23).
Dados na literatura evidenciam diferenças nas condições socioeconômicas para realização da MMG, reforçando o padrão desfavorável às mulheres em pior situação socioeconômica. Essas informações podem ser úteis à gestão em saúde, uma vez que mostram o perfil das mulheres com menos acesso à MMG, oferecendo oportunidade de planejamento de intervenções direcionadas (17).
A condição socioeconômica mostra-se como um fator imprescindível na adesão pelas mulheres às práticas preventivas do CM. Pois, quanto maior o nível socioeconômico, mais propensas a se submeterem e frequentarem os serviços de saúde e terem oportunidades de acesso ao exame, enquanto que, as mulheres de classe econômica baixas apresentam menos oportunidades e adesão às consultas, sendo menor a oportunidade de solicitação de exames pelos profissionais. Isto reforça a centralidade da defesa dos princípios da equidade e universalidade no acesso aos serviços(19).
Aliado ao menor nível socioeconômico está a baixa escolaridade, tendo grande associação e implicando culturalmente em menor acessibilidade aos serviços de saúde de prevenção a população feminina, afetando o rastreamento do CM(17). Pois, quanto maior o grau de escolaridade, maior a influência na procura pelos serviços de saúde(19).
A baixa escolaridade e nível socioeconômico são fatores que culminam no impedimento de algumas mulheres de obter diagnóstico, por vezes devido à distância e as despesas associadas as viagens até os serviços de atendimento(26). Assim, é necessário a realização de busca-ativa por parte das equipes responsáveis pelo rastreamento do CM(21).
Não poder participar da triagem devido a barreiras socioeconômicas é um dos motivos mais mencionados nos estudos(15,17,19,22,24,26).
Outra barreira aponta diz respeito ao envelhecimento(17). Pesquisadores tem apontado uma não linearidade acerca dessa variável, ou seja, com o aumento da idade há diminuição da probabilidade das mulheres realizarem a MMG, assim, a prevenção via idade tende a se reduzir com o tempo.
Estudos abordam ainda a necessidade de um olhar particular às mulheres com idades avançadas, com perspectiva de prevenção do CM. Frente a isso, é essencial levar em conta o aumento longevidade e o crescimento pela busca dos serviços de saúde por essa população, pois, o envelhecimento é um fator de risco considerável para o desenvolvimento da doença com aumento na sua incidência (17, 28).
Outra questão é a falta de equipamentos acessíveis ou de acomodações inadequadas, até mesmo perigosas, comprometendo a segurança e a dignidade das mulheres com deficiência(27). Vista isso, as mulheres com deficiência são menos propensas a consultar os provedores regularmente em comparação com mulheres sem deficiência. Este fato está relacionado a dificuldade de comunicação e aquisição de informações. Assim, esse público necessita de apoio e de um relacionamento médico-paciente positivo para aderir à triagem, como acessar informações de saúde e participar de discussões com colegas alfabetizados em saúde, além de obter redes de apoio social(29).
Frente esses fatores dificultadores, existe a necessidade da superação dos obstáculos que interferem diretamente no rastreio do CM. Este ponto deve envolver tanto a equipe profissional, a família, a comunidade e a própria paciente, visando a redução dos casos e consequências do câncer, sendo estabelecido o incentivo ao rastreamento.
Facilitadores para o rastreamento do CM no Brasil
A implantação de políticas públicas como a Política Nacional de Atenção Oncológica (PNAO), em 2005, e o Plano de Ação para o Controle dos Cânceres de Colo e de Mama, criado entre 2005 e 2007, impulsionou a ocorrência do incentivo para o rastreamento do CM, proporcionando maior acessibilidade da população-alvo as unidades de saúde, as distintas maneiras de detecção precoce, além de ampliar os serviços de referência e de contrarreferência(17,20,22). Neste viés, a evolução do Plano de Política Nacional para Mulheres (PAISM), instituído em 2013, contribuiu para o progresso das ações da política, viabilizando o acesso aos serviços de promoção e atendimento integral à saúde da mulher com destaque para o rastreamento do CM e ginecológico(20).
Apesar dos avanços, é indispensável diversas outras condutas para o crescimento, como apoio familiar e social, comparecimento contínuo aos serviços de saúde, conhecimento sobre a importância do rastreamento do CM, dentre outras situações.
As mulheres percebem a grande importância do apoio familiar e conjugal na superação de barreiras socioculturais e econômicas para a participação e realização do rastreamento do CM. Pois estes, estabelecem apoio quando apresentam receio do resultado, proporcionam conhecimento e confiança dentro dos serviços de saúde(24).
Estudo realizado na cidade de Uberaba-MG, destacou que a realização dos exames de rastreio para CM custeados pelo setor público, como a MMG, é considerado um avanço das ações. Na pesquisa, mais da metade das entrevistadas obtiveram pagamento público, constituindo aspecto facilitador para o rastreamento do CM(17). Para além disso, o procedimento de triagem deve ser simplificado, particularmente para mulheres mais velhas e trabalhadoras(24).
O rastreamento é uma ação integrante da Atenção Primária em Saúde (APS), e os profissionais de saúde atuantes neste nível de atenção necessitam conhecer os métodos, a periodicidade e a população-alvo. O conhecimento deficiente desse processo pode contribuir para a falha no rastreamento do CM(21). Frente a isso, a equipe da APS deve estar capacitada para reconhecer sinais e sintomas do CM, para assim determinar o momento apropriado para encaminhamento das pacientes(28,30).
