REFLEXÕES SOBRE FATORES QUE INFLUENCIAM O ACESSO EM UMA REGIÃO DE SAÚDE
Resumo
Objetivo: analisar os fatores que influenciam o acesso à atenção cardiovascular. Método: estudo descritivo, abordagem qualitativa, a partir da entrevista de 41 gestores e reguladores de uma região de saúde do noroeste paulista. As entrevistas semiestruturadas foram transcritas, agrupadas por similaridade de conteúdo e categorizadas. Resultados: as categorias empíricas identificadas deflagraram que o acesso em saúde pode ser potencializado por meio da estruturação da rede de atenção, do fortalecimento da gestão, da qualificação da atenção, da melhoria da estrutura dos serviços e de um olhar sensível aos aspectos culturais da população assistida. Potencializar o acesso em um contexto de rede regionalizada pode trazer implicações tanto para a gestão, no que se refere ao planejamento e organização do sistema de saúde, quanto para a atenção, qualificando o cuidado na perspectiva da integralidade.
Descritores: Acesso aos Serviços de Saúde; Regionalização; Sistema Único de Saúde; Doenças Cardiovasculares.
Abstract
Objective: to analyze the factors that influence access to cardiovascular care. Method: descriptive study, qualitative approach, based on the interview of 41 managers and regulators of a health region of northwestern São Paulo. The semi-structured interviews were transcribed, grouped by content similarity and categorized. Results: The empirical categories identified showed that access to health care can be enhanced by structuring the care network, strengthening management, qualifying care, improving the structure of services and looking sensitively at the cultural aspects of the assisted population. Enhancing access in a regionalized network context can have implications for both management, with regard to the planning and organization of the health system, and care, qualifying care from the perspective of comprehensiveness.
Descriptors: Health Services Accessibility; Regional Health Planning; Unified Health System; Cardiovascular Diseases.
Resumen
Objetivo: analizar los factores que influyen en el acceso a la atención cardiovascular. Método: estudio descriptivo, enfoque cualitativo, basado en la entrevista de 41 gestores y reguladores de una región sanitaria del noroeste de São Paulo. Las entrevistas semiestructuradas fueron transcritas, agrupadas por similitud de contenido y categorizadas. Resultados: Las categorías empíricas identificadas mostraron que el acceso a la asistencia sanitaria puede mejorarse mediante la estructuración de la red asistencial, el refuerzo de la gestión, la cualificación de la asistencia, la mejora de la estructura de los servicios y la consideración sensible de los aspectos culturales de la población atendida. Potenciar el acceso en un contexto de red regionalizada puede tener implicaciones tanto para la gestión, en términos de planificación y organización del sistema sanitario, como para la asistencia, cualificando la asistencia desde la perspectiva de la integralidad..
Descriptores: Acceso a los servicios de salud; Regionalización; Sistema único de Salud; Enfermedades cardiovasculares.
Introdução
A universalidade do acesso pode ser entendida como preceito constitucional que ainda ocorre de maneira seletiva, focalizada e excludente1. A experiência internacional sugere como estratégia inovadora para a melhoria do acesso a organização das Redes de Atenção à Saúde (RAS) a partir da coordenação da Atenção Primária à Saúde (APS), por meio da articulação com serviços de densidades tecnológicas diferentes2.
A implementação da regionalização conforme posto pelo modelo federativo apresenta efeitos positivos que melhoram a eficiência na prestação de serviços e a redução dos custos operacionais, otimiza o capital humano, recursos tecnológicos, recursos sociais e políticos, incentiva o compartilhamento de responsabilidades entre as instâncias de gestão3.
Um aspecto desafiador para a organização do sistema de saúde tem sido o aumento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), causando impacto e econômico expressivos no Sistema Único de Saúde (SUS)4. Nesse cenário, destacam-se as doenças cardiovasculares que representam importante problema de saúde pública no mundo5 e no Brasil6. A atenção a esses agravos requer a organização do sistema de saúde para atendimento integral aos usuários7-9.