Torna-se indispensável ainda que o público feminino tenha conhecimento acerca da importância do rastreamento do CM. Em estudo realizado na Noruega(31), analisou que as mulheres percebem que o conhecimento sobre o rastreamento do CM é indispensável, pois as mulheres rastreadas têm menos probabilidade de morrer de CM do que mulheres não rastreadas. O conhecimento sobre o CM e a detecção precoce fomenta a sua motivação com a saúde, sendo influenciada na realização dos exames(32).
Para melhor aquisição do conhecimento das mulheres é necessário aumentar a conscientização acerca do CM, podendo levar as mulheres assintomáticas a se aproximem mais cedo das unidades de saúde, e tendo maior aceitabilidade dos exames. A conscientização pode levar os programas de rastreamento a alcançar uma boa cobertura populacional, estabelecer vínculos de referência para diagnósticos, disponibilidade e acessibilidade de instalações de tratamento(26-28).
Faz-se essencial a colaboração entre diferentes setores públicos para aumentar a conscientização da comunidade sobre o CM e endossar sua política de rastreamento para reduzir a morbidade e a mortalidade relacionadas ao câncer entre as mulheres(30).
Aliado a conscientização, destaca-se a necessidade dos programas de controle do CM atingirem maior cobertura na realização de MMG, de acordo com a população-alvo e o período preconizado. Assim, uma estratégia oportunista reside na busca ativa pelos profissionais das unidades de atendimento, visando acolher as mulheres que se ausentam das consultas ou aproximar-se daquelas que não buscam pelos serviços de saúde(21).
Outro ponto forte na conscientização está atrelado a realização do AEM. Apesar de não ser considerado uma estratégia no rastreamento do CM, a técnica contribui na identificação de alterações mamárias precocemente, tornando a mulher informada sobre aspectos e estruturas de suas mamas, expandindo seu potencial de constatar sinais e sintomas indicativos de neoplasia mamária, identificando alterações mamárias, levando-a buscar o serviço de saúde e preservar-se contra maiores danos(32).
Além disso, torna-se necessário que os profissionais do sistema de saúde estejam capacitados para atender, orientar e realizar o manejo das condutas necessárias, em resposta a procura do serviço de saúde pela mulher(21).
Há relatos em estudo onde as mulheres sentem-se confortante ser saudadas com acolhimento pelos profissionais de saúde, especialmente pelo profissional que realiza a MMG(24), além de ser informada acerca do procedimento durante todo o atendimento. Esse acolhimento possibilita às mulheres expressar suas preocupações e dúvidas sobre o procedimento, reduzindo o medo e a ansiedade. Frente a isso, é evidente que a importância da comunicação positiva e do acolhimento como potencial motivador(24,30).
Destaca-se ainda a utilização da mídia como incentivo ao rastreamento do CM, contribuindo para a disseminação de informações e orientações. Apesar de perpetuar informações que podem ser potencialmente danosas, como é o caso do rastreio mamográfico em faixas etárias e periodicidades não recomendadas, a utilização deste meio proporciona melhor conhecimento quando realizadas adequadamente(15). As mídias tecnológicas tem permitido a interpretação remota de imagens médicas, divulgação de informações precisas sobre o CM e, ainda, realização de consultas ou atendimentos sem necessidade de deslocamento, quando não precisa-se de contato físico(26).
Evidências abordam que é possível que o aumento na taxa de adesão ao rastreamento de câncer entre mulheres surdas seja parcialmente influenciado pelo uso da internet e engajamento em sites de redes sociais, apontando forte influência na realização de atendimentos e, posteriormente, realização do rastreamento de câncer mamário(29).
Apesar das fortes influências das mídias sociais, estudo(24) relatou que os serviços de atendimento móveis tornam-se requisitos para o fácil acesso aos centros de triagem. Tais dados apontam que, quando as unidades móveis de triagem são mais acessíveis, em comparação com as unidades fixas, há uma maior proporção de mulheres na realização da primeira MMG. Apesar desse facilitador, os serviços de triagem móveis ainda são limitados, havendo a necessidade de expansão(15,26,29).
Os componentes básicos das políticas de detecção precoce do CM compreendem a identificação da população-alvo, a definição das ferramentas de diagnóstico, o delineamento das abordagens programáticas e a elaboração do processo de implantação e ampliação do rastreamento(28). Diante dos diversos fatores que dificultam a acessibilidade e realização do rastreio do CM, é indispensável a elaboração de estratégias e fortalecimentos que superem estas barreiras, sendo indispensáveis para o aumento e expansão do rastreamento do câncer mamário.
CONCLUSÃO
Os estudos apontam que são muitas as barreiras que interferem no rastreamento do CM, como diversidade de diretrizes, condições socioeconômicas, dificuldade de acesso aos exames, medo, falta de conhecimento das pacientes e profissionais, avançar da idade e deficiências na organização e planejamento das estratégias. Assim, ações de implementação devem ser melhor apresentadas e ampliadas. Acerca dos fatores facilitadores para a realização do rastreamento do CM evidencia-se a busca-ativa da população alvo, conscientização acerca dos exames, capacitação dos profissionais, apoio social e profissional e organização do atendimento público.
Espera-se que esses achados possam auxiliar em questões críticas a serem investigadas com profundidade sobre as melhores estratégias para o rastreamento do CM, contribuindo para a elaboração de políticas de rastreamento do CM. Assim, espera-se estimular estudos acerca da temática considerando essa abordagem a um cuidado integral e acolhedor, proporcionando subsídios para a tomada de decisão entre desenvolvedores e executadores das políticas voltada ao rastreamento do câncer mamário, administradores dos serviços públicos de saúde, profissionais de saúde e população em geral.
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