Verifica-se na literatura contribuições de diferentes estudos acerca da importância do acesso na atenção à saúde no SUS1,10-11. Há uma convergência quanto à ideia de que o acesso tem como produto final o atendimento às necessidades de saúde dos usuários, na perspectiva da integralidade e com resolubilidade.
Nesse contexto, é pertinente compreender os fatores relacionados ao acesso em saúde, em especial, para a atenção cardiovascular, a fim de fornecer subsídios para o planejamento em saúde, dado o elevado aporte de recursos que esses agravos requerem. Baseado nesses pressupostos, este estudo buscou identificar os fatores que influenciam o acesso regional a atenção cardiovascular a partir da perspectiva de gestores de saúde e responsáveis por serviços de regulação.
Métodos
Estudo descritivo, abordagem qualitativa, realizado na Comissão Intergestora Regional (CIR) de São José do Rio Preto, microrregião de saúde inserida no Departamento Regional de Saúde XV (DRS XV). Essa CIR possui, aproximadamente, 710.663 habitantes12 e localiza-se na região noroeste do estado de São Paulo. É composta por 20 municípios, dentre os quais 50% possuem até 10.000 habitantes e 90%, menos de 50.00013.
Participaram do estudo gestores de saúde e responsáveis pelos serviços de regulação que atuavam há pelo menos um ano na função, nos municípios ou no DRS. Para a entrevista semiestruturada utilizou-se um roteiro composto por cinco questões abertas relacionadas ao acesso à atenção cardiovascular na região de saúde. As entrevistas foram gravadas em meio digital e posteriormente transcritas.
Para cada município, houve uma identificação numérica aleatória que variou de “1” a “20”. Os participantes que eram gestores foram identificados com a letra G e os reguladores com a letra R. No total, foram entrevistados 41 participantes.
A análise dos dados envolveu a leitura vertical e exaustiva do material seguida da leitura horizontal, a fim de estabelecer relações entre os depoimentos, resultando em um agrupamento por similaridade de conteúdo14. A categorização dos dados foi realizada à partir das dimensões do acesso propostas por Assis e Jesus10
Figura 1 - Dimensões teóricas usadas para análise do acesso aos serviços de saúde de atenção cardiovascular:
FONTE: Assis, Jesus 10 (adaptado)
Este artigo traz nos resultados os fragmentos mais representativos das falas, bem como sínteses narrativas dos depoimentos. O propósito foi compreender processos que facilitam o acesso em saúde por meio de um cenário representativo.
Foi aprovado pelo Comitê de Ética da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto e desenvolvido de modo a garantir o cumprimento dos preceitos éticos.
Resultados
A partir das dimensões políticas, econômico-sociais, técnicas, organizacionais e simbólicas do acesso em saúde 10 estabeleceu-se as categorias empíricas: estruturação da rede de atenção, fortalecimento da gestão, qualificação da atenção, melhoria da estrutura dos serviços e aspectos culturais relacionados ao processo saúde doença. Dentro de cada categoria identificou-se estratégias facilitadoras do acesso.
Quadro 1 - Dimensões teóricas usadas para análise do acesso aos serviços de atenção cardiovascular no DRS XV, categorias empíricas e estratégias identificadas:
Fonte: própria dos autores (2021)
Estruturação da rede de atenção
Na dimensão organizacional do acesso, emergiu a categoria “estruturação da rede de atenção”, cujas estratégias apontadas foram “empoderamento e fortalecimento da Atenção Básica (AB)”, “organização dos fluxos de atendimento”, “fortalecimento da regulação local e regional”, “redução das barreiras geográficas de acesso” e “fortalecimento da avaliação de serviços de saúde”.
A estratégia “empoderamento e fortalecimento da AB” inclui a relevância do apoio técnico de articuladores e apoio matricial, para sua qualificação: “Tem os articuladores de atenção básica que atuam junto com os municípios no sentido de organizar a assistência em saúde, a atenção básica dentro de cada município e de acordo com cada realidade”. RM1-1 “A gente está trabalhando a alta qualificada (...) o hospital está com uma proposta de matriciamento com a atenção básica (...), tem dois representantes de cada município, o hospital tem contato com esses profissionais para avançar nas ações relativas à alta.” RM1-2 “A porta de entrada é a atenção básica, que tem que estar especializada, tem que estar capacitada. Se você não tem essa capacitação, enterra toda a rede” RM1-2
Na estratégia “organização de fluxos de atendimento”, as falas evidenciam a relevância das diretrizes técnicas e protocolos assistenciais, bem como da referência e contrarreferência: “Os municípios têm tentado se adequar para a implantação das linhas de cuidado, adotando protocolos para solicitação de exames”. RM1-1 “No DRS, o que foi muito positivo foi o protocolo que o AME elaborou. Antes o paciente ia para o AME, queimava a primeira consulta e, depois que ele ia, voltava para fazer os exames. Agora ele só é encaminhado de acordo com alguns critérios e com relação de exames”. GM18-1 “Os médicos do AME mandam contrarreferência para os municípios, e os nossos médicos vêem o que foi feito, tudo guardado no prontuário do paciente.” RM11-2
Na estratégia “fortalecimento da regulação local e regional”, identifica-se a importância da implantação desses serviços para potencializar o acesso: “Logo que foi se falando em regulação, já implantaram no sistema aqui dentro, então facilitou demais o serviço, facilitou muito” RM20-2 “A gente fez um trabalho para implantação de um grupo de regulação municipal para minimizar a fila real. Porque muitas vezes tinham 200 pacientes, mas daqueles 200 pacientes muitos já fizeram, muitos não tinham mais necessidade, encaminhamentos errados também”. RM1-2 “Todo mês é feita uma planilha com a demanda reprimida do município. A regulação manda a demanda reprimida de cada especialidade para eles fazerem uma avaliação, ver o que está sobrando, para ver se conseguem mudar” GM8-1
Na perspectiva da estratégia “redução das barreiras geográficas de acesso”, considerar a distância para o processo de pactuação de referências pode ser entendido como uma ação para redução dessas barreiras: “Se de repente a gente conseguisse os exames mais próximos seria melhor, porque às vezes você encontra um paciente que tem resistência para ir para uma cidade mais longe.” GM7-1
Na estratégia “fortalecimento da avaliação de serviços de saúde”, identificou-se a relevância da avaliação e do monitoramento para o acesso em saúde: “Ação para potencializar é o monitoramento e a avaliação. As ações que funcionam a gente sabe, mas se não monitorar e avaliar, elas não acontecem.” GM12-1
Fortalecimento da gestão
Na dimensão política, emergiu a categoria “fortalecimento da gestão”, cujas estratégias apontadas foram “qualificação e a continuidade da gestão” e “comprometimento da gestão estadual”.
Sobre a estratégia “qualificação e continuidade da gestão”, identificou-se a relevância da gestão técnica e qualificada: “Falta muita capacitação... Muda–se o gestor e muitas vezes não são gestores da área. Quando aprendem o que é saúde, o que é SUS, são trocados novamente. Então a dificuldade aqui na região é de fazer as redes com essa mudança de gestor, baixa capacitação de gestor.” RM1-2
Em relação a estratégia “comprometimento da gestão estadual”, evidenciou-se o papel de coordenação do DRS na organização da rede regional, principalmente no que se refere à gestão de prestadores: “O DRS tem feito um bom trabalho com os prestadores! Tem um bom levantamento das dificuldades da região para levar aos prestadores. Inclusive, temos em reunião de CIR, o AME vindo prestar contas do que tem feito. Isso foi um ganho muito grande”. GM4-1“No DRS eles tentam nos auxiliar e isso daí é o que tem de positivo”. RM2-2
Qualificação da atenção
Na dimensão técnica do acesso, emergiu a categoria “qualificação da atenção” cujas estratégias apontadas foram: “institucionalização de educação para a saúde” e “garantia da resolubilidade da atenção”.
Para “institucionalização de educação para a saúde”, o aprimoramento profissional foi evidenciado: “A gente vem tentando ampliar cada vez mais a capacitação desses profissionais, para garantir acompanhamento. ”GM9-1
Em relação à “garantia da resolubilidade da atenção”, ter serviços resolutivos foi bastante destacado pelos participantes: “O paciente da estratégia da família é muito bem assistido” RM12-2 “Tem um AME que funciona”. GM6-1 “A rapidez da emergência cardiológica é muito grande.” RM10-2
Melhoria da estrutura dos serviços
Na dimensão econômico-social do acesso emergiu a categoria “melhoria da estrutura dos serviços”, que compreendeu a estratégia “provimento de recursos necessários à atenção à saúde”, na qual incluíram-se os recursos físicos, como serviços e sistemas de informação em saúde; capital humano, em especial a importância da fixação de profissionais e recursos materiais/equipamentos necessários. “Acredito que a oferta de serviço na região colabora também para organizar melhor a rede” RM1-5 “Hoje é tudo encaminhado via sistema, facilita muito porque antigamente tinha que ir via pasta, às vezes voltava sem agendar. RM7-1 “O município está tentando fazer captação para fixar profissional” RM1-5 “Que facilita é termos uma sala de emergência muito bem montada”. GM16-1
Aspectos culturais relacionados ao processo saúde doença
Na dimensão simbólica do acesso, emergiu a categoria “aspectos culturais relacionados ao processo saúde-doença”, a partir do reconhecimento da implicação dos fatores culturais no acesso à saúde, conforme os depoimentos: “A gente tem algumas dificuldades em mudar os hábitos. Nós temos grupos de hipertensos e percebemos que é uma mudança de paradigma ter uma alimentação saudável, fazer exercício... Eu acho esse o maior complicador”.GM4-1“O homem não quer tomar o remédio porque ele quer ir ao bar. Geralmente o que mais acontece é que essas pessoas têm AVC, uma das maiores causas na unidade”. RM14-2
Para essa dimensão, não houve, nas falas dos participantes, elementos que pudessem indicar estratégias e nem mesmo ações propositivas. Mesmo assim, considera-se que o resultado pode fomentar uma reflexão, que perpassa a percepção e o olhar de cuidado e de integralidade em saúde. As hipóteses para a ausência de proposições podem advir das características dos participantes desse estudo – profissionais com foco em gestão, que muitas vezes têm pouca interface com a assistência ao usuário. Mas também podem advir de um conceito de cuidado que não valoriza a centralidade e a autonomia dos sujeitos.
Discussão
No sistema de saúde brasileiro, o termo “Atenção Básica” (AB) é utilizado como sinônimo de Atenção Primária à Saúde, sendo entendida como elemento essencial para a organização e articulação das RAS, atuando como porta de entrada preferencial do sistema, favorecendo o acesso, o vínculo e a atenção continuada centrada na pessoa e não na doença2.
A expansão e qualificação dos serviços de APS favorece a ampliação do acesso na medida em que promove a detecção de condições de saúde que demandam articulação e organização de toda a rede de atenção2, uma situação desafiadora para o sistema de saúde, tendo em vista que ainda há uma a fragilidade da APS tanto em se constituir como porta de entrada preferencial no sistema, quanto em oferecer uma atenção à saúde resolutiva7-8.
O empoderamento da APS está intrinsecamente relacionado ao aumento da sua capacidade resolutiva15, de modo que a desigualdade de acesso e de qualidade nesse ponto de atenção cria inúmeras dificuldades para o desenvolvimento do restante do sistema16.
A capacidade resolutiva da APS pode ser potencializada a partir de ações qualificadoras do cuidado. Dentre essas ações, pode-se destacar o trabalho dos articuladores da atenção básica, profissionais vinculados à SES-SP, que têm como atribuição auxiliar os gestores municipais na qualificação dos serviços17 e também o apoio matricial, ferramenta que favorece a construção de conhecimentos da equipe de APS por meio de suporte da equipe de apoio18.
A organização de fluxos de atendimento também pode influenciar no acesso à saúde. O arranjo dos fluxos de atendimento relaciona-se diretamente aos processos de atenção à saúde, com destaque para o modelo de atenção inadequado à realidade local, a falta de priorização de riscos, de definição de protocolos e de implantação de linhas de cuidado, bem como do acompanhamento deficiente das condições crônicas16.
No que se refere à assistência à saúde, o processo de trabalho deve ser voltado para instituir gestão do cuidado e não a fragmentação da assistência, que pode trazer implicações negativas ao acesso2. Além disso, considera-se que a integralidade da atenção não se esgota em um único serviço ou região de saúde. O principal elemento para a integração dos serviços e/ou redes de saúde é um efetivo sistema de referência e contrarreferência8.
Também a estratégia de fortalecimento da regulação local e regional é bastante consagrada para organização da rede de atenção. A regulação da atenção envolve processos como planejamento da oferta de ações e serviços com base nas necessidades de saúde da população19.
A regionalização da saúde é uma diretriz organizacional do SUS que busca ampliar o acesso e diminuir as desigualdades, de modo a viabilizar a utilização da tecnologia mais adequada, em qualquer parte do território, guiada por uma racionalidade sistêmica20.
Essa “racionalidade” relacionada à área da saúde insere-se em um contexto macro dentro da administração pública, o princípio da eficiência, que dispõe sobre a alocação de recursos que maximizem resultados e minimizem custos, para garantir a sustentabilidade do sistema público de saúde11.
A acessibilidade geográfica também pode ser entendida como balizadora do acesso, em especial em regiões muito distantes, com implicações tanto para o atendimento do usuário quanto para a gestão eficiente de recursos financeiros, impactando em gastos com o transporte sanitário de usuários11.
A incorporação da avaliação como prática sistemática nos diversos serviços de saúde propicia aos gestores as informações requeridas para a definição de meios de intervenção9. O monitoramento refere-se ao acompanhamento rotineiro de informações relevantes, em tempo oportuno, para subsidiar tomada de decisão, encaminhamento de solução, redução de problemas e correção de rumos; sua operacionalização está prevista no SUS21.
A qualificação dos gestores tem sido um desafio recorrente, influenciado pela própria complexidade do setor de saúde e também por disputas políticas e ideológicas. A rotatividade de gestores municipais de saúde, a baixa autonomia nas decisões executivas, a qualificação insuficiente e a influência das políticas partidárias nos processos decisórios em políticas públicas são fatores que obstruem o fortalecimento da gestão do SUS20. O gestor de saúde deve ter preparo e tempo para desenvolver as funções estratégicas que envolvam colocar os princípios do SUS em prática22.
O debate sobre regionalização em saúde tem ganhado profundidade, tanto pela consistência das experiências internacionais, quanto pelo direcionamento legal do arcabouço jurídico do SUS. A conformação de regiões e redes de saúde no Brasil se tornaram estratégias para lidar com a dimensão territorial, com a universalização do acesso à saúde e para o planejamento e gestão do sistema23.
O estabelecimento da CIR como instância de cogestão no espaço regional constrói um canal permanente e contínuo de negociação e decisão entre os gestores, mecanismo para afirmar relações de corresponsabilidade na região de saúde. O aprendizado institucional fortalece a gestão e se apresenta como importante componente para construção da rede regionalizada20.
Incorporar o ensino aos serviços de saúde é um dos enfoques da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde, cujo o foco central é a experiência dos trabalhadores, utilizando a realidade de cada serviço24. Outra estratégia para aprimoramento profissional é a educação continuada, que atua para rever e recuperar conhecimentos e habilidades, além de acompanhar as mudanças trazidas pelo progresso científico tecnológico, a fim de qualificar a atenção prestada25.
A falta de treinamento e número insuficiente de trabalhadores de saúde é um limitador do acesso1, assim como questões relacionadas à provisão de capital humano, em especial, à contratação de médicos nos pequenos municípios e naqueles mais afastados dos grandes centros16.
Em que se pese o diagnóstico do subfinanciamento crônico do SUS26 é recorrente a apresentação de estudos que apontam para a má gestão do uso de recursos públicos27, uma condição que impacta diretamente na alocação de recursos e serviços e, consequentemente, de acesso do usuário. Para além dessas questões, há que se mencionar a conjuntura político-econômica atual, que converge para uma política de austeridade fiscal, que certamente impactará no acesso26.
Para finalizar, acredita-se que os serviços de saúde precisam promover uma intervenção centrada no usuário que seja capaz de permitir a autonomia dos indivíduos. A autonomia, nesse contexto, não é simples liberdade de escolha, e, sim, a escolha consciente, dialogada e compartilhada. Nesse sentido, deflagra-se a corresponsabilização, ou seja, a capacidade de perceber as singularidades e de investir na capacidade individual de fazer escolhas que promovam o cuidado1.
Conclusão
Entende-se, a partir dos resultados, que o acesso em saúde é um tema complexo e multifacetado, que pode ser potencializado por meio da estruturação da rede de atenção, do fortalecimento da gestão, da qualificação da atenção, da melhoria da estrutura dos serviços e de um olhar sensível aos aspectos culturais da população.
Na região estudada, superpõe-se uma série de fatores que impactam no acesso em saúde, dentre os quais, podem-se destacar a resolubilidade da APS, a organização de fluxos de atendimento, a regulação local e regional, as barreiras geográficas e também a necessidade de fortalecimento da avaliação dos serviços de saúde. Além disso, também denota a relevância de aspectos como a qualificação dos gestores e a continuidade da gestão, o fortalecimento de instâncias gestoras, a qualificação dos profissionais, a resolubilidade da atenção e o provimento dos recursos necessários à atenção à saúde.
Entende-se ser uma limitação do estudo não ter a participação de profissionais da assistência e usuários portadores de agravos cardiovasculares, por serem atores que poderiam contribuir com o resultado da investigação, em especial, no que se refere à dimensão simbólica do acesso. Porém, salienta-se que os achados obtidos contribuem para evidenciar aspectos que podem potencializar a regionalização.
Como contribuição, entende-se que investigar os aspectos implicados no acesso em contextos de redes regionalizadas traz indicativos para formulação ou readequação de políticas de saúde, em especial, no que se refere ao planejamento e organização do sistema de saúde, auxiliando a tomada de decisão de gestores em diferentes instâncias, o que pode ser especialmente relevante em cenários econômicos desfavoráveis, como o que se deflagra. Otimizar recursos que possam potencializar o acesso torna-se, portanto, uma tarefa virtuosa e necessária.
Por fim, vislumbra-se que os resultados desse estudo também trazem contribuições no âmbito da atenção em saúde, tanto para gestores, como para profissionais que atuam na assistência, instigando-os a refletir sobre possíveis estratégias de intervenções que possam qualificar o acesso em diferentes pontos da rede regional. Entende-se que o acesso qualificado pode ressignificar o cuidado e melhorar o atendimento às necessidades de saúde dos usuários, amplificando proposições que favoreçam a integralidade.
Agradecimentos
Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio financeiro para realização desta pesquisa.
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